Das modelos das capas de revista às publicações colocadas nas redes sociais, somos bombardeados diariamente com imagens do corpo perfeito, muitas vezes representado como magros, atléticos com barriga definida, sem estrias ou celulite. Em contraponto a esta imagem começaram a surgir movimentos como o body neutrality e body positivity que tentam quebrar os padrões de beleza corporal que são impostos pela sociedade e normalizar todos os tipos e formas de corpo..O body positivity pretende demonstrar que todos os corpos são belos e que os devemos amar independente do seu tamanho ou forma. Este primeiro movimento surgiu em 1969 em Nova York com o engenheiro Bill Fabrey, depois de perceber como a sua mulher era tratada por não ser padrão. O body neutrality surgiu mais recentemente e veio responder às problemáticas encontradas no body positivity. Prioriza a aceitação do próprio corpo, sem a necessidade de o amar todos os dias.."Um exemplo que podemos dar de body positivity são aqueles exercícios de observação do corpo com afirmações positivas que é por exemplo: eu amo o meu corpo, ou a minha barriga é linda como ela é. Já um exemplo do body neutrality são frases como as minhas pernas são boas porque me permitem correr ou eu sou grata pelos meus braços porque eles me permitem abraçar quem eu amo. No fundo a ideia é que eu sou mais do que um corpo", explicou ao DN a psicóloga Joana Gentil Martins..A maior problemática encontrada no movimento body positivity foi a possível sensação de fraude, que se poderia formar no indivíduo ao afirmar que ama o seu corpo, quando na realidade ainda não chegou a esse ponto. O primeiro passo é a aceitação, como refere o movimento do body neutrality. No entanto, alguns especialistas afirmam que os dois podem viver em simultâneo, complementando-se. Como nutricionista, Lillian Barros, tem em conta os movimentos de valorização de todos os corpos. "É muito importante que os pacientes valorizem o seu corpo e procurem metas reais, de acordo com a sua genética, formato de corpo, rotina, preferências e necessidades. Frequentemente, os corpos considerados padrão de beleza não são sequer saudáveis, pelo que não devemos procurar atingir algo irrealista", referiu, respondendo ao DN por email..Catarina Rochinha, ativista digital e criadora de conteúdo, segue a ideia de que os dois movimentos conseguem viver em harmonia, mas para si o principal é as pessoas não terem medo de começar uma jornada de autoconhecimento. "Acho extremamente importante as pessoas saberem quem são. Acho importante colocar em perspetiva as inseguranças que sentem e perceberem de onde essas inseguranças surgem",afirmou ao DN..Por vezes, os dois movimentos podem levar a interpretações erradas. Estes não pretendem glorificar a obesidade, mas sim expressar a liberdade corporal e fazer as pessoas sentirem-se bem consigo mesmas "Aceitarmos e amarmos o nosso corpo não deve significar resignar-nos e mantermos os hábitos menos saudáveis. Não desvalorizo a problemática que é a obesidade ou os malefícios que aportam o excesso de peso, mas body positivity não é pro obesidade", sublinhou a nutricionista..Catarina Rochinha pretende desmistificar os tabus sobre o tema e refere que "as pessoas não se devem esconder, devem ser vistas e não ter a vergonha de quem são independentemente se estão numa jornada de perder peso ou não, independente daquilo que outros possam ou não considerar saudável".. No mundo das redes sociais, o conteúdo a que os utilizadores estão expostos depende de como os próprios os consomem. Enquanto redes sociais como Instagram focam-se por vezes no "sonho"", não só do corpo ideal, mas também da vida ideal, outras redes como o tiktok acabam por ser mais realistas..Segundo Joana Gentil Martins, as imagens que constam nas plataformas online são editadas e representam apenas o segundo em que aquelas fotografias são tiradas e "não a realidade do que há por trás. Nós precisamos de saber que o que nós vemos é só uma pequena parte da realidade.".Mas este não é o único fator que leva à perda de autoestima. Os comentários negativos deixados nas publicações podem ir desde insultos ao chamado dislike (quando uma pessoa não coloca gosto nas publicações)..A psicóloga Joana Gentil recomenda aos utilizadores que façam uma análise das próprias redes sociais, deixarem de seguir contas que os fazem sentir-se mal e passar a seguir contas de pessoas que normalizam todos os tipos de corpo e que promovem a autoaceitação. Para Catarina Rochinha, a vida de criadora de conteúdo nas redes sociais surgiu de forma espontânea. Durante a pandemia, começou por partilhar com o mundo as suas ideias e visões, acabando por rapidamente crescer. Notou que em Portugal não existiam muitos influencers a falar dos movimentos como body positivity e body neutrality, o que a levou a postar sobre a temática com o objetivo de normalizar a mesma. "Estou completamente exposta e há pessoas que por vezes podem fazer comentários menos simpáticos, existe bullying online, existe o body shaming, etc...", denuncia..Body Shaming é um tipo de bullying relacionado com corpo. Este pode evoluir para um tipo de fobia, ou seja, gordofobia . Sempre foi aquilo que se apelida de "cheinha", mas nunca deixou de ser confiante. Embora na adolescência houvesse alguma pressão para fazer imensas dietas, percebeu que era menos saudável com este tipo de alimentação altamente restringida..Com 38 mil seguidores no instagram, os seus vídeos e imagens fazem a diferença para os seus seguidores. "É absurdo conseguir perceber a diferença que eu e as outras pessoas deste meio temos tido na vida de muita gente. Eu já tive pessoas no meio da rua que me abraçaram, agarram-me a chorar, tenho pessoas que me mandam mensagens a dizer que ao fim de não sei quantos anos conseguiram pela primeira vez vestir um biquini e ir à praia.".Umas das grandes lacunas que Catarina Rochinha nota na sociedade é a não existência de tamanhos maiores para pessoas maiores "Eu tento sempre trabalhar com marcas que acreditam efetivamente naquilo que eu acredito. Tento sempre trazer marcas que tenham variedade de tamanho e peças de roupa. Por vezes à pouca diversidade para aquilo que é tendência nos tamanhos maiores. É tudo cores neutras.".Atualmente a ativista com formação e trabalho na área de marketing e publicidade, lançou uma campanha para exigir a obrigatoriedade de um selo ou frase nas capas de revista e anúncios que têm imagens manipuladas pelo photoshop, incluindo corpos e aparências que fogem à realidade. "Por todas as pessoas enganadas e diminuídas por caber num padrão que não é real", lê-se na publicação do Instagram. Catarina Rochinha pretende levar a temática a debate na Assembleia da República..O verão pode levar a uma maior preocupação com a imagem corporal devido ao uso de menos roupas com o calor. A procura por nutricionista aumenta igualmente nesta altura do ano pela mesma razão. Mas Lillian aponta ainda os excessos como os jantares de verão, petiscos, gelados e bebidas alcoólicas, e o sedentarismo como outros motivos para preocupação da imagem..No entanto, a alimentação deve ser baseada na contagem de calorias. "Um gelado deve ser inserido no contexto de um dia alimentar e não como um alimento "engordatório". Quero dizer com isto que nada nos engorda isoladamente, mas sim no seu contexto de consumo alimentar complementar",explicou a nutricionista..Ao longo dos anos, os padrões de beleza tem vindo a mudar . Esculturas da antiguidade demonstram como o padrão ideal da altura era mulher com curvas e maiores. Já no final dos séculos XX, o corpo ideal era uma mulher alta e magra. Atualmente, o corpo de sonho de muitas jovens é a anca larga e a cintura fina. Os movimentos body positivity e body neutrality tentam quebrar este padrão. Jovens cada vez mais nas redes sociais mostram os seus verdadeiros corpos, amando-os como eles são e celebrando-os..mariana.goncalves@dn.pt