Não é preciso grande ciência para se chegar à conclusão de que as eleições no Partido Social-Democrata alemão (SPD), o mais antigo do país, podem determinar o futuro da grande coligação e de quem a lidera, Angela Merkel. Como já anunciou que não volta a candidatar-se, a mulher que governa o país desde 2005 e que presidiu à União Democrata-Cristã (CDU) entre 2000 e 2018 está dependente dos resultados que vão ser anunciados na tarde de sábado. Se a ala esquerda do SPD vencer, Merkel terá de optar entre reescrever o programa de governo, governar em minoria, um cenário que nunca foi do seu agrado, ou sair de cena e abrir caminho para eleições antecipadas..Os conservadores estão relutantes em reabrir o acordo, mas querem permanecer no poder até às eleições de 2021 - em especial Angela Merkel, que quer sair pela porta grande. Daí que na quarta-feira tenha lançado um apelo aos parceiros no Bundestag: "Ainda há muito por fazer. Eu acho que devemos continuar a trabalhar até ao fim do mandato. Eu alinho", disse..Moderados versus esquerdistas.Numa crise com vários anos e que se acentua em cada ciclo eleitoral, o SPD culmina neste sábado uma campanha para a liderança com seis meses. Os 426 mil militantes tiveram a oportunidade de votar durante dez dias, até esta sexta-feira. A escolha é entre duas colideranças que passaram a primeira ronda de seis pares de candidatos: uma com o ministro das Finanças, Olaf Scholz, outra por um crítico da coligação conhecido como Robin Hood..Se o candidato mais conhecido é Olaf Scholz - afinal de contas desempenha as funções de ministro das Finanças - não se pode falar em favoritos. Na primeira ronda, Scholz e Klara Geywitz receberam 22,6% dos votos, seguidos de muito perto por Norbert Walter-Borjans e Saskia Esken, com 21%..Como os estatutos do partido determinam que a escolha da liderança é realizada em congresso, a formalização dos vencedores será feita entre os dias 6 e 8 de dezembro, altura em que o futuro da coligação de governo também será alvo de votação pelos delegados do partido..Como a CDU, o partido perdeu terreno para os Verdes e a Alternativa para a Alemanha (AfD, extrema-direita), mas foi duramente castigado no rescaldo das eleições legislativas de 2017, quando o então líder Martin Schulz anunciou o fim da coligação e semanas mais tarde voltou atrás para evitar novas eleições. Schulz abandonou a liderança e foi substituído por Andrea Nahles, que nas eleições europeias obteve o pior resultado de sempre do partido, 15,8%. Poucos dias depois Nahles também não resistiu à pressão e demitiu-se de todos os cargos, tendo saído do Parlamento no fim de outubro..Robin Hood da Renânia.O SPD encontra-se profundamente dividido. Muitos militantes querem concretizar o que Schulz anunciara: deixar o governo e fazer oposição. Esse cenário é bastante plausível em caso de vitória do economista Walter-Borjans e da deputada Esken. O ex-ministro das Finanças do estado da Renânia do Norte-Vestefália, apelidado de Robin Hood, tem no programa perseguir os evasores fiscais com contas bancárias suíças. A dupla da ala esquerda quer renegociar o acordo de coligação para se deixar o rigor fiscal para trás e dar prioridade ao investimento e à justiça social, nem que para tal se registe um défice orçamental..Saskia Esken, pouco conhecida do grande público, é ainda mais crítica da coligação e defende de forma clara que, se os conservadores não quiserem renegociar o acordo e alterar o programa de governo, a solução é deixar o executivo..Do outro lado da barricada está Olaf Scholz, de 61 anos, um moderado que manteve o rigor fiscal do seu antecessor, o conservador Wolfgang Schäuble, e que não quer ouvir falar em terminar a coligação com Merkel. Apesar de concorrer com a praticamente desconhecida Klara Geywitz (deputada no parlamento regional de Brandeburgo durante 15 anos), Scholz tem o apoio do aparelho do partido bem como da maioria dos deputados..Já a dupla mais à esquerda recebeu o apoio da juventude partidária, Jusos, que tem cerca de 70 mil militantes e forte implantação no estado de Walter-Borjans, Renânia do Norte-Vestefália.