As Azenhas do Mar no cinema como se fossem a Califórnia

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A história de um filme que se passa nos EUA com cenário português

Paul Auster está de volta a Portugal mas não com um livro, é um filme: A Vida Interior de Martin Frost. Os leitores portugueses já conhecem um terço do argumento deste filme porque foi extraído de um dos seus melhores romances, O Livro das Ilusões, em que se contava exaustivamente a biografia de um realizador que no auge da sua carreira em Hollywood desaparece misteriosamente.

A história de Martin Frost, que se estreia hoje, pouco tem a ver com o tradicional cinema americano. É a história de uma musa que se consome para que um escritor se inspire. Auster foi sempre assim na sua literatura, com livros que misturam um pouco de fantástico com o trivial que observa nos passeios de Brooklyn, sem se esquecer de colocar os protagonistas em diálogo com o leitor/espectador. Neste seu segundo filme, há espaço para a desilusão de quem espera mais do que um filme influenciado pelo cinema europeu de há algumas décadas mas que, ao mesmo tempo, fabrica a ilusão suficiente para quem deseja ver as personagens dos seus livros tornarem-se actores.

É a recriação do universo austeriano, só que ao vivo e filmado em Portugal, numa casa nos arredores das Azenhas do Mar. Martin Frost teve o seu último dia de rodagem, a 2 de Junho de 2006, quando se filmaram as cenas interiores que, coincidentemente, são as que encerram o filme. A equipa do DN esteve lá nesse dia e, excepcionalmente, Paul Auster deixou que se observasse o seu trabalho de direcção durante doze horas, até ao momento em que filmou o take 9 - o único exterior - de uma cena que só foi aproveitada pela metade, devido à impossibilidade de captar o som directo por causa do vento. Os outros planos desse dia, os interiores, foram todos utilizados na montagem final e nunca levaram mais do que quatro a seis repetições.

O Auster realizador é definitivamente diferente do Auster escritor. Pôde ver-se na forma como dirigia os actores, com mão-de-ferro, e ao mesmo tempo paciente enquanto esperava que a equipa técnica preparasse o cenário, sentado na relva do jardim a conversar com quem estivesse à mão. Nesse dia, à excepção do actor Michael Imperioli, estavam presentes os outros protagonistas - Irène Jacob e David Thewlis - e também a filha Sophie, que representa um pequeno papel. A francesa Jacob não foi de fácil contacto, mas durante uns 15 minutos falou da especificidade do seu papel até se retirar para o camarim onde trocou a calça cinzenta e a camisa laranja pelas roupas da musa. Voltaríamos a encontrá-la já no espaço onde ia representar, andando de um lado para o outro a repetir as suas falas, compenetrada, como se ninguém mais estivesse ali. Já Thewlis não teve problema em manter uma longa conversa até ser chamado pelo realizador. Quanto a Sophie Auster, preferiu banhar-se ao sol e apenas dialogou com uns lacónicos yes e no.

Nesse último dia de filmagens nas Azenhas do Mar esteve também presente a responsável pelo guarda-roupa, Adelle Lautz, que fez da cave da casa o atelier, onde preparava as roupas e os adereços de Martin Frost, a maior parte trazidos de Nova Iorque. Na cave estavam também guardados no congelador 15 quilos de sardinha para assar na festa de despedida das filmagens a fazer horas depois.

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