Limpar as casas, sim, mas também os turistas. Foi assim que um casal de empregados de limpeza de apartamentos de alojamento local conseguiu juntar na conta bancária pelo menos dez mil euros e ter na sua habitação objetos no valor de 12 mil euros - entre eles, por exemplo, computadores, máquinas fotográficas e telemóveis..Detida no final do ano passado, esta dupla - ele com 42 anos e ela com 37 - terá sido responsável por sete crimes de furto qualificado e nove de burla agravada que fazem parte dos 185 registados pela PSP principalmente na Baixa de Lisboa, a zona da cidade com mais alojamentos locais e com maior pressão turística..Este dado sinaliza uma subida de quase 500% nas estatísticas de furtos neste tipo de residências. É claro que sendo o fenómeno mais ou menos recente, o crime também o é. Mas o que acontece é que o alojamento local é mais propício a assaltos. Os assaltantes aproveitam algum desleixo de férias, o facto de os visitantes deixarem as janelas e portas dos prédios abertas e da fragilidade de algumas das casas alugadas que que muitas vezes nem tem um sistema de segurança tão simples como um bom fecho na janela..A ação da PSP levou ainda à detenção de nove pessoas, estando sete a cumprir prisão preventiva, adiantou ao DN fonte oficial. Como em 2017 só tinham sido recebidas 32 queixas referentes a este tipo de criminalidade, este aumento exponencial - para 185 - levou os responsáveis desta força de segurança a aumentar a atenção para este fenómeno e a tentar encontrar explicações para o que estava a acontecer nos bairros históricos da capital. É assim que nasce o programa Blue Lock, específico para esta área, e da responsabilidade da 1.ª Divisão da PSP.."Em meados de 2018 verificámos um aumento da criminalidade sobre os alojamentos locais. Muitas destas unidades hoteleiras não garantiam a segurança necessária", explica ao DN o intendente Paulo Flor, responsável por esta divisão policial. "Tivemos reuniões com a associação de alojamento local, percebemos que esta era uma realidade na Baixa de Lisboa e chamámos à PSP em setembro ou outubro do ano passado alguns proprietários lembrando que Lisboa é uma cidade segura, mas não podemos colocar o ónus de ser ainda mais segura em quem nos visita"..A esses encontros seguiram-se visitas de elementos da polícia a algumas das áreas com mais alojamento local. Os polícias detetaram certas práticas que potenciavam este tipo de criminalidade: pessoas a sair dos prédios e a deixar a porta aberta, janelas com fechadura sem qualquer sistema de segurança exceto o trinco. Também algumas formas de entrega das chaves e de acesso descontrolados de empresa de limpeza aos alojamentos não eram as mais fiáveis.."Nessas visitas levamos os proprietários a identificar as regras básicas para assegurarem que o turista quando chega a Lisboa tem bons sistemas de segurança como um cofre embutido na parede para guardar os seus pertences, boas janelas e portas", frisou ao DN Paulo Flor. Quem tiver boas práticas no âmbito deste programa Blue Lock receberá um certificado em que a PSP atesta "que aquele alojamento cumpre os parâmetros identificados" e que depois o proprietário pode pôr visível no interior da casa..Este responsável garante que os donos deste tipo de oferta hoteleira estão a aceitar bem a iniciativa que também permite à PSP identificar as zonas da Baixa mais vulneráveis e conseguir ter "uma resposta mais célere" em caso de necessidade de atuar. E os resultados, frisa, são positivos: "Temos garantido algumas prisões preventivas e isso tem impacte nos furtos. Temos 15 furtos na Baixa neste início de ano, o que mostra uma estabilidade.".Guardava as chaves e roubava os hóspedes.Este ano, um dos muitos furtos a que se refere Paulo Flor terá sido da responsabilidade de um homem que está em prisão preventiva desde o final de janeiro quando foi detido sob a suspeita de ter realizado pelo menos onze assaltos no interior de residências..O caso foi divulgado pela PSP num comunicado onde explicava que o indivíduo, de 32 anos, guardava as chaves de apartamentos dedicados a alojamento local nas freguesias de Santa Maria Maior, Penha de França, Arroios, Misericórdia, Santo António e Estrela. Valendo-se desse facto terá entrado em algumas casas de onde, durante o ano passado, terá retirado 15 mil euros, além de, segundo a PSP, "ter provocado danos de milhares de euros". Na altura em que foi detido tinha um computador e um disco externo furtados..Esta detenção foi uma das nove que a PSP fez relacionada com este crime - além do casal já referido e deste caso houve mais quatro situações de pessoas presentes a um juiz, tendo à sétima sido decretada a medida de coação mais grave, a prisão preventiva - na maior parte delas devido a investigações que duraram vários meses.."Este crime aumentou tal como o turismo [Lisboa recebeu cerca de 6,2 milhões de turistas em 2018, segundo o INE] e é nas zonas históricas onde a maior parte das habitações estão transformadas em alojamento local que mais se sente. O facto de cada vez menos existirem zonas de residências permanentes, onde as pessoas estão mais tempo e não deixam objetos de valor, cria vulnerabilidades e uma nova oportunidade para a criminalidade", reconhece ao DN o intendente Resende da Silva, líder da Divisão de Investigação Criminal da PSP..Este responsável lembra que o facto de haver "muita rotatividade" nessas casas faz que também seja difícil controlar quem é residente ou não. "Falta também alguma precaução, por vezes deixam-se as janelas abertas. Os turistas estão em lazer e isso cria despreocupação", acrescenta lembrando que esta passagem por Lisboa em períodos curtos acaba também por fazer que as vítimas não apresentem queixa dos furtos..Quanto aos autores dos assaltos, Resende da Silva diz serem portugueses e com uma análise simples: "Os criminosos estrangeiros seriam mais facilmente detetados pelo policiamento de proximidade." Em relação aos casos lembra que já lidou com furtos ligados às limpezas. "Eram pessoas que nas redes sociais se disponibilizavam para fazer serviço de limpeza mais barato e os proprietários aproveitavam" e que depois aproveitavam o facto de estar dentro dos apartamentos para levarem os bens que os turistas ali deixavam quando saiam para passear..Já os bens que mais interessam são os computadores portáteis, os relógios, as câmaras fotográficas e os telemóveis que "no mercado negro valem muito dinheiro, são rentáveis para quem os furta", conclui.