"Estamos todos unidos, e desta vez vamo-nos concentrar numa única manifestação." Bruno Campos, 32 anos, coordenador comercial no Barreiro, e mentor do grupo Movimento Coletes Amarelos de Portugal, dá início à conversa que um grupo de oito elementos realizou com o DN, via Messenger. São de várias zonas do país e mantiveram sempre contacto desde o falhanço da manifestação de 21 de dezembro de 2018. Também ali estão Diogo Pereira, do Bombarral (pioneiro do movimento em Portugal), Micael Santana Viegas, do Algarve, Luísa Patrão, agente de execução judicial, Luís Pereira, Tiago Soares, de Lisboa, Ana Vieira e Miguel Freitas, todos de Lisboa. Têm flyers preparados para distribuir, apelando à concentração "do povo"..Os panfletos dizem coisas como "de luto por Portugal - eu luto contra a corrupção neste país". E esse parece ser o mote para este novo protesto, embora, aos poucos, o grupo vá avançando com outras "reivindicações específicas". Desde logo não é impune a escolha da data: "o 25 de abril é justamente quando a geringonça vai celebrar os seus não êxitos e é num tom de luto que o Movimento Coletes Amarelos Portugal vai sair à rua, e não em celebração. Porque não temos absolutamente nada a celebrar", diz ao DN Bruno Campos, logo secundado por Luísa Patrão, para quem, amanhã, "não temos mesmo nada para festejar".."Temos um Ministério Público completamente politizado, megaprocessos em que se perdem documentos, e as pessoas continuam impunes", acrescenta a agente de execução judicial. Bruno - o mais interventivo deste grupo - vai um pouco mais longe na justificação: "É o dia da Liberdade, mas liberdade impõe que haja escolha e nós não temos nada disso, não participamos em nenhuma das decisões do governo." Deste? Deste e de outros. Diz ele que "ninguém nos perguntou se queríamos entrar para o euro, se queríamos andar a fazer as guerras no Iraque e em África, se queríamos aceitar o pacto de migração". E por isso defende para cada passo "um referendo, perguntar ao povo o que pensa"..Confrontado com a inevitabilidade de estarem em causa medidas sufragadas em programas eleitorais, o grupo vai respondendo à questão: costumam votar? Bruno diz que sim, Diogo só votou uma vez, Tiago também. De resto, puxa dos galões para lembrar que já fez parte da Juventude Comunista, mas isso foi "até perceber a corrupção nos partidos". O resto do grupo não vota porque "não acredita no sistema". Diogo Pereira, o rapaz do Bombarral, funcionário de uma indústria de mármores, atira com mais uma reivindicação antiga: "Queremos uma democracia participativa. O sistema não funciona em Portugal. Está controlado e vivemos numa ditadura disfarçada.".Da corrupção à subida do ordenado mínimo.O grupo acredita que desta vez a manifestação vai ser um êxito, com muita gente, porque afinal, no seu conjunto, os grupos que gerem no Facebook têm cerca de cem mil aderentes. A opção por Lisboa prende-se com a facilidade de concentração, mas também com a certeza de que é um dia em que os políticos saem à rua. "Queremos que dia 25 de abril seja uma manifestação forte", conclui Diogo Pereira..Do manifesto de reivindicações específicas fazem parte temas diversos, desde "a luta contra a corrupção, com inibição dos que a praticam voltarem a exercer qualquer cargo público", até à "subida do ordenado mínimo nacional para 700 euros, de imediato, tanto no público como no privado, porque é risível que haja portugueses de primeira e de segunda". Há ainda outro tema que lhes é caro - a redução dos impostos sobre os combustíveis. A conversa decorre no dia em que os motoristas de matérias perigosas ainda estão em greve. "Como é óbvio estamos totalmente solidários com os camionistas. Muitas pessoas dizem que eles não lutam pelos interesses deles e não é bem assim. Nós temos coletes amarelos na rua com eles", esclarece Bruno Campos. De resto, ainda falta outro tema sensível no manifesto do protesto: "A luta pela sustentabilidade da Segurança Social, para acabarmos com as duplas reformas, para podermos alavancar as reformas mínimas para os 400 euros e máximas para os dois mil euros.".Mas é de justiça que Luísa Patrão insiste em falar. Trabalha há 26 anos no ministério, integra agora o grupo Portugal É Nosso e pede "mais justiça, mais igualdade, mais tudo aquilo a que temos direito. Há grandes discrepâncias nas reformas e nos vencimentos. É contra isto que eu luto. Não posso admitir que haja uma pensão do Jardim Gonçalves de 167 mil euros, e depois temos o José e a Maria Joaquina com 167 euros de reforma. E isto é tudo fruto da corrupção, que custa aos portugueses anualmente 18 mil milhões de euros", sublinha. Entretanto, é ela quem está a escrever os estatutos de uma associação anticorrupção, prestes a nascer..O povo e os partidos infiltrados."Mais do que tudo, eles [no governo] têm de temer o povo. Comportam-se assim, sabem que o povo é sereno e não tem feito nada, mas as coisas estão a mudar um pouco, com grupos como os nossos", afirma ao DN Bruno Campos, que não se cansa de criticar "um Estado completamente inchado, em que pedem cada vez mais sacrifícios ao povo e têm assessores, mordomias, andam em carros blindados"..Chega então a parte da conversa em que são confrontados com a existência de partidos e movimentos de extrema-direita no movimento. Alguns desmentem, outros desvalorizam. Luís Pereira, por exemplo, opta pela segunda parte. "Isso de esquerdas e direitas só serve para desunir as pessoas, faz que as pessoas se dividam tanto que não têm opinião própria." Já Bruno começa por dizer que não é verdade. "Mas deixe que lhe diga a seguinte mensagem - o movimento é apartidário, mas as pessoas têm a liberdade de carregar o cartão da militância do partido que desejarem. Respeitamos as opções partidárias de qualquer pessoa. Não vamos rejeitar ninguém porque é de esquerda ou de direita. Vamos tentar juntar as esquerdas com as direitas. Nos coletes amarelos temos de tudo, desde anarquistas a comunistas, a nacionalistas. E o PNR também faz parte do povo, como o PCP. Todos são bem-vindos desde que não tentem impor a sua ideologia a ninguém."."Pôr essa ideia a correr é uma arma governamental para tentar afastar as pessoas destas manifestações", acredita Diogo Pereira. E Luísa é perentória: "Desde que lutem com o mesmo objetivo, qual é o mal?".A organização da manifestação comunicou entretanto à Câmara Municipal de Lisboa a intenção do protesto, marcado para as dez horas de amanhã. Numa resposta enviada na terça-feira, por e-mail, do Gabinete de Apoio ao Presidente, foi comunicado ao grupo que, ao abrigo da lei, a informação chegara já ao ministro da Administração Interna e ao comando da PSP..Contactada pelo DN, através do Gabinete de Imprensa e Relações Públicas, a direção nacional da PSP diz que "planeia e executa as medidas de segurança consideradas adequadas, procurando sempre garantir o exercício do direito constitucional de manifestação/reunião em contraponto com a garantia do direito à segurança e liberdade de circulação dos restantes cidadãos". De resto, acrescenta ainda que "garantirá o exercício de ambos os direitos no dia 25 de abril". Aquele em que se comemora a Revolução que, entre outros, garantiu o direito à manifestação.