Carga fiscal sobre as famílias não muda com menos retenção na fonte, avisam fiscalistas
O Governo estará a preparar um ligeiro alívio do IRS das famílias em 2021, através da redução da taxa de retenção na fonte, mas trata-se apenas de uma medida temporária e essa "conta" acabará por surgir em 2022, quando o Fisco fizer a liquidação do imposto do ano anterior. A notícia foi avançada este fim-de-semana pelo semanário Expresso.
"A medida aparenta estar desenhada para reduzir apenas as retenções na fonte por conta, mas não as taxas ou os escalões de IRS, nem as retenções na fonte que sejam definitivas. Ou seja, a carga fiscal sobre as famílias, manter-se-ia igual", aponta o fiscalista Jaime Esteves ao Dinheiro Vivo. "Reduzir-se-ia apenas o "empréstimo forçado" que todos os meses as famílias fazem gratuitamente ao Estado para serem reembolsadas, sem remuneração, no ano seguinte", conclui.
A fiscalista Anabela Silva, da consultora EY, também alinha nesta análise. "Trata-se apenas de um efeito financeiro, dado que, não obstante aumentar o rendimento líquido mensal, esta medida não tem impacto no imposto final a pagar, que continua a ser exatamente o mesmo", indica ao Dinheiro Vivo.
"Tecnicamente não há um aumento de rendimento líquido das famílias, mas sim uma transferência de rendimento que ocorreria pelo reembolso do IRS em 2022 para uma menor retenção na fonte em 2021", acrescenta Luís Leon, partner da Deloitte, vendo como positivo o facto de a medida "aproximar o valor retido ao valor do imposto final", ainda que de forma temporária.
Anabela Silva lembra que o Ministério das Finanças já poderia ter optado por ajustar as tabelas de retenção para este ano, "refletindo de forma integral a redução de IRS resultante do desdobramento dos escalões verificado de 2017 para 2018".
O adiantamento de que fala Jaime Esteves é depois acertado no ano seguinte ao do pagamento do IRS, quando os contribuintes entregam a declaração, cujo prazo atual decorre entre os meses de abril e junho.
"Caso não estejam previstas outras alterações na proposta de lei do OE2021que se traduzam numa diminuição efetiva do IRS, a atualização das tabelas de retenção poderá de facto, traduzir-se num menor reembolso, ou mesmo pagamento, na liquidação final do imposto", avisa Anabela Silva.
"A "fatura" chegará em 2022, no sentido de que o reembolso a que as famílias estão habituadas será necessariamente menor, ou o valor a pagar será maior, nos casos raros em que isso acontece", indica o fiscalista Jaime Esteves. "Tudo na exata medida da redução da retenção na fonte por conta e, portanto, temporária, até se fazerem as contas finais", conclui.
"É importante sublinhar que o Estado não está a dar qualquer dinheiro aos contribuintes", sublinha o fiscalista António Gaspar Schwalbach, da Serra Lopes/Cortes Martins (SLCM), acrescentando que "a boa notícia é que os contribuintes serão livres para aplicar este aumento de liquidez imediato como entenderem." A má "é que alguns trabalhadores, que por algum motivo no passado, poderiam receber um valor residual de reembolso, poderão agora ser obrigados a pagar algum imposto - também residual", conclui.
Mas tudo vai "depender da situação concreta de cada contribuinte", avisa Ana Duarte, tax partner da PwC.