"Chegou o momento de a revolução democrática trazer bem-estar económico e social à Tunísia"
Qual a importância de Portugal e da sua presidência do Conselho da União Europeia neste momento para a Tunísia? É um momento em que a Tunísia precisa muito da UE e portanto Portugal tem um papel importante aqui a desempenhar?
Em primeiro lugar, queria exprimir a minha satisfação por estar aqui em Portugal, um país de que gostamos particularmente na Tunísia por variadíssimas razões. Em primeiro lugar, partilhamos com Portugal uma parte da História, partilhamos valores e ainda partilhamos um espaço euro-mediterrânico que nos é muito querido na Tunísia. Esta visita tem uma importância capital no sentido em que a Tunísia tenta reforçar as suas parcerias com a UE e, claro, com Portugal. Num quadro bilateral e também no âmbito da presidência do Conselho da UE. Consideramos que a excelente qualidade das relações que unem a Tunísia e Portugal pode jogar a favor das nossas relações com a UE, no nosso contacto com a UE, sobretudo num momento em que a Tunísia atravessa importantes dificuldades económicas, ligadas em primeiro lugar à crise sanitária que atinge o mundo devido à covid-19, mas também por causa de problemas que se tornaram estruturais na nossa economia nacional. A Tunísia, nesta fase, precisa do apoio dos seus amigos, do apoio da UE. Um apoio que sempre esteve presente para a Tunísia na última década em que a Tunísia iniciou um trabalho de democratização, de instauração de instituições democráticas, na sequência da revolução que ocorreu em 2011. E que trouxe à Tunísia uma nova liberdade. Trouxe os direitos humanos, trouxe instituições democráticas às quais nos ligamos. E chegou o momento de esta revolução trazer bem-estar económico e social.
As dificuldades económica foram uma constante nos últimos anos, sobretudo devido à ameaça terrorista num primeiro momento, e agora da covid-19. Mas pode-se dizer que os problemas económicos já não ameaçam a questão da democracia na Tunísia? É um assunto fechado? Há apenas problemas económicos?
Esperamos que a questão democrática esteja definitivamente encerrada na Tunísia. Mesmo se ainda há por vezes discurso que podem gerar preocupações em relação ao processo democrático. Mas o empenho do povo tunisino com a democracia é tal que nenhuma tendência ou discurso o pode abalar. Há um caminho em direção à democratização do país e à instauração de instituições democráticas perenes, tal como o Tribunal Constitucional, como o mecanismo parlamentar que rege a vida política na Tunísia. Penso que a via que estamos a traçar em direção à democratização não tem marcha atrás. Segue diretamente para um Estado de direito e um Estado de liberdade. Isto para a Tunísia é definitivo. No que se refere às dificuldades económicas, penso que resultam de décadas e décadas de experiências e de modelos económicos malsucedidos. Apesar de ter havido alguns sucessos, como um plano de ajuste estrutural no final dos anos 90. Houve também acordos comerciais com a UE. Mas devo dizer que na última década o custo económico para o país foi tal que, com a chegada da covid, a situação sofreu um rude golpe, que estamos a tentar resolver e contrariar por todos os meios. Penso que temos todo o potencial para isso. A Tunísia tem um potencial enorme em relação à qualidade dos seus recursos humanos, ao ambiente de investimento. A Tunísia continua a atrair investidores do mundo inteiro. Também investidores portugueses, de que nos orgulhamos e cuja instalação e trabalho tentaremos facilitar nas melhores condições. Mas penso que temos hoje necessidade de um forte apoio por parte dos nossos parceiros internacionais e do nosso principal parceiro que é a UE.
Para si, esse apoio deve ser um prémio para a Tunísia, para a sua consistência democrática e por ter sido o único exemplo de sucesso da Primavera Árabe?
Claro. Penso que todos os nossos parceiros estão muito ligados à experiência tunisina. É como diz, e orgulhamo-nos disso, de sermos a única experiência de democratização bem-sucedida desde a revolução no mundo árabe. E pensamos que isso continua a interessar os nossos parceiros internacionais. Acreditamos que os nossos amigos continuarão a apoiar a Tunísia do ponto de vista económico para que ela continue a ser este modelo de sucesso institucional e democrático. Para que a nossa democracia possa continuar a existir, para que possa levar o bem-estar a todos os cidadãos, é preciso que a situação económica acompanhe esta evolução. É preciso que as pessoas vejam os frutos da democracia no plano económico. Para que não haja uma escolha entre viver numa ditadura e ter o que comer e como viver de forma digna ou viver em democracia mas em condições económicas complicadas. A democracia é perfeitamente conjugável com uma situação económica próspera. É nisto que trabalhamos na Tunísia. Sempre em parceria com os amigos e parceiros na UE e no mundo.
A ameaça terrorista está totalmente controlada?
Temos dado golpes certeiros e duros nos grupúsculos terroristas que se multiplicaram num determinado momento e que realizaram alguns atos terroristas na Tunísia. Mas continuamos vigilantes, temos de o fazer, porque o terrorismo é cego. E ataca quando menos se espera. Foi o que aconteceu na Tunísia em vários momentos. Penso que as nossas forças de segurança estão capazes de combater e responder a qualquer tentativa de ataque terrorista. Mas há todo um trabalho da sociedade civil, ao nível da educação, para contrariar este fenómeno. E os tunisinos sempre mostraram que o terrorismo não tem lugar na Tunísia. O terrorismo não se encaixa na mentalidade, nem na forma de viver dos tunisinos. Nós partilhamos com Portugal um estilo de vida e uma forma de viver que passa pela abertura ao outro, pela tolerância. Logo penso que, tal como Portugal, a Tunísia recusa categoricamente qualquer forma de exclusão ou de ódio. Sobretudo se for um ódio baseado na exclusão racial ou religiosa. Precisamente, os terroristas tentam incendiar estas divergências e conflitos entre pessoas. Na Tunísia temos várias vitórias em termos de luta contra o terrorismo. E continuamos vigilantes.
Para a segurança da Tunísia também é importante o âmbito regional. São, nessa matéria, especialmente positivos os acordos de paz na vizinha Líbia?
Sem dúvida. Na verdade, acompanhamos com interesse a estabilização da Líbia e desejamos toda a estabilidade e prosperidade para os nossos vizinhos e irmãos líbios. Porque a estabilidade da Líbia contribui para a estabilidade de toda a região. Foi o que vimos nos últimos anos, em que houve todos estes problemas na Líbia. A situação nas fronteiras com a Líbia tornou-se complicada, mas hoje os líbios continuam no caminho da paz e da prosperidade. E claro que estaremos sempre ao lado dos nossos amigos e irmãos líbios para que garantam um melhor futuro para o seu país.
É também ministro do Interior interino neste momento. A migração é um problema para a Tunísia porque afeta a juventude tunisina ou sobretudo porque são um país que é atravessado por migrantes vindos da África subsariana e que tentam chegar assim à Europa?
A Tunísia é afetada pelo problema da imigração porque é um país de trânsito. Os países de origem são muitas vezes países da África subsariana e estas pessoas passam pela Tunísia para chegar à Europa. Estamos a trabalhar com todos os nossos parceiros para lutar contra o fenómeno da migração clandestina. Porque consideramos que é um problema que toca o lado humano das pessoas. Não queremos ver seres humanos maltratados no nosso território ou em território europeu. Por isso cooperamos ativamente com os nossos amigos da UE para contrariar o fenómeno da migração clandestina. E para garantir a dignidade aos migrantes clandestinos que são muitas vezes vítimas de redes internacionais. Mas penso - e é também uma visão que partilhamos com Portugal - que a nossa abordagem em relação à migração deve ser global e solidária. Uma abordagem que vai no sentido de procurar oportunidades na migração. Quando é controlada, quando é escolhida e concertada entre países emissores e países receptores, há um enorme potencial e enormes oportunidades sobre as quais podemos trabalhar. Sei que há necessidade de mão-de-obra qualificada que os países emissores de migração podem disponibilizar para os países recetores. Tudo isto se enquadra num desenvolvimento solidário entre a margem Sul e a margem Norte do Mediterrâneo. Temos de tentar criar uma oportunidade tanto para os países europeus, como para os países africanos de onde é oriunda a maior parte dos migrantes. A ideia é procurar todo o potencial da migração, desde que seja bem gerida entre emissores e recetores.
Para os portugueses que querem ir de férias à Tunísia, será possível este verão apesar da covid-19 ou terão de esperar pelo próximo ano?
Os portugueses são sempre bem-vindos na Tunísia. Eu vejo com interesse e admiração que o número de portugueses que escolhem a Tunísia para fazer férias aumente de ano para ano. Este ano vou tentar ser tranquilizador para os que decidirem vir: há um conjunto de medidas sanitárias que foram estabelecidas para garantir uma estadia segura aos turistas que escolheram a Tunísia. A situação no que se refere à covid-19 é semelhante ao resto do mundo: estamos a tentar travar as várias vagas. Estabelecemos uma política de vacinação muito ativa, que estamos a tentar acelerar. Estamos a tentar individualizar setores prioritários que vão receber a vacinas. E entre estes está o setor do turismo. Até para tranquilizar os turistas que vêm de que os locais que vão visitar e o pessoal que os vai receber estará vacinado.
Está, portanto, otimista já em relação ao verão de 2021?
Estou totalmente otimista em relação ao próximo verão. E deixo o meu convite aos portugueses para que venham à Tunísia e aproveitem a beleza do nosso país e a qualidade de vida que oferecemos.