Serra da Estrela. Começa hoje, em Penalva do Castelo, um ciclo de feiras dedicadas ao queijo da serra. Um sector de que dependem directa e indirectamente dez mil pessoas e cuja produção artesanal, pelos pastores queijeiros que lhe deram a alma, está - denunciam - ameaçado pela certificação.Certificar custa 1500 euros mais 0,40 por queijo.Em 2008 foram certificados apenas 125 mil queijos serra da Estrela, numa região que habitualmente produz 350 toneladas deste produto. Tudo porque os pastores não querem certificar o queijo serra da Estrela com a Denominação de Origem Protegida (DOP). Hoje começa mais um ciclo de feiras do queijo na Estrela e mais uma vez, à semelhança de anos anteriores, é apenas uma pequena minoria que apresenta queijo certificado para venda. Custos elevados na certificação e sobrecarga de taxas e impostos levam os pastores a abandonar a actividade. É todo um modo de vida que está em causa, desabafa-se nas montanhas da Estrela. .Um queijo manteiga leva em média 45 dias a ficar pronto a degustar, desde a ordenha até à prateleira do supermercado. Se for curado precisa de quase quatro meses. Antes disso é preciso criar os borregos - o que faz com que sejam quase seis meses de produção de queijo cujos ganhos na maior parte das vezes não compensam os custos. .São várias as vozes que o denunciam. Aos 50 anos Armando Sequeira já leva 15 de pastoreio. Esteve emigrado em França e investiu tudo o que ganhou, "500 mil euros em 50 hectares de terra e 150 ovelhas" no negócio do queijo. O dia-a-dia é duro: "ordenha, levá-las ao pasto, cuidar delas, veterinário e à noite recomeçar", conta. Este ano a produção não tem sido boa. O pastor revela que com o frio, os animais retardaram a produção. "Não consigo vender os borregos e o leite produzido é apenas 30 litros por dia", desabafa o pastor que, apesar de ter um historial de prémios, não participa em qualquer feira este ano. E no próximo ano espera igual destino. "Com as ovelhas a parir em Janeiro as cobrições vão-se reflectir no próximo ano", esclarece. .O pastor produz "um queijo reconhecido de consumidor a consumidor e foi assim que consegui exportar para o Luxemburgo onde tenho até uma rede de supermercados interessada", confidencia..A actividade tem sido compensadora mas o problema - relata são os "encargos sociais" que absorvem parte do rendimento. Destaca que é uma actividade imprevisível: "Dependo do rebanho, compro leite a outros produtores mas isto tem limites. Estamos a produzir uma coisa que se come e tem limites", avisa. .Entre os problemas está o facto de ser um empresário em nome individual numa "actividade familiar em que o pagamento especial por conta e a segurança social elevadíssima" a tornam "difícil de sustentar". A mulher do pastor "trabalha na feitura do queijo mas não tem acesso à segurança social". Daí que Armando Sequeira seja breve no aviso: "Se os políticos quiserem guardar esta gente na agricultura, na natureza, têm que rever este sistema. Uma pequena produção como a minha só tem o rendimento de um rebanho e se não quiserem saber a verdade só podemos fugir senão acabamos na pobreza.".Em Germil, já no concelho de Penalva do Castelo, nota-se que Carlos Lopes é queijeiro. A toda a volta da casa abunda o cardo, a planta que com o sal e o leite faz o queijo da Estrela. Carlos Lopes acreditou na certificação e foi "dos primeiros queijeiros a aderir porque era uma garantia para o consumidor e uma mais-valia para o produtor". Hoje o panorama é outro: "Há alguém a ganhar dinheiro menos os produtores e por essa razão estou há dois anos sem certificar mas mantenho todas as regras exigidas.".O produtor de queijo da serra, com 300 ovelhas, conta que "um pedido de adesão à certificação custa 1500 euros mais 40 cêntimos por cada queijo certificado". Na época das feiras a empresa certificadora "fez um programa que custa 125 euros mais os 40 cêntimos para certificar o queijo para venda na feira". Recusou. "Se não era um produtor de queijo por um dia e toda a minha vida fui queijeiro." E acusa: o processo de fazer com que o nome "queijo serra da Estrela" saia da mão dos "verdadeiros produtores que são os pastores os que menos produzem e que fazem o genuíno queijo a quem deram o nome". E resume "estão ao matar o queijo". .Do sector de produção de queijo da serra da Estrela dependem, directa e indirectamente, dez mil pessoas. Nas feiras que hoje começam deverão ser transaccionadas perto de 30 toneladas por certame. Há cinco anos vendiam-se 50 toneladas. O preço é o mesmo do ano passado: 15 euros o quilo.