Descoberto artigo de Harper Lee para o FBI

A autora norte-americana, desaparecida em 2015, escreveu para a revista do FBI sobre o crime de "A Sangue Frio", afirma o seu biógrafo.
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Charles Shields, que tem escrito sobre Harper Lee, revelou a descoberta de um artigo sobre o quádruplo assassinato do Kansas, o mesmo que levou Truman Capote a escrever A Sangue Frio.

O artigo em causa foi publicado na revista Grapevine, uma publicação destinada aos funcionários do FBI e, segundo o biógrafo, é mais um texto desconhecido de Harper Lee.

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Uma descoberta que se junta ao manuscrito inédito, Vai e Pôe uma Sentinela, que foi a sensação literária do ano passado, meses após a morte da escritora, em fevereiro de 2015, aos 89 anos.

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"Dewey had important part in solving brutal murders" (Dewey foi importante para resolver crimes brutais), título do texto da revista, saiu em 1960, meses antes de Mataram a Cotovia e não está assinado, mas o biógrafo considera ter reunido provas suficientes para afirmar que é Harper Lee a autora.

Neste texto, Harper Lee detém-se sobre a investigação da morte violenta da Herb e Bonnie Clutter e dos seus filhos adolescentes, Nancy e Kenyon, na quinta onde viviam no Kansas. A escritora conhecia bem o caso. Acompanhou Truman Capote durante a viagem que o seu amigo de infância fez a esta zona. O escritor escreveu sobre a reação da comunidade aos crimes para a revista New Yorker e foi desta investigação que nasceu, seis anos depois, o romance A Sangue Frio.

A escritora chama ao caso "o mais extraordinário caso de assassinato da história do estado" e descreve com detalhe as atrocidades cometidas sobre o casal: "alvejados a curta distância" e "a garganta de Clutter foi cortada".

O texto segue com a descrição do trabalho do agente que liderou a investigação, Al Dewey. Dois homens viriam a confessar os crimes que teriam recebido entre 40 a 50 dólares por eles.

Descoberta graças a uma amiga

Enquanto revia a biografia da escritora, Mockingbird: A Portrait of Harper Lee, Charlies Shields diz que foi à procura de alguma pista nova a que não tivesse dado atenção antes. Releu artigos de jornal antigos do Kansas e entre eles o Garden City Telegram onde Dolores Hope, escreve dois parágrafos que viriam a ser cruciais para a descoberta deste artigo da Grapevine.

"A história do trabalho do FBI em geral e do agente Al Dewey do KBI nos crimes de Clutter vai aparecer na Grapevine, a revista do FBI", começa por ler-se no texto de Dolores Hope, uma autora que Shields já sabia ser amiga de Harper Lee.

O texto continua: "Nelle Harper Lee, jovem escritora que veio para a Garden City com Truman Capote para reunir material para um artigo para a New Yorker, escreveu o artigo. O primeiro livro de Miss Harper deverá ser publicado esta primavera e as primeiras informações dizem que está destinado ao sucesso".

Com esta informação, Charles Shields contactou a Grapevine, sediada em Washington. Primeiro, confirmaram que corria há muito tempo o rumor de que ela tinha publicado um artigo na revista, mas não sabiam quando. Shields deu a pista certa: uma vez que Dolores Hope escreveu a sua coluna em fevereiro de 1960, pediu que procurassem os números desse mês e de março de 1960. E em março, lá está: um artigo sobre o caso Clutter.

"Era típico da Harper Lee não querer ensombrar o amigo Truman Capote", diz o biógrafo, em jeito de justificação para o facto de não haver assinatura. "Lê-se como uma reportagem", acrescenta, elogiando a qualidade do trabalho.

Charles Shields defende só Harper Lee poderia ter escrito o texto, uma vez que contém detalhes a que apenas ela e Capote tiveram acesso. Ela acompanha-o na viagem e refere-se à escritora como "assistente de pesquisa".

Harper Lee e Truman Capote eram amigos de infância. O escritor é inspiração para a criação da personagem de Dill em Mataram a Cotovia. Uma vez que Lee apenas escreveu um livro, cresceu o rumor de que o livro teria sido escrito por Truman Capote, facto que ambos negaram sempre.

Depois da publicação do primeiro livro, Harper Lee quis manter-se à margem do mundo literário. Quando lhe perguntavam por que razão não tinha escrito mais livros respondia: "Disse o que queria dizer e não vou dizer de novo".

A publicação do manuscrito entretanto descoberto não foi pacífica. Algumas personagens, com mais 20 anos, são as mesmas que se encontram em Mataram a Cotovia, e foram levantadas questões relacionadas com a capacidade da autora de autorizar a publicação deste segundo livro.

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Os detalhes sobre este artigo da Grapevine serão incluídos no trabalho Mockingbird: a Portrait of Harper Lee: From Scout to Go Set a Watchman , que será publicado esta terça-feira, dia 26, e o artigo de Harper Lee faz parte do próximo número da Grapevine, com uma introdução de Charles Shields, disse o autor ao jornal britânico The Guardian.

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