Diário de Guerra - Dia 2.  A caminho de Kiev. Polónia, porto seguro

Enviado Pedro Cruz faz o relato, todos os dias, dos acontecimentos na zona do conflito.
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Milhares de ucranianos, por estes dias, atravessam a fronteira entre a Ucrânia e a Polónia. A Cracóvia só chegam mulheres e crianças. Os homens estão obrigados a ficar na Ucrânia. A lei marcial impede-os de viajar e convoca-os para a batalha contra os russos.

Na estação de autocarros de Cracóvia, a primeira grande cidade polaca depois da fronteira, autocarros apinhados despejam famílias separadas por uma guerra. As mulheres trazem as malas com poucos pertences. As crianças, sobretudo as mais pequenas, a quem é difícil explicar o que está a acontecer, não dispensam os brinquedos favoritos. As viagens de autocarro entre a Ucrânia e a Polónia deixaram de ser regulares. Há vários dias que os horários servem apenas para recordar a vida como ela era até terça-feira da semana passada.

Uma travessia chega a demorar vários dias. A meio da manhã de ontem, um autocarro chega ao destino. Lá dentro, há cidadãos ucranianos que saíram da cidade natal ainda antes dos bombardeamentos. Estavam há cinco dias a cruzar toda a Ucrânia na direção oeste.

A "ferradura" de tropas russas que aperta a Ucrânia só deixa duas saídas possíveis, ambas para oeste. A Polónia e a Hungria.

Em Cracóvia, duas irmãs ucranianas passam o dia na central de camionagem. Esperam os compatriotas que chegam. Ajudam com contactos, dão indicações, mobilizam familiares e amigos para receberem quem não tem onde ficar. Não têm tempo para pensar muito no que está a acontecer.

Aline Manu, 26 anos, explica que está ali para "fazer o que puder". Não estranha que só cheguem mulheres e crianças. "Os homens tiveram de ficar para combater. Mas querem ter as famílias em segurança". "Ontem", conta ela, "uma mulher disse-me, a chorar, que não sabia como iria viver sem o marido". Ou, sequer, se o voltaria a ver.

Quem conseguiu fugir não tem histórias muito diferentes. Mulheres e crianças a salvo, homens por toda a Ucrânia para lutar.

Mas também há o inverso: ucranianos entre os 18 e os 60 anos que trabalham na Polónia e que apanharam o autocarro na direção de Kiev. O nacionalismo ucraniano, a ameaça russa, a vontade de não desistir sem lutar, levaram-nos a deixar o emprego e a regressar a casa.

No terminal, há sorrisos e lágrimas. Os sorrisos são sinónimo de segurança. As lágrimas não precisam de explicação.

Enviado à Ucrânia

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