De João Vieira Pinto a Ronaldo. Deixaram Portugal com menos de 20 anos e nem todos se deram bem

O anúncio oficial da transferência de João Félix para o Atlético de Madrid (por 126 milhões de euros) pode ocorrer a qualquer momento. O jovem avançado do Benfica é mais um jogador que vai deixar a Liga portuguesa com menos de 20 anos (tem 19, faz 20 em novembro) rumo a uma aventura num emblema estrangeiro, à semelhança de outros casos que aconteceram nos últimos 30 anos. A questão da (pouca) idade tem sido muitas vezes colocada, havendo quem defendesse que deveria ficar mais um ano no Benfica..Há vários exemplos de jogadores portugueses que deixaram clubes nacionais e se transferiram para grandes emblemas europeus. Um dos primeiros casos mais mediáticos foi o de João Vieira Pinto, para o Atlético de Madrid, onde nunca chegou a jogar e deixou o jogador traumatizado para a vida. Há mais futebolistas que não se deram bem, como Ricardo Quaresma no Barcelona, por exemplo, ou mais recentemente Renato Sanches no Bayern Munique. O caso de maior sucesso é o de Cristiano Ronaldo, quando deixa o Sporting com 18 anos e se afirma quase de imediato no Manchester United. Veja aqui dez casos de miúdos sub-20 que trocaram clubes portugueses por estrangeiros com menos de 20 anos (por isso não entram nestas contas Bernardo Silva e Rúben Neves, por exemplo) e a trajetória que tiveram..João Vieira Pinto (1990, do Boavista para o At. Madrid).O avançado, hoje quadro da Federação Portuguesa de Futebol (FPF), tinha 18 anos, era casado, já tinha um filho e jogava no Boavista presidido pelo major Valentim Loureiro. J.V.P. tinha acabado de dar nas vistas na seleção de sub-20 que se sagrou campeã do mundo em Riade em 1989 e com uma cunha de Paulo Futre, na altura grande figura dos colchoneros, recebeu uma proposta do Atlético de Madrid. Mas a experiência foi para esquecer, pois o sonho rapidamente virou pesadelo, já que foi integrado na equipa B do Atlético. "A situação do futebol antes da Lei Bosman era muito complicada porque havia limite para estrangeiros. Apanhei essa fase e, sendo muito novo, o Atlético pagou 500 mil contos (2,5 milhões de euros) pelo meu passe. Ora o meu caminho no clube estava tapado por jogadores de grande qualidade e experiência [...] mandaram-me para o Atlético Madrileño, que era a equipa B. Mas isso trazia água no bico, como costuma dizer-se. Fizeram-no com o objetivo claro de não pagar a totalidade da transferência. Vivi então o lado mais obscuro do futebol. Até lá tinha sido tudo cor-de-rosa", contou numa entrevista ao jornal Record em 2009. Foi por isso que nunca mais aceitou propostas do estrangeiro. Em 1991-92 regressou para fazer uma temporada no Boavista e depois seguiram-se oito temporadas no Benfica... até ser despedido por João Vale e Azevedo. Mudou-se depois para o rival Sporting, onde realizou mais quatro temporadas. Seguiram-se mais dois anos no Boavista e finalmente a fechar a carreira duas temporadas no Sp. Braga..Luís Boa Morte (1997, do Sporting para o Arsenal).O antigo avançado é um caso muito particular. Formado nas escolas do Sporting, nunca chegou a realizar qualquer jogo com a camisola da equipa principal dos leões, pois na sua primeira época de sénior foi emprestado ao Lourinhanense, na altura clube satélite do Sporting. As boas exibições no Torneio de Toulon (Portugal chegou à final) impressionaram alguns olheiros e no verão de 1997, com 19 anos, assinou pelo poderoso Arsenal. "Primeiro fui informado de que tinha um clube do top 5 de Inglaterra que me queria contratar. "Não soube logo que era o Arsenal. Eu e o meu empresário, o Jorge Gama, fomos conversar com os responsáveis do Sporting, porque a verdade é que naquela altura eu não tinha interesse em sair do clube. Queria renovar, ver o meu contrato melhorado e ficar. Fomos falar com Simões de Almeida, o presidente do Sporting. E foi-me dito que não tencionavam fazê-lo. Fiquei então com essa opção do futebol inglês em aberto. Segui para Inglaterra e só quando cheguei lá é que soube que era o Arsenal que me queria contratar. Obviamente não hesitei", contou numa entrevista ao DN em outubro de 2018. Ficou dois anos no clube londrino e depois seguiu-se o sucesso na Premier League inglesa. Uma época no Southampton, seis no Fulham e mais cinco no West Ham. Em final de carreira, ainda passou pelo Larissa da Grécia e pelos Orlando Pirates da África do Sul. Em 2012-13 terminou a carreira no Chesterfield, da League Two inglesa. Entre os vários títulos conquistados destacam-se um campeonato inglês e uma Taça de Inglaterra pelo Arsenal..Hugo Leal (1999, do Benfica para o Atlético Madrid).No verão de 1999, Hugo Leal avançou com pedido de rescisão unilateral do contrato que o ligava ao Benfica. Na base da decisão do jogador estavam alegadas ofensas do presidente João Vale e Azevedo. E aos 19 anos o médio promissor assinou pelo Atlético Madrid, onde ficou duas temporadas. "Gostei muito da experiência. Ao fim de um ano já estava acomodado à cidade, habituado à cultura e aos horários espanhóis. E no final desse ano os meus pais regressaram a Portugal e eu fiquei lá com o meu irmão André. A certa altura conheço a minha mulher, Elizabeth, e passámos a viver os três", contou numa entrevista à Tribuna do Expresso, em 2017, ele que nesses dois anos fez um total de 71 jogos e apontou seis golos pelos colchoneros. Em 2001 teve oportunidade de mudar para o campeonato francês e assinou pelo Paris Saint-Germain, onde ficou três temporadas. Mas nem tudo foram boas recordações: "Gostei principalmente da minha experiência no primeiro ano, depois as coisas começaram a complicar-se para mim com uma lesão no joelho e com a constante referência ao meu salário. A comparação entre aquilo que eu jogava e o que ganhava levou a que a opinião das pessoas fosse jogando contra mim. Cheguei a ter muitos jogos em casa em que quando tocava na bola era assobiado." Em 2004-05 regressou a Portugal com destino ao FC Porto, onde esteve meia época e depois foi cedido à Académica. Seguiram-se Sp. Braga, Belenenses, Trofense, Salamanca, V. Setúbal e finalmente o Estoril, onde terminou a carreira em 2013..Simão Sabrosa (1999, do Sporting para o Barcelona).O extremo era já uma das grandes promessas do futebol português quando no verão de 1999, com 19 anos, trocou o Sporting pelo Barcelona. "Apesar de não ter ganho nenhum título, a nível pessoal foram dois bons anos, porque treinando e jogando com os melhores do mundo acabamos sempre por aprender e melhorar. No segundo ano, o Figo, que era o meu ídolo, foi para o Real Madrid e acabei por jogar mais. Mas na parte final houve ali um momento caricato, porque saiu o Serra Ferrer [treinador] e entrou o [Carles] Rexach. Ele quando era jogador era extremo, mas como treinador não jogava com extremos. Então, eu, o Overmars e o Zenden ficávamos no banco", contou Simão numa entrevista à Sábado, em 2013. Após dois anos na Catalunha, regressou a Portugal para representar o Benfica durante seis épocas. Decidiu regressar depois à Liga espanhola para representar o Atlético de Madrid durante três épocas e meia. Depois esteve na Turquia, no Besiktas, voltou a Espanha para vestir as cores do Espanyol e terminou a carreira no NorthEast, da Índia. Curiosamente, os dois principais títulos que conquistou no estrangeiro não foram pelo Barcelona - venceu a Liga Europa e a Supertaça Europeia pelo Atlético de Madrid. E só foi uma vez campeão nacional - pelo Benfica na época 2004-05..Hugo Viana (2002, do Sporting para o Newcastle).No verão de 2002, o então médio leonino de 19 anos deixou Alvalade e deu início a uma carreira internacional, assinando um contrato válido por cinco anos com o Newcastle treinado por Bobby Robson, num negócio que rendeu cerca de 12,5 milhões de euros aos cofres leoninos. Após duas temporadas na Premier League, haveria de regressar a Alvalade em 2004-05, por empréstimo do emblema inglês, e na época seguinte foi cedido ao Valência, de Espanha. O clube do país vizinho acabou por adquirir o seu passe e manteve-se ligado ao emblema che até 2009 (pelo meio com um empréstimo ao Osasuna), ano em que regressou ao campeonato português para representar o Sporting de Braga durante quatro temporadas. Em 2013-14 partiu para uma aventura nos Emirados Árabes Unidos, onde esteve durante quatro anos. Primeiro no Al-Ahli e depois no Al-Wasl, onde colocou um ponto final na carreira. "Não me arrependo de nenhuma decisão que tomei na minha carreira. Relativamente à minha transferência para a liga inglesa, devo dizer que tomei a decisão conscientemente, sabia que ia ser duro e difícil. Mas foi uma boa experiência e cresci em todos os sentidos, não só como jogador. Bobby Robson foi um pai para mim. E com isto digo tudo sobre a melhor pessoa que conheci no futebol", confessou Hugo Viana numa entrevista em Espanha, em 2012. Curiosamente, o ex-futebolista não venceu qualquer título em Inglaterra e Espanha. Foi campeão na Arábia e também pelo Sporting..Ricardo Quaresma (2003, do Sporting para o Barcelona).A época 2002-03 correu-lhe bem no Sporting e no verão chegou um convite irrecusável do todo-poderoso Barcelona. Então com 19 anos, o ciganito não hesitou. "Lembro-me, quando ainda não era ninguém no futebol, de ver os jogos do Barcelona à tarde na televisão e vibrar com as jogadas do Romário, do Stoitchkov e sonhar em jogar neste grande clube. Ainda não sabia sequer se ia impor-me no Sporting, mas já sonhava com isto. E quando surgiu esta oportunidade não hesitei. E agora consegui", referiu quando assinou pelo clube da Catalunha. Mas o que à partida era um sonho tornou-se um pesadelo. E as coisas no Barcelona não correram nada bem sob as ordens do treinador Frank Rijkaard na única época em que ficou no Barça (apenas dez jogos a titular e um golo). "Amadureci como homem, mas em termos futebolísticos não aprendi nada. Ele [Frank Rijkaard] queria que eu jogasse de uma maneira e eu tentei. Mudei a minha forma de jogar para lhe agradar, mas acabava no banco ou na bancada. Depois decidi jogar o meu futebol e entrámos em guerra. Até hoje não sei explicar o que me aconteceu no Barcelona. Foi a pior época da minha vida e o treinador não me deu explicações", desabafou numa entrevista ao jornal O Jogo em 2004. Foi precisamente em 2004 que tudo mudou e Quaresma assinou pelo FC Porto, envolvido numa troca com Deco. Foram quatro anos de grande nível no Dragão. Em 2008-09 assinou com o Inter de Milão por duas épocas (ainda esteve cedido ao Chelsea) e depois a carreira prosseguiu na Turquia, ao serviço do Besiktas, apenas interrompida com um ano nos Emirados Árabes Unidos e mais duas épocas no FC Porto..Cristiano Ronaldo (2003, do Sporting para o Manchester United).Sem qualquer dúvida, a carreira de maior sucesso entre os portugueses que deixaram ainda muito novos a Liga portuguesa com destino ao estrangeiro, como o demonstram os inúmeros troféus coletivos e individuais. No verão de 2002, o então extremo do Sporting, de 18 anos, convenceu Alex Ferguson, treinador do Manchester United, que o contratou aos leões. A partir daí nunca mais parou. Em Old Trafford explodiu e entre 2003 e 2009 ganhou tudo - entre os muitos títulos destacam-se uma Liga dos Campeões, um Mundial de Clubes e três campeonatos ingleses. E também a primeira Bola de Ouro. Em 2009, a troco de cem milhões de euros, mudou-se para o Real Madrid, onde bateu todos os recordes, conquistou quatro Ligas dos Campeões e mais quatro Bolas de Ouro para melhor jogador do mundo. Esteve nove anos no Santiago Bernabéu e no verão de 2018 decidiu mudar de ares, transferindo-se para a Juventus, onde se sagrou campeão italiano, a troco de... 117 milhões de euros. "O Cristiano foi o jogador mais talentoso que treinei, superando todos os outros com quem trabalhei - e foram muitos", escreveu Alex Ferguson na sua autobiografia. Entretanto sagrou-se o melhor marcador de sempre da seleção portuguesa (88), foi campeão da Europa (2016) e recentemente ajudou a equipa das quinas a conquistar a Liga das Nações. Aos 34 anos, mantém-se ao mais alto nível e tem como grande objetivo chegar à sexta Champions..Bruma (2013, do Sporting para o Galatasaray).Em 2013, então com 18 anos, Bruma protagonizou uma das novelas do verão. O jogador pediu a nulidade do contrato que o ligava ao Sporting e não se apresentou no arranque dos trabalhos dos leões. Bruma defendia que o seu contrato tinha terminado; o Sporting assegurava que durava mais um ano. A Comissão Arbitral Paritária, que na altura resolvia estes diferendos, deu razão à SAD leonina. A solução encontrada foi a saída do futebolista, mas não a custo zero. Bruma rumou ao Galatasaray, da Turquia, a troco de 12 milhões de euros. O extremo ficou duas temporadas no clube turco, em 2015-16 foi cedido à Real Sociedad, de Espanha, e voltou depois à Turquia. As boas exibições motivaram o interesse do Leipzig, da I liga alemã, para onde se transferiu na temporada 2017-18 e ficou duas épocas. Na semana passada esteve com um pé no FC Porto, mas acabou por optar pela proposta do PSV Eindhoven, da Holanda, que pagou 15 milhões pela sua contratação. "Continuo a pensar que dei o passo certo [trocar o Sporting pelo Galatasaray] e não estou nada arrependido de ter saído do Sporting, até porque estou numa das melhores ligas do mundo", referiu Bruma à agência Lusa, em março de 2016, quando representava a Real Sociedad. O extremo tem três títulos conquistados, todos ao serviço do Galatasaray - um campeonato, duas Taças da Turquia e uma Supertaça..Diogo Dalot (2018, do FC Porto para o Manchester United).Surpreendentemente, ou talvez não, no verão de 2018 o Manchester United (treinado por José Mourinho) anunciou a contratação do jovem português ao FC Porto. Na altura da transferência, Diogo Dalot tinha 19 anos. O negócio rendeu 22 milhões de euros aos cofres dos dragões, um bom negócio tendo em conta que o defesa só tinha mais um ano de contrato. O lateral, que fez grande parte da sua formação no Dragão, estreou-se pela equipa principal do FC Porto na temporada 2017-18 - depois de 23 jogos pela equipa B, fez oito pela formação principal. "A vida reserva-nos surpresas e vai levar-nos, por agora, por caminhos diferentes. Mas ao FC Porto nunca serei capaz de dizer adeus porque nunca se diz adeus à nossa família. A minha profissão leva-me agora para outro clube, para outro país, porque nenhum futebolista pode recusar a oportunidade de jogar num clube como o Manchester United e trabalhar com José Mourinho. Mas o meu amor ao FC Porto vai continuar a acompanhar-me para todo o lado. Um enorme obrigado por tudo de mais um adepto do FC Porto. Este é apenas um até já", escreveu em junho de 2018 nas redes sociais. No primeiro ano em Old Trafford participou em 23 jogos (19 a titular). Mas nesta nova época pode ter a vida mais complicada, pois o United contratou para a mesma posição Aaron Wan-Bissaka, ex-Crystal Palace..Renato Sanches (2016, do Benfica para o Bayern Munique).Um exemplo de como sair cedo (18 anos) de um clube português para uma das maiores potências europeias nem sempre corre bem. No dia 10 de maio de 2016, ainda antes do início do Campeonato da Europa realizado em França que Portugal venceu, Renato Sanches foi anunciado como reforço do Bayern de Munique. No comunicado enviado à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) o Benfica informava que ia encaixar 35 milhões de euros, podendo a transferência atingir 80 caso fossem cumpridos o máximo de objetivos. A verdade é que a transferência de Renato revelou-se um verdadeiro flop. Na primeira época participou num total de 25 jogos em todas as competições, mas apenas nove a titular. A pouca utilização levou o emblema germânico a emprestar o médio que brilhou ao serviço do Benfica ao Swansea, de Inglaterra, que era orientado por Carlos Carvalhal. Aqui as coisas também não lhe correram bem e com uma lesão à mistura não se mostrou. Regressou ao clube bávaro na época passada... mas outra vez sem grande sucesso. O próprio jogador já admitiu várias vezes que quer deixar o Bayern. "Todos os outros jovens como Kimmich, Gnabry e Coman jogam. Só eu é que não jogo. Mostrei nos treinos que sou bom jogador. Acho que fui quem teve menos oportunidades entre os jogadores jovens. Não quero que voltem a emprestar-me. Se sair, será em definitivo", disse recentemente ao jornal alemão Bild.

De João Vieira Pinto a Ronaldo. Deixaram Portugal com menos de 20 anos e nem todos se deram bem

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