A seleção de futebol feminino dos Estados Unidos entra neste domingo (16.00, em Lyon) em campo para tentar, frente à Holanda, conquistar o quarto título de campeã do mundo e assim consolidar o domínio na modalidade, que é também comprovado pelas quatro medalhas de ouro olímpicas em seis participações e pelas oito vezes, em dez edições, em que venceu a Gold Cup, competição que apura a melhor equipa da América do Norte, Central e Caraíbas (Concacaf)..As americanas chegaram à final em cinco das oito edições do Campeonato do Mundo, tendo ficado em terceiro lugar nos outros três torneios. Um registo impressionante que contrasta com o fraco palmarés do país no futebol masculino, que nunca conseguiu atingir altos patamares a nível mundial, não tendo igualmente grande popularidade no país..Uma realidade que se explica por razões culturais, conforme revelou ao DN Mariana Jaleca, futebolista portuguesa de 21 anos que joga no Saint Francis University, da Pensilvânia, na I Divisão Universitária dos Estados Unidos. "Os homens não são muito ligados ao soccer [como os americanos apelidam o futebol tradicional], preferem o basquetebol ou o futebol americano, mas considero que essa realidade está a mudar graças à MLS, a liga profissional, que nos últimos anos tem recebido algumas estrelas da Europa e com isso promovido a modalidade", explicou. Mariana Jaleca acrescenta que "a grande reputação do futebol feminino nos EUA se deve aos muitos títulos que tem conquistado, o que faz uma enorme diferença para a seleção masculina", uma vez que "os americanos são muito patriotas e estão muito ligados a quem tem sucesso". A equipa masculina ocupa nesta altura o 30.º lugar do ranking FIFA; a seleção feminina está cotada como a melhor do mundo, o que faz toda a diferença....O futebol começa aos 5 anos.A explicação para a grande superioridade das americanas a nível mundial no futebol feminino tem origem numa lei promulgada em 1972 nos Estados Unidos conhecida como Title IX. O texto tem pouco mais de 30 palavras, mas originou uma autêntica revolução no desporto universitário, que acabou por ter um enorme impacto no desenvolvimento do futebol feminino..Essa emenda teve como objetivo proibir qualquer tipo de discriminação de género nos programas educacionais, o que obrigou os liceus e as universidades a fornecer às mulheres estudantes as mesmas condições de treino e de competição que eram dadas aos homens, elaborando programas que terminaram com um longo período em que as raparigas não podiam praticar desporto em ambiente escolar..A antiga jornalista Karen Blumenthal explicou essa mudança de paradigma no desporto americano no livro Let Me Play: The Story of Title IX, the Law that Changed the Future of Girls in America, publicado em 2005, em que explica que a constituição de equipas femininas universitárias foi algo muito fácil, afinal não obrigava a grandes despesas e as raparigas até podiam utilizar o campo de futebol americano, um dos desportos mais populares - a par do basquetebol e do beisebol - maioritariamente praticado por homens..A Title IX permitiu que o desporto feminino se desenvolvesse de forma extraordinária. Prova disso são os números divulgados pela National Women's Law Center, associação de defesa dos direitos das mulheres, que estimava que houvesse 295 mil praticantes de futebol feminino nas escolas em 1972, registando em 2016 o impressionante número de... 3,2 milhões..É sabido que a base do desporto nos Estados Unidos está nas universidades, pois são elas que formam os atletas de alta competição, que depois seguem a via profissional. Foi assim com Alex Morgan, Megan Rapinoe e Carli Lloyd, as principais estrelas da seleção que vai jogar a final do Mundial 2019..As mães desempenham aqui também um papel importante. E nos Estados Unidos até lhes puseram um nome: soccer mom, cujo perfil são mulheres casadas, com filhos em idade escolar, que pertencem à classe média e, como não trabalham, dedicam-se a acompanhar os filhos nas práticas desportivas, com destaque para o futebol..Mariana Jaleca conta ao DN que nos EUA "as raparigas começam a praticar futebol desde muito pequenas, entre os 5 e os 12 anos já participam em competições, e as que adquirem o gosto continuam a jogar". É aqui que o desporto escolar assume grande preponderância, com competições a nível do liceu e da universidade. "A atenção que dão ao futebol faz toda a diferença para chegar à liga profissional. As melhores de cada universidade são escolhidas para treinar nas equipas profissionais durante um tempo. Se gostarem delas, são convidadas a integrar o draft [bolsa de escolhas como na NBA] para serem escolhidas pelas equipas profissionais", revela..A jogadora portuguesa acredita, no entanto, que o domínio dos Estados Unidos no futebol feminino possa ter os dias contados, porque "na Europa a formação de jogadoras está cada vez melhor". E até dá o exemplo de Portugal e Espanha. "As americanas têm um tipo de futebol mais físico, mas considero que as portuguesas e as espanholas são mais talentosas e isso, a breve prazo, pode fazer a diferença", acrescentou, assumindo que há uma certa diferença a nível do treino: "Nos Estados Unidos treinamos todos os dias, joga-se duas vezes por semana, mas é tudo conciliado com os estudos. Na Europa não é assim e em Portugal, por exemplo, tem de se optar entre jogar futebol ou continuar os estudos, o que tem muita importância quando se está a começar na modalidade e é o segredo para a evolução do futebol feminino.".A luta pela igualdade de género.O Mundial de França tem gerado um interesse nunca antes visto numa competição feminina, tendo estabelecido novos recordes de audiência televisiva. Uma exposição mediática que se tem revelado importante para a luta das jogadoras quanto à igualdade de género. Este é um tema recorrente, que fez mesmo que a norueguesa Ada Hegerberg, Bola de Ouro em 2018, se autoexcluísse do torneio em protesto com a federação da Noruega devido às diferenças de tratamento..A brasileira Marta, um dos ícones da modalidade, marcou presença, mas fê-lo sob protesto pela falta de reconhecimento das mulheres no futebol, nomeadamente no que diz respeito às remunerações, razão por que jogou com chuteiras sem patrocinador..Mas a seleção dos Estados Unidos tem sido a que maior impacto criou nesta causa, pois, a três meses do início do Mundial, 28 jogadoras habitualmente selecionadas processaram a federação por alegada discriminação salarial, mas também pelo que diz respeito à qualidade dos transportes e aos tratamentos médicos, utilizando como termo de comparação as condições dadas à seleção masculina..O processo que deu entrada num tribunal federal de Los Angeles tem como subscritoras as mais importantes futebolistas norte-americanas, como Carli Lloyd, Alex Morgan ou Megan Rapinoe, que pedem uma indemnização por danos causados que poderá chegar a milhões de dólares..As atletas reclamam por ser obrigadas a disputar mais jogos do que a seleção masculina e receber salários inferiores, apesar de ganharem muitos mais jogos do que os homens. A federação defende-se dizendo que tem maiores receitas nos jogos da equipa masculina e que isso justifica as discrepâncias..Mariana Jaleca considera que esta luta é justa, afinal, "trata-se de uma equipa que ganha mais vezes e é campeã do mundo, pelo que as diferenças não fazem sentido". Por isso, acha que "o futebol poderá ser importante nesta luta das mulheres" e acredita que o processo em tribunal "pode ser um grande passo" para a igualdade de género.
A seleção de futebol feminino dos Estados Unidos entra neste domingo (16.00, em Lyon) em campo para tentar, frente à Holanda, conquistar o quarto título de campeã do mundo e assim consolidar o domínio na modalidade, que é também comprovado pelas quatro medalhas de ouro olímpicas em seis participações e pelas oito vezes, em dez edições, em que venceu a Gold Cup, competição que apura a melhor equipa da América do Norte, Central e Caraíbas (Concacaf)..As americanas chegaram à final em cinco das oito edições do Campeonato do Mundo, tendo ficado em terceiro lugar nos outros três torneios. Um registo impressionante que contrasta com o fraco palmarés do país no futebol masculino, que nunca conseguiu atingir altos patamares a nível mundial, não tendo igualmente grande popularidade no país..Uma realidade que se explica por razões culturais, conforme revelou ao DN Mariana Jaleca, futebolista portuguesa de 21 anos que joga no Saint Francis University, da Pensilvânia, na I Divisão Universitária dos Estados Unidos. "Os homens não são muito ligados ao soccer [como os americanos apelidam o futebol tradicional], preferem o basquetebol ou o futebol americano, mas considero que essa realidade está a mudar graças à MLS, a liga profissional, que nos últimos anos tem recebido algumas estrelas da Europa e com isso promovido a modalidade", explicou. Mariana Jaleca acrescenta que "a grande reputação do futebol feminino nos EUA se deve aos muitos títulos que tem conquistado, o que faz uma enorme diferença para a seleção masculina", uma vez que "os americanos são muito patriotas e estão muito ligados a quem tem sucesso". A equipa masculina ocupa nesta altura o 30.º lugar do ranking FIFA; a seleção feminina está cotada como a melhor do mundo, o que faz toda a diferença....O futebol começa aos 5 anos.A explicação para a grande superioridade das americanas a nível mundial no futebol feminino tem origem numa lei promulgada em 1972 nos Estados Unidos conhecida como Title IX. O texto tem pouco mais de 30 palavras, mas originou uma autêntica revolução no desporto universitário, que acabou por ter um enorme impacto no desenvolvimento do futebol feminino..Essa emenda teve como objetivo proibir qualquer tipo de discriminação de género nos programas educacionais, o que obrigou os liceus e as universidades a fornecer às mulheres estudantes as mesmas condições de treino e de competição que eram dadas aos homens, elaborando programas que terminaram com um longo período em que as raparigas não podiam praticar desporto em ambiente escolar..A antiga jornalista Karen Blumenthal explicou essa mudança de paradigma no desporto americano no livro Let Me Play: The Story of Title IX, the Law that Changed the Future of Girls in America, publicado em 2005, em que explica que a constituição de equipas femininas universitárias foi algo muito fácil, afinal não obrigava a grandes despesas e as raparigas até podiam utilizar o campo de futebol americano, um dos desportos mais populares - a par do basquetebol e do beisebol - maioritariamente praticado por homens..A Title IX permitiu que o desporto feminino se desenvolvesse de forma extraordinária. Prova disso são os números divulgados pela National Women's Law Center, associação de defesa dos direitos das mulheres, que estimava que houvesse 295 mil praticantes de futebol feminino nas escolas em 1972, registando em 2016 o impressionante número de... 3,2 milhões..É sabido que a base do desporto nos Estados Unidos está nas universidades, pois são elas que formam os atletas de alta competição, que depois seguem a via profissional. Foi assim com Alex Morgan, Megan Rapinoe e Carli Lloyd, as principais estrelas da seleção que vai jogar a final do Mundial 2019..As mães desempenham aqui também um papel importante. E nos Estados Unidos até lhes puseram um nome: soccer mom, cujo perfil são mulheres casadas, com filhos em idade escolar, que pertencem à classe média e, como não trabalham, dedicam-se a acompanhar os filhos nas práticas desportivas, com destaque para o futebol..Mariana Jaleca conta ao DN que nos EUA "as raparigas começam a praticar futebol desde muito pequenas, entre os 5 e os 12 anos já participam em competições, e as que adquirem o gosto continuam a jogar". É aqui que o desporto escolar assume grande preponderância, com competições a nível do liceu e da universidade. "A atenção que dão ao futebol faz toda a diferença para chegar à liga profissional. As melhores de cada universidade são escolhidas para treinar nas equipas profissionais durante um tempo. Se gostarem delas, são convidadas a integrar o draft [bolsa de escolhas como na NBA] para serem escolhidas pelas equipas profissionais", revela..A jogadora portuguesa acredita, no entanto, que o domínio dos Estados Unidos no futebol feminino possa ter os dias contados, porque "na Europa a formação de jogadoras está cada vez melhor". E até dá o exemplo de Portugal e Espanha. "As americanas têm um tipo de futebol mais físico, mas considero que as portuguesas e as espanholas são mais talentosas e isso, a breve prazo, pode fazer a diferença", acrescentou, assumindo que há uma certa diferença a nível do treino: "Nos Estados Unidos treinamos todos os dias, joga-se duas vezes por semana, mas é tudo conciliado com os estudos. Na Europa não é assim e em Portugal, por exemplo, tem de se optar entre jogar futebol ou continuar os estudos, o que tem muita importância quando se está a começar na modalidade e é o segredo para a evolução do futebol feminino.".A luta pela igualdade de género.O Mundial de França tem gerado um interesse nunca antes visto numa competição feminina, tendo estabelecido novos recordes de audiência televisiva. Uma exposição mediática que se tem revelado importante para a luta das jogadoras quanto à igualdade de género. Este é um tema recorrente, que fez mesmo que a norueguesa Ada Hegerberg, Bola de Ouro em 2018, se autoexcluísse do torneio em protesto com a federação da Noruega devido às diferenças de tratamento..A brasileira Marta, um dos ícones da modalidade, marcou presença, mas fê-lo sob protesto pela falta de reconhecimento das mulheres no futebol, nomeadamente no que diz respeito às remunerações, razão por que jogou com chuteiras sem patrocinador..Mas a seleção dos Estados Unidos tem sido a que maior impacto criou nesta causa, pois, a três meses do início do Mundial, 28 jogadoras habitualmente selecionadas processaram a federação por alegada discriminação salarial, mas também pelo que diz respeito à qualidade dos transportes e aos tratamentos médicos, utilizando como termo de comparação as condições dadas à seleção masculina..O processo que deu entrada num tribunal federal de Los Angeles tem como subscritoras as mais importantes futebolistas norte-americanas, como Carli Lloyd, Alex Morgan ou Megan Rapinoe, que pedem uma indemnização por danos causados que poderá chegar a milhões de dólares..As atletas reclamam por ser obrigadas a disputar mais jogos do que a seleção masculina e receber salários inferiores, apesar de ganharem muitos mais jogos do que os homens. A federação defende-se dizendo que tem maiores receitas nos jogos da equipa masculina e que isso justifica as discrepâncias..Mariana Jaleca considera que esta luta é justa, afinal, "trata-se de uma equipa que ganha mais vezes e é campeã do mundo, pelo que as diferenças não fazem sentido". Por isso, acha que "o futebol poderá ser importante nesta luta das mulheres" e acredita que o processo em tribunal "pode ser um grande passo" para a igualdade de género.