Desconfinar pela medida pequena
O nome de António Costa ficará para sempre associado a compromissos. Mas agradar a gregos e a troianos tem o efeito secundário de deixar amargos de boca generalizados. Ontem, no anúncio das novas fases de desconfinamento, o primeiro-ministro voltou a pautar-se pelo seu jeito único de dar uma no cravo e outra na ferradura. Deixa os restaurantes servirem até à 01h00, mas limita os espetáculos a 50% da lotação e mantém fechadas a cadeado as portas de bares e discotecas. Nos transportes públicos já se pode voltar a andar como sardinhas (é época delas), mas em eventos desportivos só se admite um terço dos lugares ocupados. Começa-se a acabar com o teletrabalho... mas continua a fazer-se depender o regresso ao escritório das taxas de incidência de contágios covid e de outras condições para impedir que se concretize sem o proibir.
É com esta habilidade que o governo responde de forma a agradar aos especialistas que querem jogar pelo seguro e prolongar restrições, da mesma forma que não desilude o Presidente da República que vinha repetindo alertas sobre a chegada do momento de deixar de ter os olhos fixos na pandemia e começar a responder às necessidades da economia. A verdade é que, passada a adrenalina de ver regressar alguma normalidade aos nossos dias, ficamos com a sensação de que não haverá de facto mudanças fundamentais. Mesmo os setores do turismo e da restauração sentirão um certo alívio, mas ainda estão muito longe de poder respirar fundo.
O que é preciso ver é que enquanto Costa tenta agradar a todos nos prende a todos num semicoma que deixará efeitos profundos na recuperação do país, quando se tentar reerguer a economia. Neste momento, até os especialistas concedem que o aumento de casos tem relação direta com a quantidade de testes feitos - não é necessariamente motivo de preocupação. Até porque os graves não sobem. E a vacinação organizada pelo vice-almirante Gouveia e Melo corre a grande velocidade, estando as vítimas mais vulneráveis à covid já protegidas.
No que é que este plano a conta-gotas resulta? Numa saída morna e insípida do confinamento - não é cautela, é querer passar no meio das grandes decisões que se impõem. De resto, como temos visto, há quem possa tudo. Especialmente se vier de fora.