Brexit abre guerra entre Londres e Madrid por causa de Gibraltar
A primeira-ministra britânica garantiu ontem que Londres não vai abdicar da soberania sobre Gibraltar sem o acordo da população do território situado no extremo sul de Espanha. Esta é a resposta de Downing Street à polémica aberta com o projeto de orientação das negociações para a saída do Reino Unido da União Europeia feita pelo presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk. O documento estipula que qualquer acordo futuro entre a União Europeia e o Reino Unido, que afete Gibraltar, terá de ser aprovado por Espanha.
Depois de falar ao telefone com o chefe do governo de Gibraltar, Fabian Picado, Theresa May afirmou que jamais aceitará que um acordo sobre aquele território seja decidido por outra soberania sem que a população local manifestasse a sua vontade livre e democrática. "A primeira-ministra manifesta o seu total empenhamento em trabalhar com Gibraltar para obter o melhor resultado possível em relação ao brexit e que esse território continuará a participar plenamente no processo de negociações", adiantou o gabinete de May. De recordar que, em 2002, os habitantes de Gibraltar rejeitaram, em referendo, a proposta de partilhar a sua soberania com Espanha.
Também o ministro dos Negócios Estrangeiros britânico assegurou que "Gibraltar não está à venda". "Gibraltar não pode ser moeda de troca. Gibraltar não será vendido", insistiu Boris Johnson em entrevista ao The Sunday Telegraph.
Para Espanha a situação é clara: "quando o Reino Unido sair da UE, o sócio da UE é Espanha e, no caso de Gibraltar, a UE está portanto obrigada a colocar-se ao lado de Espanha", disse ontem em entrevista ao El País o chefe da diplomacia de Madrid. Num tom mais conciliador, Alfonso Dastis notou que o documento proposto por Tusk ainda tem de ser aprovado pelos chefes de Estado e do governo dos 27 países da União Europeia, "mas valorizamos de forma positiva que o documento reconheça a posição de Espanha".
O ministro garantiu ainda que Madrid "não tem a intenção de fechar a fronteira com Gibraltar" e que a "ideia é que os espanhóis que vivem na província de Cádiz e que trabalhem em Gibraltar possam continuar a fazê-lo".
Novo referendo a caminho
Por lidar a nível interno com as pretensões independentistas da Catalunha, a Espanha tem sido vista como um obstáculo a uma Escócia independente se juntar à União Europeia após o brexit. Mas ontem, Madrid deu um primeiro sinal de abertura. "Inicialmente não penso que bloquearíamos", afirmou ao El País o ministro dos Negócios Estrangeiros espanhol.
Mas tornou claro que primeiro a Escócia terá de deixar o bloco juntamente com o Reino Unido, "depois logo veremos" e sublinhou que Espanha "não vê com bons olhos que nenhum Estado europeu inicie processos de fragmentação".
"Disto isto, se, em aplicação das suas leis, o resultado desse processo for uma divisão do Reino Unido, qualquer parte do Reino Unido que se torne um Estado e que queira aderir à UE terá de candidatar-se. E seguir os passos estipulados", fez notar Alfonso Dastis.
Depois do referendo de 2014 - no qual o não venceu com 55,3% - o primeiro-ministro espanhol, Mariano Rajoy, afirmou que a independência da Escócia seria uma catástrofe que poderia causar a desintegração europeia. Um tom que tem vindo a suavizar-se desde que o Reino Unido votou para sair da UE.
Na sexta-feira, governo da Escócia notificou Theresa May do pedido para organizar um segundo referendo sobre a independência.