"A ideia que há por detrás desse paradigma de cooperação sul-sul é a de estabelecer um novo tipo de parceria, para nos ajudarmos uns aos outros, diferente daquilo que tem sido feito pelo ocidente", mais empresarial, referiu Sérgio Chichava, investigador do Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE) de Moçambique..Deste ponto de vista, "se formos ver, tem sido uma deceção a presença do Brasil em Moçambique. Não está, por exemplo, a mudar a forma de ser e de estar dos políticos moçambicanos", referiu em entrevista à Lusa.."Criando parcerias ou produzindo dependência?" é a questão que serve de título à publicação, a lançar em setembro, e que reúne 13 artigos de autoria individual e conjunta, envolvendo 21 investigadores.."Na década de 2000, na presidência de Lula da Silva, o Brasil passou a ter presença forte em África e quisemos perceber que relações se estavam a estabelecer", referiu Sérgio Chichava..Durante os dois mandatos de Lula, Moçambique foi "o país que mais projetos de cooperação técnica recebeu em África e sobretudo nos principais setores em que atua: agricultura, saúde e educação"..Os artigos analisam iniciativas apoiadas pelo Estado brasileiro como o projeto agrícola ProSavana, a instalação de uma fábrica de medicamentos antirretrovirais para combate à Sida ou o projeto ProAlimentos, entre outros..A questão inicial passou por saber, olhando aos projetos, "se esta parceira sul-sul está a produzir uma cooperação desinteressada", tal como difundido nos discursos políticos..Sérgio Chichava concluiu que tal "não passa de retórica" e que a solidariedade se confunde com os negócios de empresas brasileiras.."Não é mau estar a fazer negócios, mas que não se pretenda fazer passar [essa cooperação] por algo diferente", acrescentou Chichava, lamentando ficar pelo caminho a criação de um novo paradigma na relação entre países..No caso, as relações são agravadas por indícios de suborno na adjudicação do Aeroporto de Nacala (norte do país) à brasileira Odebrecht ou por falta de transparência sobre as condições do empréstimo do Banco Nacional de Desenvolvimento Económico e Social do Brasil (BNEDES) para Moçambique construir a Barragem de Moamba Major, referiu.."Acho que não há nenhuma cooperação que seja desinteressada" e os estados que a recebem, como Moçambique, "devem aproveitar as oportunidades que se abrem hoje, de haver cada vez mais alternativas" de parcerias internacionais..No entanto, neste cenário, Sérgio Chichava defende que sejam os países recetores a mudarem, primeiro, a sua visão da política..A questão "reside na nossa maneira de fazer política, vista como um lugar de acumulação" de riqueza, referiu, apontando, por exemplo, os casos em que se impõem sócios nacionais com ligações ao poder para autorizar investimentos estrangeiros, para assim ficarem com parte dos lucros..O livro inclui uma análise ao papel das igrejas pentecostais do Brasil considerando que tentam fazer valer as suas crenças sobre as locais e que são encorajadas por se alinharem com o poder..O lançamento está previsto para setembro, em Maputo, com uma edição em inglês e outra em português, edição do Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE) de Moçambique..Sérgio Chichava, doutorado em Ciências Políticas, dedica-se ao estudo de economias emergentes e desenvolvimento com o foco para o Brasil e Moçambique.