De peito cheio

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Desta vez, a praia mais próxima fica a 120 quilómetros. A sul, no Alentejo profundo, numa casa secular, apalaçada do estilo neomanuelino, com influências da Casa Portuguesa, hoje classificada como imóvel de interesse municipal. Longe dos milhões de turistas que elegem, e bem, Portugal para as suas férias (por cima do muro, ouço apenas uns pares de alentejanos a apanhar pokémons nas mesas do jardim em frente).

Numa espécie de ironia sem intenção, é de fora que recebo, a estas horas desta terça-feira, pouco tempo depois da divulgação dos números oficiais, as notícias de novos recordes do turismo. No primeiro semestre do ano, entraram em Portugal 8,5 milhões de turistas, um número nunca antes visto, mais 10,2% em relação ao mesmo período de 2015. Só em junho, os hotéis registaram 1,9 milhões de hóspedes e 5,5 milhões de dormidas, mais10,3% e 9,6%, respetivamente, face a junho do no passado. E a despesa feita por cada estrangeiro que por cá passa, um objetivo imperioso do sector, também aumentou.

Os dados divulgados pelo INE são a última boa notícia de que me lembro sobre a economia portuguesa. O potencial do turismo, os seus benefícios ao nível da criação de emprego e de correção das contas externas, a sua performance, em contraciclo com a generalidade da economia, são motivos de regozijo - daqui do Baixo Alentejo, ou de Lisboa, no mais centro que há, a Praça Marquês de Pombal. Talvez seja sorte, mas os ajuntamentos de espanhóis, ingleses e franceses nunca me limitaram na minha vida de turista e de lisboeta. Chego a sorrir, sozinha, de cada vez que desço a Avenida e me cruzo com casais, novos e mais velhos, de mapa na mão a tentar perceber onde estão. Como já fiz tantas vezes em Nova Iorque, em Londres ou Amesterdão e continuarei a fazer em muitas outras cidades. É de uma Lisboa viva e vivida que gosto, de uma cidade descoberta a cada olhar, de monumentos e lugares merecidamente elogiados, vistos da forma como os locais jamais conseguirão voltar a fazê-lo. Adoro o frenesim que se vive no Chiado, de verão ou de inverno, toda a animação que se espalha pela noite lisboeta. Faço, de facto, parte dos muitos portugueses, da maioria, que enchem o peito para explicar como chegar ao Jardim da Estrela. Admiro a política imprimida no governo de Passos pelo ex-secretário de Estado do Turismo, Adolfo Mesquita Nunes, e da corrente que se foi gerando ao longo dos últimos cinco anos na promoção e reestruturação de um sector que arriscava estagnar. Beneficiámos de factos externos, como o conflito em vários países concorrentes, mas soubemos aproveitá-los e não foi apenas à custa de tuk-tuks e do airbnb. Falta, é verdade, o mais difícil: o equilíbrio. Impedir que Lisboa se transforme numa barcelona e que as nossas belas terras continuem a ser voluntariamente partilhadas com quem não as conhece. Estamos a tempo de o conseguir e é nestas fases que os agentes turísticos, poder local e governo podem, juntos, evitar um descalabro.

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