Direitos humanos: PJ convida minorias para o seu aniversário
As minorias religiosas e étnicas e a comunidade homossexual estão entre os convidados da Polícia Judiciária (PJ) para a celebração do seu 73º aniversário, cuja comemoração será esta sexta-feira. "Considerando a importância de toda a atividade da Policia Judiciária se nortear por valores que se coadunam com a temática do Direitos Humanos, entendeu associar-se a comemoração, em 2018, dos 70 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos e dos 40 anos da adesão de Portugal à Convenção Europeia dos Direitos Humanos", justifica a PJ.
Embora a decisão tenha sido tomada, com o apoio da ministra da Justiça, em finais de setembro, o tema não deixa de ganhar significado numa altura em que tem estado em debate o cumprimento de Direitos Fundamentais no âmbito da atividade das forças e serviços de segurança - desencadeado pela divulgação das fotos dos detidos capturados pela PSP.
Para debater Direitos Humanos, a PJ abre as portas da sua sede a um vasto conjunto de personalidades - como o constitucionalista Vital Moreira, comissário das comemorações - a comunidades religiosas - como a católica, a islâmica, a judaica e a ismaelita - a associações como a SOS Racismo e a ILGA (Intervenção Lésbica, Gay, Bissexual e Transgénero), das Mulheres contra a Violência, ou a APAV (Apoio à Vítima) - ou a organizações como o Observatório para o Tráfico de Seres Humanos.
"Na sua atividade, a polícia é a concretização dos Direitos Humanos. Quando investigamos a corrupção estamos a defender a Igualdade, quando investigamos os crimes de ódio estamos a defender a liberdade das pessoas e o direito às suas ideias, opções políticas, religiosas e sexuais. Até quando identificamos um cadáver estamos a dar uma identidade a essa pessoa, outro direito fundamental", explica uma fonte autorizada da organização da cerimónia.
"Consideramos uma iniciativa muito positiva falar de Direitos Humanos", declara ao DN o Sheikh David Munir, imã da Mesquia Central de Lisboa. "Apesar de os muçulmanos em Portugal não se sentirem perseguidos e estarem integrados, esta abertura da Polícia Judiciária, sendo uma entidade com autoridade, é de valorizar", acrescenta.
Idêntica satisfação vem da comunidade judaica. "Lembrar os Direitos Humanos, seja em que circunstância for, nunca é demais. No caso assume particular importância pois foi o tema escolhido pela Polícia Judiciária para assinalar o seu 73º aniversário. As forças policiais são um garante da ordem pública e simultaneamente uma das primeiras linhas de defesa desses mesmos direitos", salienta Ruben Obadia, porta-voz da Comunidade Israelita de Lisboa.
No seu entender, "a pertinência na escolha do tema, associando-o também às minorias religiosas é, em nosso entender, uma forma de recordar um passado, e muitas vezes um presente, onde os direitos e liberdades constitucionais ainda são postos em causa por alguns".
E nota uma coincidência: "curiosamente o aniversário da Polícia Judiciária é celebrado exatamente quatro dias depois de se assinalar 482 anos do início oficial da Inquisição em Portugal. De facto, a 22 de Outubro de 1536, proclamava-se em Évora, no púlpito da Sé, perante a corte, a bula Cum ad Nihil Magis, ou seja, a bula da criação da Inquisição em Portugal, cuja extinção formal só viria a ocorrer em 1821. Parabéns à Polícia Judiciária e em boa hora pela pertinência do tema"
Para Mamadou Ba, dirigente da SOS Racismo, trata-se de uma iniciativa "inédita" que o deixa "muito sensibilizado". "Já temos colaborado com a PJ, mas foi a primeira vez que fomos convidados com esta relevância. É consensual que a preocupação com os Direitos Humanos tem que ser quotidiana, com a promoção da igualdade e integridade física de qualquer cidadão, independentemente da sua cor de pele, opções religiosas, políticas ou sexuais", assinala.
Mamadou Ba espera que iniciativas como a da PJ possam ser uma "rutura com o olhar que ainda muitos elementos das forças de segurança têm com esta questão. Existindo esta reflexão da parte de uma polícia como a PJ, esperamos que seja um avanço".
No entanto, adverte ainda o dirigente do SOS Racismo, "é preciso ver como se vai concretizar na prática esta reflexão". Mamadou Ba lembra, por exemplo, "a necessidade de formação dos polícias, trabalho conjunto com as comunidades, ou a criminalização do racismo, como tem defendido a nossa associação".
A ILGA vê este desafio da PJ como uma "normalização" de um trabalho conjunto que desenvolve há vários anos com esta polícia. "É natural que organizações como a ILGA, sejam parceiras nestas temáticas, assim como é normal envolver a sociedade civil", afiança Marta Nunes, da direção. "Temos uma longa história com as forças de segurança em projetos de combate aos crimes de ódio e com a PJ, em particular no combate ao discurso do ódio online", acrescenta.
Para a ILGA, no contexto nacional e internacional atuais, a iniciativa da PJ "é importante". "As vítimas e crimes que a PJ acompanha tocam várias áreas e grupos da sociedade. Faz todo o sentido que nos envolvam e por isso faz tudo", salienta.