A chegada de Theresa May, nesta nova visita a Bruxelas, teve uma coreografia diferente das anteriores. Quando a porta da entrada das visitas ilustres deslizou para a direita, ao fundo do corredor, a primeira-ministra britânica, o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, e o negociador europeu Michel Barnier para o Brexit já caminhavam lado a lado. Percorreram os poucos metros até ao cenário protocolar e pararam junto das bandeiras do Reino Unido e da União Europeia. Enquadradas no fundo azul. A pausa para a fotografia durou pouco e ficou-se por aí, contrariando o hábito, isto é, tudo aconteceu sem o simbólico aperto de mão..Há outro contraste que merece ser registado: Theresa May já não exibe aquela determinação com que afirmava "Brexit means Brexit". No seu rosto via-se a expressão de quem faz uma visita para cumprir calendário e não espera daí grandes resultados. A confirmação disso mesmo ficou evidente pelo silêncio, que deixou no ar quando um jornalista disparou a mesmíssima pergunta que tinha lançado na mesma circunstância, há duas semanas. "Espera algum resultado, primeira-ministra?" Foi deixado sem resposta. Mais uma vez..Afinal, depois de ver recusadas alterações ao chamado backstop para a Irlanda e de ver recusado o denominado plano Malthouse - que propunha controlos transfronteiriços através de uma tecnologia que a União Europeia diz não existir nos dias de hoje -, a líder conservadora vinha apenas pedir alguma garantia legalmente vinculativa de que o plano de último recurso para a Irlanda não seja para a eternidade. Mas, à parte das reiteradas manifestações de boa vontade e de colaboração com a primeira-ministra do Reino Unido, que todos os governos da UE27 têm afirmado, nada mais se avançaria na breve reunião que se seguiria àquele registo fotográfico..Mais contidos, os jornalistas evitaram repetir uma nova longa série de perguntas, sem resposta, como tinha acontecido na visita anterior. Ainda houve uma nova tentativa, incompleta, quando um jornalista insistiu: "prime-minister...", que em inglês não tem género, e Juncker aproveitou a deixa como fuga, para descomprimir daqueles tensos instantes. "Yes", respondeu o atual presidente da Comissão, no tom irónico que o caracteriza. "Eu já fui primeiro-ministro", acrescentou Juncker, conseguindo então desmontar a seriedade de May, agora sorridente com a piada..Reunião para reforçar confiança entre as partes O gabinete do presidente da Comissão Europeia está praticamente como Durão Barroso o deixou. O mesmo mobiliário, e a mesma disposição na sala principal do 13.º andar do edifício Berlaymont. Em frente à secretária do presidente havia uma pequena mesa de vidro. A secretária mantém-se, hoje está enfeitada com uma pequena estatueta. Por baixo tem a mesma carpete, com figuras xadrez de cordas entrelaçadas, que fazem lembrar o estilo manuelino..Jean Claude-Juncker sentou-se no canapé mais próximo da sua secretária. Theresa May sentou-se num que fica de costas para o envidraçado que dá para a Rue de la Loi, mesmo em frente ao edifício do Conselho Europeu, onde tantas vezes tem ouvido dizer que um acordo fechado não é reaberto..Nesta quarta-feira à noite, a conversa centrou-se no papel que poderia ser desempenhado por uma alternativa ao chamado backstop para a Irlanda. A solução de último recurso para evitar o regresso de uma fronteira física entre a Irlanda do Norte e a República da Irlanda foi um dos pontos de partida para as negociações do Brexit e mantém-se, até hoje, como "compromisso" irrevogável, reiterado de novo por Juncker e May..Os dois responsáveis conversaram sobre eventuais "garantias extra", escritas na declaração política, sobre o carácter temporário da controversa solução para a Irlanda, com o objetivo de "gerar confiança entre ambas as partes", durante as discussões para a relação futura entre o Reino Unido e a União Europeia..Na declaração conjunta, emitida no final do encontro, lê-se que os dois líderes "concordaram que as conversas foram construtivas e pediram às respetivas equipas para continuarem a explorar as opções com um espírito positivo"..Crises para todos os gostos em Londres Entretanto, em Londres, a apertada margem de manobra política de Theresa May tem-se estreitado cada vez mais. Na véspera deste seu novo regresso a Bruxelas, um grupo de três deputadas do seu partido, conhecidas pelas suas posições a favor da permanência na União Europeia, abandonou o grupo do Partido Conservador. Mais demissões de parlamentares podem suceder-se..Numa carta dirigida à primeira-ministra britânica, "com pesar", as deputadas, agora num grupo de independentes, dizem estar a "renunciar ao chicote conservador e à filiação ao partido". E afirmam: "Nós votámos em si como líder e primeira-ministra, porque acreditámos que estava comprometida com um Partido Conservador moderado e aberto na tradição da Nação Única", continuam, descrevendo o que pode ser entendido como uma perda de confiança em May..Estas deputadas juntaram-se a outros oito deputados que se demitiram do Labour de Jeremy Corbyn, no chamado The Independent Group. Os antigos membros do Partido Trabalhista contestam, entre outras coisas, as "posições antissemitas" do líder do partido, Jeremy Corbyn. Unidos na oposição ao Brexit, os 11 deputados poderão influenciar o rumo do processo, acredita o analista Joe Twyman, diretor da empresa de sondagens Deltapoll. "A principal prioridade deles é o Brexit, seja a favor de um segundo referendo, do fim do Brexit ou de ficar no mercado único, mas querem ser o fiel da balança nessa questão", salientou, em declarações à BBC News.