Qual o significado de o Brasil de Jair Bolsonaro escolher para o primeiro encontro bilateral os Estados Unidos, de Donald Trump? É para demonstrar que os EUA são o parceiro preferencial do Brasil, não apenas do ponto de vista económico mas também militar e geopolítico. Neste último caso, ganha relevo a assinatura de um acordo para o uso americano do Centro de Lançamento de Alcântara [base brasileira considerada ótima para se lançar satélites pela proximidade com a linha do Equador]..Há também a controversa questão dos vistos... Bolsonaro deverá anunciar uma isenção - os cidadãos dos EUA não precisariam mais de visto no Brasil - mas sem reciprocidade. Essa questão gerará críticas porque, como se sabe, muitos turistas brasileiros vão lá de férias. Os governos Fernando Henrique Cardoso [FHC] e Lula da Silva, por exemplo, usavam a questão do visto como barganha, como negociação..A proximidade de Bolsonaro com Trump pode levar àquilo que alguns críticos veem como subordinação do Brasil em relação aos EUA? Desde o fim da Segunda Guerra Mundial, dados empíricos comprovam que o Brasil se foi distanciando dos EUA. Com momentos, no entanto, de, eu não diria subordinação, mas de alinhamento, como o que se prevê agora..Como se deu esse afastamento? Na Segunda Guerra, o Brasil escolheu o lado vencedor, os aliados, e cedeu espaço aos EUA, recebendo investimento. Entretanto, o governo de Juscelino Kubitschek solicitou uma espécie de Plano Marshall para a América Latina e não foi muito bem-sucedido, gerando certo afastamento. Após o golpe militar de 1964, apoiado pelos EUA, conforme comprovado em documentos, há um dos tais períodos de alinhamento, mas curto. Em 1965, o Brasil ainda manda tropas para a República Dominicana, para ajudar na deposição de um governo contrário aos interesses americanos, mas de então para cá notou-se um distanciamento paulatino e uma política de realismo pragmático. A ponto de o presidente brasileiro Ernesto Geisel ter sido o primeiro a reconhecer a independência de Angola, que estava do lado do bloco soviético, e de se ter aproximado do Movimento dos não Alinhados..E desde a redemocratização? Na década perdida, a de 1980, o Brasil necessariamente reduz ambições e Collor de Mello sente que não há alternativa a novo alinhamento - não a ponto de o [presidente argentino Carlos] Menem, que mantinha com os EUA o que foi chamado de "relações carnais", mas um alinhamento. Depois a relação dependeu também das relações pessoais entre os presidentes. Fernando Henrique Cardoso e Bill Clinton eram, ao lado do [primeiro-ministro Tony] Blair, símbolos da Terceira Via, a esquerda cor-de-rosa, e davam-se muito bem. Mas sem benefícios para o Brasil. Com Lula, o afastamento foi ainda maior, porque ele era contrário à ALCA [Associação de Livre Comércio das Américas, proposta por Clinton em 1995] e aproximou-se da China. Porém, tinha uma afinidade pessoal com George W. Bush, apesar de republicano, uma vez que ao contrário da dupla FHC-Clinton, os dois eram menos intelectualizados, mais, digamos, do povo..Até chegarmos a Bolsonaro-Trump. Os dois com visões do mundo semelhantes, nacionalistas, contrários à ONU e à Organização Mundial do Comércio, mas ao mesmo tempo bilateralistas. Trump sustentado por evangélicos e brancos, porque nos EUA a questão racial é importante, e Bolsonaro também por evangélicos e pelos católicos mais conservadores..O que esperar do encontro? Bolsonaro quererá apagar a má impressão de Davos, mas duvido que se sujeite a perguntas da imprensa - a associação ao Caso Marielle é um incómodo. Além do que discutir com Trump, é importante o encontro com Steve Bannon [ex-estratega de Trump e cofundador do site de notícias Breitbart News] porque ele quer-se assumir como um dos líderes da direita populista global.