Corte na contratação de médicos deixa dez mil sem consultas

Quem necessita de uma consulta está a ser aconselhado a ir ao Hospital Garcia de Orta ou procurar um médico particular
Publicado a
Atualizado a

Há 9800 pessoas sem garantia de apoio médico no Centro de Saúde de Corroios (Seixal) por "ordem superior" e que se necessitarem de uma consulta são aconselhadas a ir ao Hospital Garcia de Orta ou, por opção própria, acabam por procurar um médico particular. Situação confirmada ao DN pela Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo, que garantiu estar a ser reorganizada "a oferta de cuidados" nesta unidade de cuidados de saúde personalizados.

São os utentes daquela vila do concelho do Seixal (margem sul do Tejo) que não têm médico de família atribuído os atingidos por esta medida que é consequência da redução de contratação de horas em regime de outsourcing por parte do Agrupamento de Centros de Saúde Almada-Seixal (ACES) - em vigor desde o dia 1- e que já levou a Comissão Utentes do Concelho do Seixal a reunir-se com os responsáveis daquela entidade. "Soubemos a 31 de outubro que esta situação começa a 1 de novembro e pedimos uma reunião com o diretor executivo do ACES para o questionar sobre como pretendem resolver a situação", explicou ao DN José Lourenço, da comissão de utentes. Acrescentando que para esta segunda-feira está marcada uma reunião com o diretor do ACES, encontro em que vai estar representada a Câmara do Seixal, para analisar esta situação e o facto de o Orçamento do Estado para 2018 não contemplar verbas para o início da construção do Hospital do Seixal.

Para José Lourenço, a situação a que o DN assistiu - um utente deste centro de saúde tentou marcar uma consulta tendo obtido como resposta do funcionário que não seria possível para aquela manhã e, perante a insistência, acrescentou que nem lhe podia garantir quando teria um médico disponível - não é uma surpresa. "Também já assisti a uma senhora precisar de uma consulta e não haver ninguém disponível. Aconselharam-na a ir ao Hospital Garcia de Orta. Ela acabou por dizer que ia a um médico particular", contou.

Os funcionários da UCSP explicam a quem não tem médico de família e tenta marcar consulta que não pode fazê-lo e chamam a atenção para uma folha que está numa vitrina colocada no exterior do edifício, frisando que enquanto lá estiver aquele documento quase não vale a pena dirigir-se à secretaria. Nessa comunicação assinada pela coordenação da unidade de saúde pode ler-se que "por falta de médico de apoio para utentes sem médico de família, não se pode garantir consultas gerais". Pedem os responsáveis que as pessoas se dirijam à secretaria numa "situação aguda" e aconselham a que "se não houver capacidade de resposta e se o caso for urgente a dirigir-se ao Garcia Orta". Numa nota final explica-se o motivo desta decisão: "O horário dos médicos para apoio a utentes sem médico foi reduzido por ordem superior, alheio à nossa vontade."

Médicos para fins de semana

Questionada pelo DN, a Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo frisa que dos 30 mil utentes pertencentes à Unidade de Cuidados de Saúde Permanentes de Corroios são 9800 os atingidos por esta medida e confirma que na "área de saúde do adulto ou da doença aguda o atendimento de utentes sem médico de família é feito com recurso a médicos contratados em regime de outsourcing". Explica que o agrupamento a que pertence Corroios tem "120 horas semanas contratualizadas com médicos prestadores de serviços", mas que estas são "utilizadas para cobertura de dois atendimentos complementares concelhios de Almada e Seixal aos fins de semana e feriados e em duas UCSP, as que se consideram mais carenciadas de recursos. A UCSP de Corroios é uma delas".

Reconhece, todavia, que é necessário alterar a forma como o atendimento aos utentes está a ser efetuado. "Por não completar suficientemente as necessidades em saúde ao nível da Medicina Geral de Familiar, o ACES de Almada-Seixal está a reorganizar a oferta de cuidados, direcionando as horas dos médicos da UCSP de Corroios destinadas originalmente aos grupos vulneráveis, também para a doença aguda dos utentes sem médico de família atribuído", explicou na resposta por escrito enviada ao DN. O certo é que a experiência da Comissão de Utentes não mostra que esta situação seja real. "Disseram-nos que a principal situação foi direcionar as horas disponíveis para assegurar a urgência ao fim de semana, para que não haja falhas. Estão a consignar o maior número de horas disponíveis para ali e só depois para os centros de saúde", garante José Lourenço.

A Administração Regional de Saúde termina a resposta com uma garantia: "De forma a ultrapassar eficazmente as falhas assistenciais observadas, a Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo projeta a construção de um novo edifício que possa receber duas Unidades de Saúde Familiares e deste modo garantir cuidados de saúde primários à população de Corroios." Uma promessa que a comissão de utentes de espera ver cumprida porque, lembra José Lourenço "as instalações atuais são deficitárias e já foi assinada a construção de um novo".

Dúvidas sobre futuro hospital

A esta questão da falta de médicos em Corroios junta-se as dúvidas sobre o prometido hospital do Seixal. Depois de em fevereiro o governo se ter comprometido com a abertura do concurso público no primeiro semestre e de em junho o primeiro-ministro, António Costa, ter anunciado o desenvolvimento do processo de construção da unidade, a comissão de utentes diz ter verificado que na proposta de Orçamento do Estado para 2018 não está consignada nenhuma verba para a execução da obra, o que pode pôr em risco a sua inauguração até ao final de 2019 como estava previsto.

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt