Do epicentro dos dados ao epicentro da demissão de Costa
O mega data center de Sines foi apresentado pelo Governo, em 2021, como "o maior investimento estrangeiro captado pelo País desde a Autoeuropa", mas, volvidos dois anos, a construção do centro de dados na Zona Industrial e Logística de Sines é um dos focos da investigação do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) do Ministério Público (MP) que levou António Costa a demitir-se das funções de primeiro-ministro.
A investigação já levou à constituição de sete arguidos, sendo que três estão diretamente vinculados à Start Campus, empresa detida pela norte-americana Davidson Kempner Capital Management LP e pela britânica Pioneer Point Partners, que é responsável pelo investimento do denominado Hyperscale Data Centre.
Mas o que é o data center de Sines? É um empreendimento com estatuto Projeto de Interesse Nacional (PIN), apresentado em abril de 2021. Para erguer este centro de dados, a Start Campus comprometeu-se investir até 3500 milhões de euros em Sines, prevendo a criação de 1200 empregos diretos altamente qualificados e 8000 postos de trabalho indiretos até 2025.
A própria empresa garantira que iria instalar em Sines um dos maiores centros de dados da Europa, "contribuindo [também] significativamente para a transição energética de Portugal". Em dezembro de 2022, Pedro Nuno Santos, ainda ministro das Infraestruturas, disse que Sines tinha "condições únicas" para ser o "epicentro" da economia de dados.
Data Center vs Autoeuropa
O data center vale mais que a Autoeuropa? Até ver, o centro de dados de Sines ainda não passa de uma promessa - só em outubro passado o primeiro edifício (de um total de cinco, contíguos à antiga central a carvão de Sines) começou a "operar parcialmente". Já a Autoeuropa, instalada em Portugal nos anos de 1990, produziu 231 mil unidades e atingiu um volume de vendas de 3,674 mil milhões de euros em 2022, sendo que 99% da produção é para exportação. A Autoeuropa emprega hoje cerca de 5000 pessoas e vale 1,5% do Produto Interno Bruto (PIB).
A par do Hyperscale Data Centre, Sines foi escolhida para receber uma central de produção de energia a partir de hidrogénio. Ambos constituem o projeto Sines 4.0. "E porque é que Sines pode ser um campeão da produção de hidrogénio verde em toda a Europa? Pela mesmíssima razão que, em todos os sítios possíveis para localizar este mega data center, foi escolhido Sines, porque aqui é possível ter um mega data center energeticamente sustentável, e mais, com a energia renovável mais barata que é possível encontrar", disse António Costa na apresentação do projeto.
As autoridades suspeitam de "factos suscetíveis de constituir crimes de prevaricação, de corrupção ativa e passiva de titular de cargo político e de tráfico de influência". Ontem, o Público noticiava que o MP suspeita que João Galamba, enquanto secretário de Estado da Energia ou enquanto ministro das Infraestruturas, pode ter levado a Conselho de Ministros diplomas feitos por advogados pagos pela Start Campus. Afonso Salema, CEO da Start Campus, Rui Oliveira Marques, administrador jurídicoe de sustentabilidade da Start Campus, Diogo Lacerca Machado, padrinho de casamento de Costa e consultor da Start Campus, e Nuno Mascarenhas, presidente da Câmara Municipal de Sines (PS), também são arguidos no âmbito desta investigação do MP.
jornalista do Dinheiro Vivo