Bofetadas, cachaços e humilhações. O "modelo educativo" na Casa dos Rapazes
Bofetadas e cachaços, insultos e humilhações faziam parte do tratamento dado pela diretora técnica e por quatro funcionários a menores acolhidos na Casa dos Rapazes de Viana do Castelo. A acusação é do Ministério Público (MP) e os cinco arguidos começam na quarta-feira a serem julgados no tribunal da cidade do Minho por 35 crimes de maus-tratos infligidos a 13 menores que estavam acolhidos na instituição particular de solidariedade social de acolhimento residencial para rapazes entre os 6 e os 18 anos.
A diretora técnica, que foi forçada a demitir-se, após o caso ter sido tornado público, é acusada de seguir um modelo educativo em que constavam agressões físicas e humilhações, como impropérios, bofetadas e cachaços, e de incitar os funcionários a adotar o mesmo "modelo de educação", lê-se no despacho de acusação. Maria Manuela Costa está acusada de 13 crimes de maus-tratos, os quais são descritos pelo MP. Num deles a diretora técnica deu duas pancadas na cara de um menor em reação a um seu comentário.
De acordo com o Ministério Público, os factos em causa ocorreram no período compreendido entre o ano de 2015 e meados de 2017, e reportam-se à conduta dos arguidos no "lar de infância e juventude, que acolhia crianças e jovens em situação de perigo e sem adequada retaguarda familiar". Estão acusados de "aplicarem castigos físicos a diversas crianças e jovens e de os sujeitarem a tratamentos atentatórios da sua dignidade".
Os factos chegaram ao MP após duas educadoras do mesmo lar terem denunciado a situação, em meados de 2017. Em simultâneo cartas anónimas chegaram ao Instituto de Apoio à Criança, ao Ministério Público e ao Centro Distrital da Segurança Social. As duas funcionárias chegaram a ser suspensas por terem efetuado a denúncia. Só um mês depois de ser conhecida a investigação, a Casa dos Rapazes afastou os quatro funcionários. A diretora só se demitiria mais tarde, em abril de 2018, por pressão da Segurança Social. Um sexto funcionário chegou a ser constituído arguido mas depois não foi acusado pelo MP.
Chegou a circular um vídeo na comunicação social com imagens de uma das reuniões semanais que a diretora técnica fazia com os rapazes. Percebia-se que funcionários proferiam insultos e faziam agressões - bofetadas e pancadas - aos menores. A defesa dos arguidos chegou a admitir pedir a abertura de instrução mas acabou por não o fazer.
No despacho de acusação, o MP invocou o Estatuto da Vítima e requereu ao tribunal a atribuição de uma quantia a título de reparação pelos prejuízos sofridos pelos jovens, considerados pessoas especialmente vulneráveis por serem menores e por estarem acolhidos numa instituição que tinha por missão protegê-los. Algumas das vítimas já não estão em Viana do Castelo, tendo sido encaminhadas para outras instituições similares.
Estes jovens chegam à Casa dos Rapazes por decisão dos tribunais e das comissões de proteção de crianças e jovens em perigo - muitos foram vítimas de maus-tratos e retirados às suas famílias temporariamente. A instituição devia zelar para que não voltassem a sofrer maus-tratos e, segundo o MP, os arguidos não zelaram por isso e acabaram por ser agressores.