"Pensar a economia do nosso planeta" é o tema do 7.º Encontro Anual do Conselho da Diáspora Portuguesa, que se realiza na sexta-feira, em Cascais. Este encontro anual reúne conselheiros provenientes de diversos países, além de responsáveis empresariais, económicos e políticos, conta com a participação de Augusto Santos Silva, ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal. O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, estará no encerramento..De acordo com a organização, o encontro "propõe o debate sobre os desafios que se colocam à transição para uma economia digital, ambientalmente sustentável e um novo sistema de produção e consumo, de baixo desperdício e alto desempenho, que respeite os limites dos recursos ambientais e ao mesmo tempo garanta as aspirações de progresso e conforto conquistadas pelas sociedades ocidentais nas últimas décadas"..Este encontro é também um bom pretexto para fazermos uma radiografia da diáspora portuguesa:.1. Quantos são os emigrantes portugueses?.De acordo com os dados do Observatório da Emigração (relativos a 2017), existirão cerca de 2,3 milhões de emigrantes portugueses..Desses, a esmagadora maioria (1,5 milhões) está noutros países da Europa; 593 mil estão na América e 172 mil noutros locais..2. Porque é que se costuma dizer que Portugal é um país de emigrantes?.Não sendo um dos grandes países de emigração, como o México ou a Índia, com mais de 12 milhões de emigrantes cada, Portugal era, em 2017, o 27.º país do mundo com mais emigrantes, segundo as estimativas da ONU..Além disso, Portugal continua a ser, em termos acumulados, o país da União Europeia com mais emigrantes em proporção da população residente (considerando apenas os países com mais de um milhão de habitantes). Vivem fora do país cerca de 22% dos portugueses. Assim, no que toca à taxa de emigração, Portugal é o 13.º país do mundo com mais emigrantes..3. Quantos portugueses saíram do país em 2018?.Em 2018 saíram do país para viver no estrangeiro, por mais ou menos um ano, 81 754 indivíduos de acordo com os dados do INE/ Pordata. O Observatório da Emigração apresentou dados provisórios para 2018 que apontam para cerca de 80 mil saídas..Destes, mais de metade (50 154) são emigrantes temporários e 31 500 emigrantes permanentes..4. A emigração está relacionada com a crise económica?.2011 foi um ano determinante: em maio foi assinado o programa de ajustamento da troika. Entre 2011 e 2013, o país continuou a viver uma grave recessão económica. Em 2013, o PIB (Produto Interno Bruto) registou uma contração de 1,6%. Já a taxa de desemprego subiu até aos 16,2%. Muitas pessoas decidiram procurar trabalho no estrangeiro..Aliás, datam de 2011 as polémicas declarações do então primeiro-ministro Pedro Passos Coelho, que, comentando o desemprego entre os professores, disse: "Nos próximos anos haverá muita gente em Portugal que, das duas uma: ou consegue, nessa área, fazer formação e estar disponível para outras áreas, ou, querendo manter-se, sobretudo como professores, podem olhar para todo o mercado de língua portuguesa e encontrar aí uma alternativa." Antes dele, já o então secretário de Estado do Desporto, Alexandre Mestre, tinha dito: "Se estamos no desemprego, temos de sair da zona de conforto e ir para além das nossas fronteiras.".E foi exatamente isso que os portugueses fizeram: em 2011, segundo o INE, mais de cem mil pessoas saíram do país, quase 44 mil de forma permanente - o que representou um aumento de 85% face às 23 760 que o tinham feito no ano anterior. O Observatório da Emigração contabiliza 85 mil saídas em 2011..De acordo com um estudo realizado pela Gfk e divulgado em junho de 2011, 37% da população ativa portuguesa estava disposta a mudar para outro país para encontrar um emprego melhor..A partir daí, o número foi sempre aumentando. Em 2013, o INE regista o maior número de saídas permanentes: 51 958 (de um total de mais de 128 mil saídas). E em 2014, ainda segundo o INE, terão saído do país 134 624 pessoas. Os dados do Observatório são ligeiramente mais baixos: 120 mil e 115 mil saídas em 2013 e 2014, respetivamente..Entretanto, Portugal deixou de estar sujeito aos planos de ajustamento económico. De então para cá, o número de pessoas que saem do país tem vindo a diminuir. "Globalmente, a nova fase de declínio da emigração a partir de 2014 explica-se pela retoma do crescimento económico em Portugal, expresso na revitalização do mercado de trabalho, com crescimento do emprego e descida do desemprego. De facto, a taxa de emprego cresceu de 49,7%, em 2013, para 55% em 2018, e a de desemprego desceu, no mesmo período, de 16,2% para 7%", lê-se no Relatório da Emigração, apresentado na terça-feira passada..No entanto, sublinha o relatório, "a emigração não se reduziu com a mesma velocidade da recuperação económica". Primeiro, porque o grande crescimento do número de saídas nos anos anteriores criou uma série de redes que permitem hoje uma maior trajetória de mobilidade. Além disso, apesar da retoma do crescimento da economia portuguesa, "os níveis de desigualdade, em geral, entre Portugal e os principais países de destino da emigração portuguesa, persistem, tornando improvável, nos próximos anos, uma redução no volume da emigração para níveis anteriores à crise"..5. São mais os que saem ou os que vêm para Portugal?.2011 marca também o início dos saldos negativos no que toca aos movimentos migratórios em Portugal: ou seja, saíram mais pessoas do país do que aquelas que entraram. A crise económica é responsável pela saída de portugueses que vão à procura de melhores condições de vida, mas também de estrangeiros que residiam aqui e que, perante as dificuldades, regressam ao seu país de origem. O saldo negativo atinge o seu ponto máximo em 2013 e, desde então, tem vindo a recuperar..No total, Portugal perdeu quase 300 mil pessoas entre 2010 e 2018, mas parece estar há dois anos a reverter essa sangria.2017 é o primeiro ano, após a crise, em que o saldo migratório é positivo: entraram no país mais 4888 indivíduos do que os que saíram. A tendência manteve-se: cerca de 43 mil pessoas entraram em Portugal no ano passado..No entanto, é preciso olhar para esses dados com atenção: dessas, mais de 20,4 mil têm nacionalidade ou ascendência portuguesa. Ou seja, são portugueses que estão a regressar a casa.."Olhando para os números das saídas e dos regressos de 2016 e 2017 dos cerca de 500 mil portugueses que saíram entre 2010 e 2015, poderíamos apontar para um regresso ao país de 350 mil", tinha já informado, no ano passado, o secretário de Estado das Comunidades, José Luís Carneiro.."Estamos sempre muito preocupados com o défice orçamental mas o défice de população é muito importante para o futuro", comentou ao DN Gonçalo Saraiva Matias, especialista em direito das migrações e membro do conselho de administração da Fundação Francisco Manuel dos Santos (a que pertence a Pordata). "E é muito interessante esta atenuação do défice demográfico. Continuamos a perder população mas estamos a perder menos. E a única solução viável para reverter esta perda a curto prazo é a migratória. As políticas de natalidade são importantes mas levam muito tempo a fazer efeito. Se mantivermos esta tendência nos próximos dois, três anos, o saldo global passará a ser positivo.".6. Para onde vão os portugueses?.Apesar de a emigração para o Reino Unido ter caído 17%, o país foi escolhido por 19 mil portugueses no ano passado e continua a ser o principal destino..O único país que regista uma subida sustentada há já quatro anos é a vizinha Espanha. Em 2018, a emigração portuguesa aumentou 18% com quase 11 mil novas entradas - e este foi o segundo país escolhido pelos portugueses..Seguem-se, como principais destinos dos fluxos, com valores entre cinco e dez mil entradas de portugueses, a Suíça (para onde o número de emigrantes desceu, pelo quinto ano consecutivo), a França, a Alemanha. Fora da Europa, os principais países de destino da emigração portuguesa, cada vez mais secundários em termos globais, integram o espaço da CPLP: Angola (dois mil em 2018, valor também em queda), Moçambique e Brasil..Dos 23 países de destino mais escolhidos pelos portugueses para emigrar em 2018, mais de metade (14) são europeus e entre os dez principais países de destino da emigração portuguesa apenas dois se localizam noutro continente: Angola e Moçambique..Assim, e de acordo com as estimativas da ONU, a França continua a ser o país onde vive um maior número de emigrantes nascidos em Portugal, mas, pela primeira vez desde 2012, abaixo do limiar dos 600 mil residentes. Esta predominância da França é explicada pela grande vaga de emigração dos anos 1960/70..Os outros países onde residem mais emigrantes nascidos em Portugal são: Suíça - 218 mil, EUA - 178 mil, Canadá - 161 mil, Reino Unido -141 mil, Brasil -138 mil (dados de 2010) Alemanha - 115 mil, Espanha - 100 mil.Reforça-se a tendência para uma maior concentração da emigração na Europa. Em 1960, de acordo com os cálculos do Banco Mundial, viviam na Europa 16% dos portugueses emigrados. Entretanto, e acordo com a ONU, a percentagem de portugueses a viver na Europa passou de 53%, em 1990, para 62%, em 2015, e 66%, em 2017..7. Os pedidos de nacionalidade e o caso do Reino Unido.O Reino Unido é responsável por quase 30% das saídas nos últimos anos. Em 2017 a emigração portuguesa para o Reino Unido sofreu uma quebra de 26%. Neste ano a diminuição foi de 17%. Em contrapartida, manteve-se o crescimento do número de aquisições da nacionalidade britânica por portugueses residentes no Reino Unido: mais 55% em 2018. Foram mais de dois mil os portugueses que pediram nacionalidade britânica no ano passado, o que pode ser explicado pela iminência do Brexit..No entanto, os países em que os números de aquisição da nacionalidade por emigrantes portugueses são mais elevados continuam a ser a Suíça (3285 em 2018) e a França (2,5 mil em 2016)..Depois do Reino Unido, aparecem o Luxemburgo, com 1593 pedidos de nacionalidade em 2018, e os EUA com 1807 processos de nacionalidade em 2017.."O número de portugueses emigrados com estatuto de estrangeiro nos países de destino depende sobretudo da antiguidade do fluxo migratório e do regime de nacionalidade predominante nesses países", explica o relatório do Observatório da Emigração. Não nos deve surpreender, por isso, que nos EUA e nos Canadá, onde existem duas das maiores comunidades portuguesas, apenas uma pequena parte mantenha o estatuto de estrangeiros. Pedir a nacionalidade aqui é uma forma de ter os seus direitos assegurados. Já em países como Alemanha, Luxemburgo ou Suíça, são poucos os portugueses que pedem a nacionalidade..8. Quem emigra?.De acordo com o Observatório da Emigração, a última caracterização sociodemográfica dos emigrantes portuguesa foi feita em 2011. Aí se concluía que, em termos globais, "a população portuguesa emigrada encontra-se em envelhecimento e continua a ser maioritariamente composta por ativos pouco qualificados". Nesta altura, o grupo etário dos portugueses emigrados com mais de 64 anos era de 17%..Observando as tabelas da Pordata que mostram a evolução da emigração por grupos etários, verifica-se, como é óbvio, que os grupos em que se regista o maior número de saídas são nos 20-24 anos e 25-29 anos. No entanto, também é possível ver que nos últimos anos (desde 2011) aumentaram as saídas no grupo 30-34 anos e até no grupo 35-39 anos, o que pode estar relacionado com o aumento do desemprego em Portugal..Quanto às qualificações, apesar do predomínio das baixas e muito baixas qualificações, observava-se já um crescimento significativo da proporção dos mais qualificados: a percentagem de portugueses emigrados com formação superior a residir nos países da OCDE praticamente duplicou, passando de 6% para 11%, entre 2001 e 2011. Nesta altura, havia já uma percentagem maioritária de trabalhadores de qualificações intermédias (58% em 2010/11)..E estamos a falar de dados anteriores à recente "vaga de emigração" de 2011-2013. A ideia que temos é que nos últimos anos existiu uma emigração de jovens com mais qualificações. A expressão "fuga de cérebros" tornou-se comum para referir precisamente essa emigração de jovens recém-licenciados (médicos, cientistas, economistas, gestores, engenheiros) que conseguem melhores condições de trabalho no estrangeiro..Segundo dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico, em 2013 a taxa de emigração qualificada era já de 20%, o que seria a maior da União Europeia..9. Quanto valem as remessas dos emigrantes?.Entre 2017 e 2018, o valor das remessas recebidas em Portugal cresceu cerca de 4%, sendo superior a 3,6 mil milhões de euros. No entanto, devido ao crescimento económico verificado em Portugal no mesmo período, o valor das remessas em percentagem do PIB manteve-se em 1,8%..Os dois países onde residem mais portugueses, França e Suíça, foram também os países de origem de mais de metade das remessas recebidas em Portugal em 2018 (31% e 24%, respetivamente). Seguem-se Reino Unido (9%), EUA (7%), Alemanha e Angola..O maior crescimento, tanto em termos absolutos como relativos, foi o das remessas recebidas da Suíça. Refletindo o crescimento da emigração para Espanha, este foi o país em que se verificou a segunda maior taxa de crescimento relativo do valor das remessas recebidas em Portugal no ano passado..Em termos comparados, explica o relatório do Observatório da Emigração, o peso das remessas no PIB tem, em Portugal, um valor situado num patamar comum ao das economias mais desenvolvidas ou de maior porte, num indicador que variava, em 2018, entre os 29%, no caso do Nepal, e menos de 0,1%, nos EUA..10. A emigração pode influenciar a política externa de Portugal.Quando em 1987, a Assembleia Geral da ONU aprovou, com 129 votos a favor, um apelo para a libertação incondicional de Nelson Mandela, houve três países que votaram contra. Foram eles: os EUA (de Reagan); a Grã-Bretanha (de Thatcher) e Portugal (de Cavaco Silva). Este é um daqueles factos que, de vez em quando, é referido como exemplo de como nem sempre o governo português assumiu posições na sua política externa. Mas também é verdade que Portugal tentava assegurar as suas boas relações com o governo da África da Sul, uma vez que aí residia uma importante comunidade portuguesa. O número de emigrantes portugueses na África do Sul diminuiu drasticamente após o fim do apartheid. Segundo od Censos de 2011, residiam no país mais de 15 mil portugueses. O número atual deverá ser superior a 40 mil..O mesmo é possível dizer em relação às reticências que o governo português sempre teve em manifestar-se sobre a política interna da Venezuela e a política do seu anterior presidente, Nicolás Maduro. Não há dados recentes fiáveis sobre a emigração para a Venezuela. De acordo com os Censos de 2011, neste ano havia mais de 37 mil emigrantes portugueses naquele país. Cerca de 80% declararam ter chegado entre a década de 1940 e o início da de 1980. Desde então, o número de portugueses a mudar-se para o país tem vindo a diminuir. Hoje, devido às muitas tensões políticas, económicas e sociais, a Venezuela não é um destino da emigração portuguesa, pelo contrário, a tendência é para que os portugueses que lá estão regressem ao seu país de origem. Apesar de tudo, a Venezuela deverá ser o 10.º país do mundo onde residem mais portugueses emigrados.