Commonwealth diz sim ao príncipe Carlos no adeus a Isabel II
Um dia antes de fazer 92 anos, a rainha Isabel II viu ontem os líderes dos 53 países da Commonwealth darem luz verde para que o príncipe Carlos seja o seu sucessor à frente dos destinos desta comunidade. "Reconhecemos o papel da rainha na defesa da Commonwealth e dos seus povos", indicaram os líderes na declaração final da reunião, que deverá ser a última à qual a monarca assiste - o próximo encontro, em 2020, é no Ruanda e Isabel II já não faz grandes viagens. "O próximo líder da Commonwealth será o príncipe Carlos", acrescentaram, acedendo ao pedido da rainha.
"É o meu desejo sincero que a Commonwealth continue a oferecer estabilidade e continuidade às futuras gerações e decida, um dia, que o príncipe de Gales deve continuar o importante trabalho iniciado pelo meu pai em 1949", tinha dito Isabel II na quinta-feira. Ao ser ela a abordar o tema tabu - falar de quem lhe deverá suceder na liderança após a sua morte - e expressar diretamente os seus desejos, a rainha acabou por travar qualquer discussão sobre o tema.
O cargo de líder desta comunidade de 53 países que evoluiu a partir do antigo império britânico é principalmente simbólico, sendo ocupado por Isabel II - que é chefe de Estado de 16 deles - desde 1952. Mas o cargo não é hereditário e havia quem sugerisse que a liderança pudesse ser ocupada de forma rotativa por todos os países, em vez de passar para o príncipe Carlos, como era esperado.
Na conferência de imprensa posterior ao encontro, a primeira-ministra britânica, Theresa May, louvou "a visão e o dever" de Isabel II, que permitiram que a Commonwealth crescesse de oito para 53 membros ao longo do seu reinado. A comunidade poderá chegar aos 54, caso o Zimbabwe decida voltar a entrar. O país abandonou a Commonwealth em 2003 depois de ter sido suspenso devido a violência e fraude nas presidenciais desse ano. Robert Mugabe, no poder desde 1980, foi derrubado no final de 2017 e Londres apoia o seu regresso à comunidade.
May disse ainda que era "apropriado" que o príncipe Carlos, hoje com 69 anos, seja o sucessor de Isabel II à frente da Commonwealth, que apoia "há mais de quatro décadas". Algo que o próprio lembrou numa receção. "Da minha parte, a Commonwealth tem sido uma característica fundamental da minha vida desde que me lembro, começando com a minha primeira visita a Malta quando tinha apenas 5 anos", contou. "Rezo para que esta reunião de chefes de governo da Commonwealth não apenas revitalize os laços entre os nossos países, mas também dê uma renovada relevância a todos os cidadãos, encontrando soluções práticas para os seus problemas e dando espaço às suas aspirações", acrescentou.
A decisão sobre a futura liderança tinha de ser tomada por unanimidade já que todos os países - quer sejam os 31 que têm menos de 1,5 milhões de habitantes ou a gigante Índia que tem 1,3 mil milhões - têm a mesma força na comunidade. No total, a Commonwealth conta com 2,4 mil milhões de habitantes (60% têm menos de 30 anos) espalhados por seis continentes, numa área que cobre quase um quarto da massa terrestre. Tem um PIB combinado de 10,4 biliões de dólares.
A um ano do brexit, a parte económica interessa particularmente aos britânicos. O Reino Unido esperava usar o facto de acolher a cimeira de líderes - pela primeira vez em 20 anos - para revitalizar a comunidade, tendo em vista um aumento das trocas comerciais e o reforço da sua influência global a pensar já na saída da União Europeia. Londres espera negociar acordos de livre comércio com o Canadá, a Nova Zelândia, a Austrália e a Índia no pós--brexit. Mas Narendra Modi, o primeiro chefe do governo indiano a assistir às cimeiras desde 2010, lembra que não pode haver fim das tarifas sem concessões ao nível dos vistos por parte do Reino Unido.
Além destes temas, as discussões abordaram também as alterações climáticas ou o combate ao cibercrime. Mas a reunião ficou marcada pela polémica do tratamento do Reino Unido à geração Windrush. Após a II Guerra Mundial, Londres encorajou a imigração de países da Commonwealth e muitos chegaram das Caraíbas e de África. As crianças viajaram com os documentos dos pais e nunca se inscreveram legalmente. Agora, já adultas, estão a ser ameaçadas de deportação ou estão sem acesso a cuidados de saúde. May prometeu resolver a situação. O presidente sul-africano, Cyril Ramaphosa, foi entretanto obrigado a voltar mais cedo a casa para tentar acalmar os protestos violentos no norte do país contra os serviços públicos e o governo local.