Em contagem decrescente para o final do período de transição do Brexit e ainda sem acordo sobre a futura relação entre o Reino Unido e a União Europeia(UE), o Conselho Europeu que se realiza na próxima quinta-feira, 19 de novembro, por videoconferência, é visto como uma última oportunidade para os líderes dos 27 darem luz verde ao texto final.."Se não houver boas notícias até lá, então temos mesmo de dizer que o tempo acabou. Já não é possível", disse um diplomata europeu, sob anonimato, ao The Guardian. "Os líderes precisam de ver que estamos lá", acrescentou. Um último bluff da parte dos europeus para obrigar os britânicos a fazer cedências ou chegamos mesmo ao final da linha?.Mas se há uma verdade nas negociações entre o Reino Unido e a União Europeia sobre o Brexit até agora é que há sempre uma forma de alargar os prazos. Se isso foi verdade em relação à data de saída, inicialmente prevista para 29 de março de 2019, depois para final de abril e depois para outubro, até se concretizar finalmente a 31 de janeiro de 2020, também é verdade para as negociações sobre a futura relação entre os dois blocos..O período de transição termina a 31 de dezembro, e essa data parece impossível de mudar, mas cada nova ronda de negociações é apresentada como a "última oportunidade" para se chegar a acordo. O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, tinha dito que queria inicialmente um acordo até ao final do verão, depois até meados de outubro, e agora é o Conselho Europeu do próximo dia 19 que parece ser final..O prazo importa mais aos europeus do que aos britânicos: afinal, qualquer acordo alcançado entre Bruxelas e Londres terá de ser ratificado ainda pelo Parlamento Europeu, que diz que precisa de um texto até à segunda-feira seguinte para começar a trabalhar. Na prática, o texto poderia ser votado na sessão de 16 de dezembro, podendo até haver uma sessão extraordinária no dia 28..Quem também pode ser chamado a validar o acordo são os 27 parlamentos nacionais, além de alguns regionais, mas há quem alegue que isso não é preciso (o acordo de comércio entre a União Europeia e o Japão não precisou desse passo). Já no Reino Unido, basta a luz verde do Parlamento britânico, à partida mais fácil..Lutas internas no Governo britânico, que já levaram à saída de dois assessores, não têm contribuído para facilitar a negociação. Dominic Cummings, o principal assessor de Boris Johnson e o estratega tanto da campanha do referendo do Brexit como da sua eleição, confirmou na semana passada que ia abandonar o cargo no final do ano, mas rejeitou que tal estivesse ligado a lutas de poder. Mas, entretanto, deixou o número 10 de Downing Street na sexta-feira..À BBC disse que a sua partida, que já tinha previsto desde o início do ano porque considerava que ia passar a ser redundante após o Brexit, nada teve a ver com a renúncia do diretor de comunicação e um de seus grandes aliados, Lee Cain, que viu negada uma promoção a chefe de gabinete. O Governo britânico negou entretanto problemas na negociação do Brexit, lembrando que o negociador é David Frost..Mas o que é que está a impedir o acordo? De forma resumida, o problema prende-se com direitos de pesca e com a garantia de "igualdade de condições" para manter uma concorrência leal entre as empresas do Reino Unido e a União Europeia, além do mecanismo que será usado para resolver futuras disputas..Se nas pescas o que está em causa é o acesso às águas britânicas, com Londres a dizer que os europeus ainda não perceberam as alterações que têm de ser implementadas visto o país recuperar o controlo das suas águas territoriais, no caso da concorrência é a União Europeia que recusa um acordo de "tarifas zero e quotas zero" sem garantir que as empresas do Reino Unido vão operar sob as mesmas regras do que as europeias, no que diz respeito a padrões ambientais, de trabalho e sociais.."As negociações continuam até este fim de semana em Londres e serão retomadas na próxima semana em Bruxelas", disse uma fonte europeia na última quinta-feira. "Progressos estão a ser feitos, mas as divergências persistem", declarou então Michael Gove, do Conselho de Ministros britânico.."O Reino Unido já demonstrou grande flexibilidade nestas negociações, mas é igualmente importante que a UE também mostre flexibilidade", acrescentou o Gove, advertindo que "qualquer tentativa de continuar a vincular o Reino Unido aos processos da UE ou de estender a jurisdição da UE por outros meios seria um erro"..Caso não haja acordo até 31 de dezembro, as trocas comerciais entre o Reino Unido e os 27 passam a ser regulados pelas regras da Organização Mundial do Comércio, com a imposição, nomeadamente, de taxas alfandegárias e limites às importações e exportações - o que poderia trazer mais problemas à economia, especialmente em plena crise causada pela pandemia de covid-19..A falta de acordo seria especialmente complicada na fronteira entre Irlanda do Norte e República da Irlanda..Londres está a tentar que o Parlamento de Westminster aprove uma legislação controversa para regulamentar o seu comércio com a Irlanda do Norte, que significaria reescrever de forma unilateral o acordo de saída assinado com Bruxelas e violar os seus termos. A União Europeia já iniciou processos legais contra o Reino Unido..A votação foi entretanto chumbada na Câmara dos Lordes na semana passada, mas a maioria dos conservadores na Câmara dos Comuns permitirá a Boris Johnson dar a volta ao problema..Do outro lado do Atlântico, a vitória do democrata Joe Biden nas presidenciais norte-americanas não foi uma boa notícia para os britânicos. O presidente eleito, que tem sangue irlandês, avisou Londres de que um acordo de comércio entre os EUA e o Reino Unido ficará comprometido se a Irlanda se tornar uma "vítima" de um não-acordo com a União Europeia..Mas um Brexit sem acordo custaria também caro aos países europeus, incluindo a Portugal. Um estudo da companhia de seguros Euler Hermes, publicado no final de outubro, calculou em 433 milhões de euros as perdas para Portugal ao nível das exportações - frente a perdas de 218 milhões de euros caso haja acordo..Os países mais afetados, segundo o mesmo estudo, seriam a Alemanha (8,2 mil milhões de euros), os Países Baixos (4,8 mil milhões), a França (3,6 mil milhões), a Itália (2,6 mil milhões) e a Espanha (2,1 mil milhões)..No cenário de saída sem acordo, os economistas estimam que o Reino Unido registe, em 2021, uma contração de cerca de -5% do PIB, uma diminuição de -13% nas exportações, uma redução do total de investimento superior a -25%, uma desvalorização de cerca de -10% da libra e um aumento de 53% nas insolvências de empresas..Já no cenário de saída com acordo, ao qual a Euler Hermes atribui uma probabilidade de 55%, as perspetivas económicas são mais animadoras. Se houver um entendimento de última hora, o Reino Unido registará um crescimento de 2,5% do PIB, um crescimento de 1,8% nas exportações, uma redução do total de investimento de cerca de -15%, uma desvalorização de apenas -3% da lLibra e um aumento de 31% nas insolvências de empresas.