Arron Banks. O bad boy do Brexit ameaça Netflix
Arron Banks vendeu aspiradores porta-a-porta, foi mediador imobiliário e trabalhou sete anos numa companhia de seguros. Casou-se com uma russa, tornou-se empresário e, um ano depois de estar em dificuldades, começou a financiar o UKIP de Nigel Farage e, mais tarde, a campanha pela saída do Reino Unido da União Europeia. Ficou conhecido como o bad boy do Brexit. Agora, perante a estreia iminente de The great hack os seus advogados ameaçaram a Netflix por "alegações falsas e difamatórias" bem como à jornalista que é entrevistada no documentário, Carole Cadwalladr.
Em The great hack (O grande golpe) a dupla Jehane Noujaim e Karim Amer conta o escândalo da Cambridge Analytica através de duas pessoas: David Carroll, um professor de comunicação de Nova Iorque que tenta descobrir que dados a Cambridge Analytica tinha sobre ele; e de Brittany Kaiser, uma ex-funcionária da Cambridge Analytica que se tornou denunciante da forma como a empresa colecionou dados do Facebook com objetivos políticos.
À figura controversa de Arron Banks e à sua campanha de intimidação respondeu a jornalista Carole Cadwalladr também com uma ação em tribunal contra o maior doador da campanha do Brexit.
Reagiu também um grupo de defensores da liberdade de imprensa, que enviou ao ministro dos Negócios Estrangeiros Jeremy Hunt uma carta a denunciar a prática de "processos judiciais vexatórios". Dá como exemplo a jornalista maltesa Daphne Caruana Galizia, assassinada em 2017 e que ainda hoje tem 27 processos a correr contra ela, muitos dos quais através de escritórios de advocacia do Reino Unido, cujos clientes são entidades bancárias e milionários. E também de Carole Cadwalladr. "A acção judicial intentada em 12 de Julho por advogados que trabalham para Arron Banks, é outro exemplo de um indivíduo rico que parece abusar da lei numa tentativa de silenciar uma jornalista e desviar as atenções para que estes assuntos não sejam discutidos pelos políticos, pela comunicação social e pelo público num momento crítico da vida da nossa democracia."
Arron Banks tem uma história de vida com muitas interrogações. As suas ligações russas vão para lá da mulher, Ekaterina. Com o diretor de comunicação da campanha Leave.Eu, Andy Wigmore, encontrou-se várias vezes com o embaixador russo em Londres Alexander Yakovenko e, segundo Carole Cadwalladr, terão negociado um acordo de financiamento através do banco estatal russo Sberbank.
Segundo o site Open Democracy uma empresa de seguros sua com base em Gibraltar, Southern Rock, em graves dificuldades financeiras, foi objeto em 2015, meses antes de ter começado a financiar a campanha do referendo, de uma "misteriosa injeção de capital essencial à sobrevivência do império de seguros de Banks". Nesse mesmo ano disse ao Financial Times que tinha uma fortuna de 100 milhões de libras, um valor que não é confirmado por dados oficiais. Segundo a Bloomberg, as doações de Arron Banks equivaleram a um quarto dos seus ativos.
Depois de ter doado um milhão de libras ao UKIP de Nigel Farage em 2014, Banks gastou nove milhões de euros na campanha pelo Brexit. E não se coibiu de usar os contactos dos clientes da sua empresa de seguros, Eldon Insurance, para fazer campanha. Os escritórios da seguradora em Bristol serviram de sede da campanha Leave.Eu, com os 60 funcionários do atendimento telefónico a fazer campanha. A diretora da campanha e funcionária da seguradora Elizabeth Bilney, de t-shirt Leave.Eu, reconhece a ligação em L'argent trouble du brexit, do canal Arte.
Em fevereiro a empresa de Banks e a campanha Leave.Eu foram multados em 120 mil libras por violação de dados.
Numa conferência TED, em abril, a jornalista Cadwalladr afirmou que o Reino Unido é o "resultado do que acontece a uma democracia ocidental quando cem anos de leis eleitorais são abaladas pela tecnologia", para depois citar um relatório sobre desinformação e fake news da Câmara dos Comuns: "As nossas leis estão a ser infringidas, já não funcionam." Mas também associou Moscovo ao financiamento a Arron Banks, o que motivou oficialmente os advogados do milionário a processá-la. "Nem vou falar das mentiras de Arron Banks sobre a sua relação secreta com a Rússia".
As autoridades britânicas estão a investigar as relações de Banks. A comissão eleitoral pediu à National Crime Agency para investigá-lo, bem como a Elizabeth Bilney, por suspeitas de que Banks não seja a origem das contribuições políticas, e que "vários crimes podem ter sido cometidos". No Reino Unido é ilegal usar dinheiro de outros países em campanhas eleitorais.
Um seu antigo empregado, do site Westmonster, Steve Edginton, que se intitula jornalista e agora dirige as redes sociais do Partido do Brexit de Nigel Farage, escreveu no Mail on Sunday sobre os relatórios do embaixador britânico nos EUA, Kim Darroch, que criticavam a Casa Branca e Donald Trump. Da tremenda polémica, Trump lançou um ataque ao embaixador e este acabou por se demitir.
Noutra controvérisa ligada a Arron Banks, o Parlamento Europeu instaurou no início de junho uma ação contra Nigel Farage por este não ter declarado um presente de mais de 400 mil euros provenientes do empresário. Farage, intimado a comparecer perante um comité do Parlamento para clarificar a questão, uma vez que os eurodeputados têm de declarar todas as fontes de rendimento, recusou comparecer e classificou o comité de "tribunal canguru".