António Costa já não estará cá para ver o grande porte que atingirá o sobreiro que ontem plantou na Vieira de Leiria, ao lado do pequeno Tomás, aluno do Agrupamento de Escolas da Vieira de Leiria. Mas o primeiro-ministro acredita que, simbolicamente, esse é o legado de segurança e reflorestação a deixar às gerações futuras.."Ao mesmo tempo que plantamos, temos que saber plantar melhor, ter a coragem de cortar o que tem de ser cortado, para termos um território mais seguro", disse Costa ontem ao final do dia, quando assistia à apresentação da estratégia de recuperação do Pinhal do Rei, na Marinha Grande, concelho que viu desaparecer 9 dos 11 hectares da mata nacional de Leiria, nos incêndios de 15 de outubro último..Horas antes, no talhão 9, junto à escola secundária da Vieira de Leiria, o primeiro-ministro plantou também ele um pequeno sobreiro, acompanhado do ministro da Agricultura, Capoulas Santos, dos secretários de Estado e uma vasta comitiva de responsáveis do Estado. E foi nessa viagem - que fez em autocarro, com apenas uma paragem para assistir ao corte de algumas árvores, aumentando as faixas de proteção - que o líder do Governo pode comprovar "a resistência ao fogo" por parte dessa espécie. Enquanto os pinheiros arderam a toda a velocidade naquele que a Proteção Civil considerou "o pior dia do ano de 2017", os sobreiros fizeram de escudo às chamas..O Governo não avança, pelo menos para já, com valores inerentes ao investimento que começa a ser feito na floresta nacional, mas há alguns valores que Costa tem para apresentar, quando recorda o apoio de emergência que o Estado já deu: 46 milhões de euros aos agricultores e 26 milhões aos empresários, na tentativa de minorar os imensos prejuízos causados pelo fogo; há ainda a reconstrução das primeiras habitações e as indemnizações "às perdas irreparáveis das vítimas mortais"..De resto, tanto o ministro Capoulas Santos como o primeiro-ministro deixaram na Marinha Grande a determinação de avançar com a reforma da Floresta nacional, a exemplo do que acontecerá no Pinhal de Leiria, forçosamente. "Queremos que o novo pinhal do Rei seja melhor do que aquele que tínhamos", sublinhou Costa, lembrando que a tragédia de Outubro - como a de Junho, no interior - "não foi obra do acaso, mas antes por causa das profundas transformações que o território sofreu nas últimas décadas, do desordenamento da floresta, e do impacto profundo das alterações climáticas". E por isso insiste na importância da reforma florestal, um trabalho que demorará pelo menos uma década. "Sabemos bem a resistência que vamos ter. Não é por acaso que o cadastro parou a sul do Tejo há mais de um século, mas temos de o fazer", concluiu, depois de assistir à assinatura do acordo de cooperação para a criação da Comissão Científica do Programa de Recuperação das Matas Nacionais..Na prática, o novo organismo reúne os responsáveis do Instituto de Conservação da Natureza e das Floresta (ICNF), do Instituto Superior de Agronomia e Veterinária, e de sete universidades e politécnicos de todo o país. Na mesma ocasião foi constituído o Observatório Local do Pinhal do Rei, que integra 23 personalidades e instituições da Marinha Grande, desde autarcas até à sociedade civil, que vão acompanhar de perto a recuperação..Madeira ardida rende milhões.À margem da assinatura dos acordos e da apresentação da estratégia nacional, o presidente do ICNF, Rogério Rodrigues, disse aos jornalistas que só em março próximo saberá a que corresponde o reforço de meios humanos e técnicos que o Governo lhe prometeu.."O que temos pela frente são alguns milhares de hectares que vão ter que ser arborizados, porque a regeneração natural não terá efeitos. E da que vingar, teremos processo mais longos. Por isso é preciso diversificar as espécies. Dar outras potencialidades à mata, como áreas de recreio e usufruto por parte da comunidade". Aquele responsável - a quem coube a apresentação do plano - estima este não seja um processo "para um ano, nem sequer para uma década. Nos primeiros 5 a 10 anos vai ter o maior impacto de investimento, mas vai durar sete décadas, o tempo que demora a sucessão dos povoamentos florestais"..Até lá é preciso que haja "uma gestão florestal que obriga a investimentos ativos, duradouros e persistentes. Todo o património não vai regenerar e gerir-se por si. É preciso muito investimento - florestal, mas também no reforço do ICN e dos seus meios". Nos próximos seis meses a comissão cientifica vai debruçar-se sobre esse plano, "e só nessa altura haverá um valor do investimento". Mas há pelo menos uma certeza: a quantidade de madeira que ficou do incêndio e que vai ser alienada, a partir de sete grandes matas - desde a mata nacional de Leiria até à mata do Urso, passando a Figueira da Foz, desde Quiaios até Vagos. No conjunto, têm para vender 1,7 milhões de metros cúbicos de madeira (a maioria de serração, e uma parte de trituração), dos quais 530 mil m3 estão no Pinhal de Leiria. Caberá agora ao Instituto Superior de Agronomia e à Universidade de Trás os Montes e Alto Douro apurar os valores efetivos, que irão ser alienados em praça pública a partir deste mês. Rogério Rodrigues não avança com números definitivos, mas arrisca um valor que daí pode advir: cerca de 35 milhões de euros.