Em outubro do ano passado, uma professora da Escola Básica e Secundária Amélia Rey Colaço, em Linda-a-Velha, foi transportada para o hospital depois de ter sido agredida à cabeçada por um aluno de 14 anos. O caso não era único. O ano que agora terminou, aliás, ficou marcado por vários outros casos de agressões: quer de alunos contra professores - como o docente pontapeado por um estudante de 12 anos e aquela que foi atacada à porta da sua escola no Porto - quer de professores contra alunos..O Ministério da Educação diz tratarem-se de "casos pontuais" e as estatísticas confirmam: o número de ocorrências registadas pela PSP diminuiu em quase mil (954) entre o ano letivo 2013/14 (período com os dados mais antigos disponibilizados pela PSP) e o ano 2018/19, passando de 3888 para 2934..Os diretores das escolas não têm dúvidas de que se trata de um reflexo direto das ações lançadas pela PSP, ao abrigo do programa Escola Segura, iniciado ainda antes do início do milénio. "As escolas estão mais atentas às situações de criminalidade e têm, no terreno, programas de prevenção, como é exemplo os aplicados pela Escola Segura [programa criado em 1992]", diz Filinto Lima, dirigente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP). Mas há tipologias de crime que estão a aumentar..Apesar de os números gerais provarem uma evolução positiva, o Sindicato de Todos os Professores (S.T.O.P.) mostra-se preocupado com o ambiente que se vive nas escolas. Em outubro, convocou inclusive duas semanas de greve contra a violência, motivado pelos mais recentes casos de agressões. Certo é que continua a existir mais de mil casos por ofensas corporais em cada ano letivo - ainda que o número esteja a diminuir desde 2013/14..Entre todos os tipos de crime, os roubos e os furtos foram aqueles que registaram um maior decréscimo, reduzindo para menos de metade. Se em 2013/14, as autoridades registaram 265 roubos e 1006 furtos, em 2018/19, estes números decresceram para 91 e 498, respetivamente..Geograficamente, foi em Lisboa e no Porto onde se concentraram mais ocorrências (70% do total), criminais e não criminais, no ano letivo 2018/2019..Há mais queixas por ameaças.Só uma tipologia aumentou desde o primeiro ano das estatísticas da PSP: injúrias e ameaças. Há sete anos, as autoridades registaram 557 casos. E, depois de ter descido de 665 para 603 entre 2015/16 e 2016/17, avizinhavam-se boas notícias, à semelhança do que acontecia com outros tipos de crimes, que registavam uma descida gradual. Mas, no ano letivo passado, eram já 686 casos..Para o dirigente da ANDAEP, a tendência ascendente destas ocorrências não é surpreendente, face ao que vê acontecer no ambiente escolar que conhece. E, para Filinto Lima, não há dúvidas de que a razão por detrás deste aumento se deve principalmente à "atenção dada a este tipo de criminalidade"..De acordo com a PSP, a concretização de uma queixa depende sempre da própria perceção da vítima. Em determinados casos, pode ocorrer ameaça, mas a vítima não sentir que está realmente em perigo. Caso seja feita a queixa, as autoridades registam a ocorrência e encaminham para a autoridade judiciária..Dependendo do contexto e da regularidade com que a queixa possa ter acontecido, a polícia pode propor ao tribunal uma determinada medida de coação, como a obrigação de afastamento e a proibição de contacto com a vítima. Em casos extremos, quando as autoridades acreditam que há um risco iminente, a vítima poderá passar a ser protegida diretamente pela PSP..Bullying continua por discriminar.Dos roubos às ofensas sexuais, são oito os tipos de crime discriminados nas estatísticas das autoridades. O bullying, por outro lado, onde Portugal tem registado dados alarmantes, continua fora desta lista. Em 2017, ocupou o 15.º lugar entre os países com mais relatos de bullying na Europa e na América do Norte, à frente de países como os EUA..No ano passado, em entrevista ao DN, Miguel Rodrigues, investigador do CeiED - Centro de Estudos Interdisciplinares em Educação e Desenvolvimento, da Universidade Lusófona (ULHT), mas também dirigente e diretor social do Sindicato Independente dos Agentes de Polícia (SIAP/PSP), já alertava para esta realidade. Ainda que seja uma das queixas mais decorrentes em ambiente escolar, as ocorrências por bullying continuam por discriminar.."Pela sua enorme prevalência deveria ser devidamente discriminado, no entanto, é inserido no bolo criminal Outros Crimes, não permitindo assim que a comunidade científica possa trabalhar a problemática do bullying em contexto nacional com vista à sua real compreensão, prevenção e repressão", explicava..Governo quer punir mais.Para todos os crimes, refere o estudo sobre a "Criminalidade em Ambiente Escolar" - referente aos anos letivos de 2000/01 e 2017/2018 -, a lei e o Estatuto do Aluno devem sofrer alterações significativas, de forma a punir os crimes em contexto escolar. No final do ano passado, face aos mais recentes casos de agressão física nas escolas, o governo admitia mesmo vir a tornar as agressões a professores um crime público.."Uma das medidas punitivas de um aluno que cometa um ato disciplinarmente punível, tendo por base determinados regulamentos disciplinares escolares, pode resultar com uma ida de determinado número de dias para casa, o que, em muitos casos, será mais visto como um 'presente' do que uma reprimenda ou castigo, desvirtuando assim a sua finalidade", defendia Miguel Rodrigues, em entrevista ao DN..O mesmo documento apontava o ambiente familiar e a exclusão social como dois dos fatores potenciadores da violência na escola.