A manhã foi agitada ontem à porta da Audiencia Nacional, tribunal espanhol com sede em Madrid. Arguidos dos casos Gürtel e Tarjetas B, num total de 102 pessoas, eram esperados à porta por manifestantes que os queriam insultar, constataram jornalistas no local. "Ladrão" ou "sem-vergonha", gritavam à medida que chegavam. Muitos deles são figuras com ligações ao Partido Popular (PP), como o ex-tesoureiro do partido Luis Bárcenas (que ontem participou na primeira sessão do julgamento do Gürtel) ou o ex-vice-primeiro-ministro de Espanha Rodrigo Rato (que esteve presente na quarta sessão do julgamento do Tarjetas B). Ambos os casos têm que ver com corrupção.."Venho aqui defender-me, não venho para atacar ninguém", começou por declarar Bárcenas no início do julgamento do Gürtel, que tem 37 arguidos. O homem que durante 18 anos geriu as contas do partido de Mariano Rajoy não desmentiu a informação avançado pelo jornal El Mundo. Segundo este diário espanhol, o ex-funcionário do Partido Popular dirigiu-se ao tribunal por escrito, negando ter sido ele o responsável "pela organização e adjudicação de campanhas eleitorais e congressos do Partido Popular" e argumentando que essa responsabilidade recaía sobre outras pessoas, nomeadamente sobre Ana Mato e o marido, Jesús Sepúlveda, que foram, respetivamente, chefe da área de participação e ação setorial e responsável eleitoral do PP. Bárcenas anexa sete documentos com os quais "justifica de que maneira eram feitos os concursos, que pessoas participavam na adjudicação e na organização dos ditos eventos e acredita que o poder de decisão das adjudicações não podia obviamente ser seu". O ex-tesoureiro é acusado de uma série de delitos fiscais por ter escondido 48 milhões de euros na Suíça..O caso Gürtel teve início há nove anos com uma investigação sobre uma rede de corrupção política ligada ao Partido Popular, que funcionava principalmente nas comunidades de Madrid e Valência. Francisco Correa era o líder do esquema que consistia em receber subornos de políticos ligados ao PP para ganhar concursos para empresas fantasmas. Gürtel é, aliás, a tradução para alemão do seu apelido e nome dado pelos investigadores à operação na altura. A investigação foi dirigida pelo conhecido juiz Baltasar Garzón, que ordenou escutas às conversas entre os líderes da rede e os seus advogados. Estas levaram mais tarde à sua suspensão por 11 anos, depois de ser acusado de prevaricação (violando o direito a confidencialidade entre cliente e advogado)..Alguns advogados de defesa pediram ontem a nulidade das gravações feitas pela pessoa que denunciou o caso Gürtel à Polícia Nacional, José Luis Peñas, por considerarem que não é possível "acreditar na sua autenticidade". Foi o caso, por exemplo, do advogado de defesa do ex-secretário--geral do PP galego Pablo Crespo. Já a defesa de Francisco Correa informou que o seu cliente não tencionava apresentar questões prévias "como gesto e boa vontade". Enfrentando 125 anos de prisão, pedidos pela procuradoria, Correa estará a tentar, mais uma vez, um acordo com as autoridades, escreviam ontem os jornais espanhóis. No julgamento do Gürtel, o total de penas de prisão solicitadas pela procuradoria é de 732 anos (para Bárcenas são 42 anos). Serão ouvidas 300 testemunhas e há 200 jornalistas acreditados para seguir de perto o julgamento..E enquanto se discutiam as questões prévias do Gürtel, numa outra sala do tribunal era ouvido o ex-vice-primeiro-ministro espanhol e ex-diretor-geral do FMI Rodrigo Rato. "Não tive dúvidas, o cartão era um pagamento legal", afirmou o ex-n.º 2 do PP, ex-diretor do banco Bankia, ouvido no âmbito do julgamento Tarjetas B (cartões de crédito fantasmas do Caja Madrid, mais tarde Bankia, usados pelos seus administradores para pagar despesas sem limite de valor e sem declarar ao fisco). Terão sido desviados 12 milhões de euros entre 2003 e 2012. Neste processo há ao todo 65 arguidos..[artigo:5088886]