Da glória portista em Viena à padaria no Bairro Castelão

Esteve no primeiro título europeu do FC Porto, em 1987, e agradece "tudo" a Pinto da Costa e Artur Jorge. Com 61 anos, é "um velhinho feliz" e preside a associação que ajuda ex-atletas
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Foi uma lesão no joelho, sofrida em 1981, que levou Celso a pensar em "amealhar algum dinheiro" para o futuro. Nessa altura deu-se conta de que "o futebol podia acabar de um momento para o outro", mas, "felizmente", para ele o melhor da carreira ainda estava por viver. Seguiu-se uma década cheia de glória e alguns "trocados", que foi investindo, depois de ser coroado campeão europeu (titular na final de Viena contra o Bayern de Munique, em 1987) pelo FC Porto.

Habituado a fazer marcação cerrada aos adversários, o antigo central dos dragões teve "olho" para os negócios: "Fui-me preparando para deixar o futebol e, quando deixei, pensei no que ia fazer com o dinheiro. A maioria dos jogadores reformados tinha táxis e a minha mulher disse "táxi não, já há muitos, vamos ver o que necessita o bairro". E faltava pão fresco!" E foi assim que montou uma panificadora, "padaria como vocês dizem", no Bairro do Castelão, em Fortaleza.

Sem vergonha de meter a mão na massa, foi "aprender a fazer pão, salgados, bolos, tudo...". Apesar de ter funcionários, queria saber fazer para ensinar. "Tive 25 funcionários, mas lidar com ser humano é muito difícil e deu-me muitos cabelos brancos, hoje eu tenho de pintar o cabelo para me manter em forma (risos)", contou Celso, que há uns anos abriu uma segunda padaria e contratou um gerente.

Dessa forma ficou com mais tempo livre para outros projetos, como a AGAP, uma associação que acompanha os antigos profissionais de futebol do Ceará, que preside desde 2009. "O ex-atleta no Brasil, por vezes, fica em situação difícil e não consegue manter a família. A associação dá apoio aos ex-atletas e atletas em dificuldade. Desde pagar até 70% da faculdade para quem quiser estudar, ser professor ou advogado depois de deixar o futebol, até dar a cesta básica, medicamentos e plano funeral para a família", explicou Celso, orgulhoso de ajudar os ex-atletas a encontrar um caminho pós-futebol.

Tentou ser treinador em clubes como o Ferroviário e o Fortaleza, mas nunca quis ir para longe da padaria e os convites foram escasseando. Futebol agora só com os amigos ou em jogos beneficentes: "Ainda no mês de dezembro reuni ex-jogadores para um jogo e chamei o Jardel..."

E como está ele? "Pareceu bem. Não sei o que o Jardel anda fazendo, mas como teve o mandato caçado [suspenso] não pode concorrer a cargos públicos por oito anos. Foi uma coisa chata, ele é um menino bom, mas acabou atrapalhando um pouco a vida dele", respondeu o antigo central portista.

Grato a duas grandes figuras

Chegou ao Porto em 1985, depois de se informar sobre o clube portista com o amigo Dudu, que jogava no Belenenses. Apesar do talento, teve de esperar para se assumir como titularíssimo. Foi uma lesão de Eurico (partiu uma perna) que o lançou no centro da defesa portista. E só de lá saiu com dois títulos, uma Supertaça, uma Taça dos Campeões Europeus (Liga dos Campeões) e uma Taça Intercontinental (Mundial de Clubes).

Defesa-central sóbrio e discreto, Celso foi dragão de 1985 a 1988 (78 jogos e 10 golos) e ainda é recordado pela potência que colocava na marcação de livres diretos. Marcou vários de dragão ao peito, um deles ao Sporting (1985-86): "Tínhamos de ganhar em Alvalade para não dizer adeus ao título. Eu vinha de suspensão, por ter dado um soco ao Carlos Manuel. Aos 40 minutos, o Gomes sofreu uma falta e eu bati o livre. A bola entrou bem no ângulo superior esquerdo da baliza do Damas. Foi lindo."

Mas não tanto como o que marcou em Kiev, nas meias-finais da Taça dos Clubes Campeões Europeus. Já na final de Viena, foi a perspicácia de Celso Gavião que deu início à jogada do segundo golo do FC Porto. "Vi o Madjer fora de campo e olhei em volta para ver quem estava livre para receber a bola, mas de repente ele já estava em jogo. Fiz um passe longo, para a linha de fundo e fiquei a assistir ao resto da história, com o Madjer e o amigão Juary... ainda há duas semanas estive com ele em Santos", recordou o antigo central.

Memórias essas que os anos não apagaram. "As pessoas ainda hoje dizem: "olha o Celso, que foi campeão do Mundo e venceu a Champions pelo FC Porto." Por isso eu sou muito agradecido ao clube. As minhas conquistas foram valorizadas. O que o FC Porto me deu e o que nós fizemos pelo FC Porto é inesquecível!"

Assim como inesquecível é a gratidão que tem para com essas "duas grandes figuras", de nome Pinto da Costa e Artur Jorge: "O intocável e o mestre. Não existe pessoa que saiba lidar com os jogadores como o Pinto da Costa, ainda hoje é o meu presidente! E o Artur Jorge, que eu não esqueço nunca, foi um dos melhores treinadores com quem trabalhei."

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