Batarda e Deneuve, duas atrizes a encantar a Berlinale

Teresa Villaverde trouxe o desespero português para o festival de Berlim. Por oposição, em "Sage Femme", de Martin Provost, Deneuve insuflou-nos de vida.
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Os contrastes na Berlinale estão na ordem do dia. O silêncio sepulcral de Colo, de Teresa Villaverde, ontem mostrado em competição, contrastava com a celebração da vida que Martin Provost filma em Sage Femme, umas das mais inesperadas interpretações da carreira de Catherine Deneuve. A pálida e funesta Beatriz Batarda de Colo é um contraste de choque para esta Deneuve a gritar bem forte "quero viver!". Mesmo após uma operação a um cancro cerebral terminal.

Villaverde, que na conferência de imprensa estava com uma tranquilidade exemplar, filmou a crise económica portuguesa dos tempos da troika como uma terapia de silêncio. O que está ali é uma família a desistir de ser família. O fim de um sonho português. De um lado uma mãe presa ao trabalho e um pai angustiado pela frustração do desemprego, do outro uma adolescente que sente tudo à flor da pele e perde-se por esta Lisboa ainda capaz de locais secretos e de refúgios para se esquecer a realidade.

Mas a tranquilidade da realizadora na conferência de imprensa traz-lhe otimismo, um otimismo que a fez dizer que acredita que "vamos ultrapassar esta situação". Falava da questão da aprovação da nova lei do cinema da qual obviamente não concorda.

Colo não é o seu pior filme (teremos sempre Água e Sal nessa função) mas também está longe de ser o melhor. A energia com que filmava a juventude perdeu a urgência e quase que se pressente uma aragem a naftalina de um certo cinema português datado dos anos 1980. Ainda assim, há coisas soltas espantosas, em especial o rigor de Beatriz Batarda e a forma como somos puxados para um abismo interior, sem pressas.

Em Sage Femme, apresentado fora de competição, estamos perante um tocante melodrama que faz algo muito raro no panorama francês: uma obra de cinema de autor comercial. A história de uma parteira (Catherine Frot) perto dos 50 que vê a vida chegar a um crepúsculo: a maternidade onde trabalha vai encerrar, continua sem homem e o filho vai sair de casa. Tudo muda quando recebe uma mensagem da amante (Deneuve) do seu falecido pai, uma mulher fogosa que terá sido uma espécie de mãe de sonho durante a sua juventude. Entre as duas formar-se-á um elo feminino que desafia as convenções de maternidade.

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Sage Femme é essencialmente uma meditação sobre a catarse do perdão sem qualquer convenção de pós-feminismo ou coisa do género. É um filme de emoções abertas que deixou muitos jornalistas comovidos na sessão de imprensa. Tocante sem ser piegas e com mulheres de corpo inteiro. E Deneuve a dançar com decote a chanson française será sempre um dos momentos desta Berlinale...

Esse ou o robô romântico do muito romântico Os Humores Artificiais, de Gabriel Abrantes, uma das melhores curtas do cinema português nos últimos anos e um dos fortes candidatos ao Urso de Ouro nessa secção. Uma comédia desconcertante que é também uma lição de tolerância.

Pelo mercado, grande agitação nas vendas de alguns filmes. Dois deixam grande apetite: Radegung, de Malick com August Diehl, e The House That Jack Built, de Lars von Trier, que só se estreia em 2018 e tem distribuição assegurada para Portugal. Ainda assim, o que se ouve nos corredores de Berlim é que não foi um mercado com grandes oportunidades de negócio.

Em Berlim

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