Carlos Melancia recordou, em declarações ao Plataforma Media, a importância para Macau de uma reunião de trabalho que decidiu manter na capital chinesa com o então primeiro-ministro Li Peng, pouco tempo depois da violenta repressão que se abateu sobre os manifestantes na Praça da Paz Celestial (Tiananmen)..Na véspera do 30.º aniversário do 4 de junho de 1989, Melancia fala de "uma reunião que viria a ter lugar por razões imprevisíveis 10 dias após a data do incidente", explicando que "a posição do governador de Macau de manter a reunião com o governo da República Popular da China [para tratar, entre outros assuntos, da construção do aeroporto] foi expressamente sancionada pelo então presidente da República [Mário Soares] e pelo primeiro-ministro de Portugal [Cavaco Silva]"..Esse foi aliás um dos temas debatidos por Melancia com o governo e a presidência da República nas primeiras horas a seguir aos sangrentos acontecimentos e retomado, posteriormente, numa deslocação que efetuou dias depois a Lisboa..A singular posição de Macau.O objetivo da viagem a Portugal, de acordo com a imprensa do território - Tribuna de Macau - passou, designadamente por encontrar "uma estratégia nacional" [que juntava a presidência e o governo da República] para lidar com a nova situação na China..Todas as partes reconheceram que, independentemente dos protestos de Lisboa dirigidos a Pequim e das posições comuns adotadas por Portugal no âmbito da Comunidade Económica Europeia (CEE) sobre o ato de repressão, não se podia esquecer a "singular posição de Macau", uma vez que já vigorava a Declaração Conjunta Luso-Chinesa..Segundo o mesmo semanário, a CEE estaria a pressionar Portugal para adiar as reuniões do Grupo de Ligação Conjunto, manifestando assim o desagrado europeu pela repressão violenta do movimento estudantil e secundando a posição do Reino Unido que suspendeu por tempo indefinido as reuniões do Grupo de Ligação de Hong Kong..No depoimento ao Plataforma Media, Melancia, hoje com 91 anos, esclareceu que no âmbito do acordo entre os dois Estados estavam já acertadas "reuniões conjuntas entre o primeiro-ministro chinês e o governador de Macau".."O aeroporto era uma peça importante para o futuro de Macau, mas estava a ser contestada pela administração de Zhuhai, que alegava ter condições para servir o território de Macau com o aeroporto local". As autoridades daquela região diziam mesmo que esse foi um argumento "previsto aquando da construção" do aeroporto local, atirou Melancia, como que a justificar a urgência das reuniões em Pequim.."Uma dificuldade desta natureza só podia ser ultrapassada pelo governo da República Popular da China, como aconteceu, revelando-se portanto importante não adiar a reunião acordada previamente", adiantou..Os acontecimentos de julho de 1989.No dia 5 de junho de 1989, em declarações à Rádio Macau, citadas pelo Jornal de Macau, Carlos Melancia faz um primeiro comentário à situação na capital chinesa, reconhecendo que o uso da força militar contra os manifestantes de Pequim "afeta com certeza a estabilidade de Macau"..O então governador disse não poder "aceitar como desejável, ou sequer como medida adequada, o uso da força, ainda por cima contra pessoas que não estavam sequer armadas"..Melancia fez questão de acentuar que as suas palavras eram uma tomada de posição "em termos formais", reconhecendo, contudo, estar-se perante "um problema interno da China"..O então máximo responsável político de Macau acentuou que a população local podia contar com a sua "solidariedade", classificando as ações de protesto no território como "perfeitamente defensáveis e aceitáveis", e enaltecendo o caráter "ordeiro" dos mesmos..Disse compreender que "as pessoas se sensibilizem e se mobilizem", considerando que "o mínimo que se exigia era que se tomassem posições de solidariedade, tanto mais que elas têm a ver com o futuro e a estabilidade de Macau"..Com as comemorações do Dia de Portugal à porta, Carlos Melancia voltou a tocar em Tiananmen nas cerimónias do 10 de junho, das quais decidiu amputar todas as realizações de caráter festivo previstas, "em virtude da gravidade da situação em Pequim"..Da sessão oficial no Palácio do Governo, o Jornal de Macau relatou que Carlos Melancia voltou a evidenciar que os acontecimentos na China tinham "reflexos em todo o mundo" e, por razões óbvias, faziam-se "sentir com redobrada razão no território de Macau"..Numa outra passagem, alegadamente destinada a tranquilizar a população local, o governante citou passagens da declaração conjunta, designadamente, a referência de que "após o estabelecimento da RAEM não serão nela aplicados o sistema e as políticas socialistas, mantendo-se inalterados os atuais sistemas social e económico, bem como a respetiva maneira de viver, durante 50 anos"..Em declarações ao Plataforma Media, Carlos Melancia fez questão de frisar que acontecimentos como os de Tiananmen "não se podem repetir"..* Jornalista da Plataforma Media Macau