Em dezembro de 2018, no meio de uma crise dentro da coligação de governo e a ameaça de uma acusação por corrupção contra o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, o Knesset (Parlamento israelita) decidiu convocar eleições antecipadas para abril de 2019. Quase 17 meses, três eleições e um acordo com o seu rival depois, o líder do Likud deixa de ser interino e volta a tomar posse como chefe de governo esta quinta-feira. Dez dias depois, começa a ser julgado..O governo de união entre Netanyahu e o líder da Aliança Azul e Branca, Benny Gantz, surge para lidar com a crise de saúde causada pelo coronavírus e com crise económica que a pandemia possa trazer. Centra-se num acordo de partilha de poder: Netanyahu será primeiro-ministro nos primeiros 18 meses, prolongando o seu recorde como chefe do governo de Israel há mais anos no poder..No final dessa data, o seu rival tornado aliado, que entretanto ficará com a pasta da Defesa, assumirá o cargo de primeiro-ministro por igual período. No último ano de mandato haverá nova rotação de seis meses cada um, segundo o acordo que ambos assinaram a 20 de abril..Para trás ficam três eleições com resultados inconclusivos, que não permitiram nem a Netanyahu nem a Gantz chegar à maioria de 61 lugares necessária no Knesset..Na terceira eleição, no passado dia 2 de março, Netanyahu teve o melhor resultado de sempre para o Likud, mas ainda assim ficou aquém dessa maioria. Gantz reuniu os apoios suficientes para tentar formar governo, mas o facto de depender do voto dos partidos árabes foi aproveitado pela direita para pressionar para uma grande coligação. Pelo meio, rebentou a crise do coronavírus -- Israel já registou mais de 16 500 casos e 262 mortes, mas está a conter a epidemia..Para evitar a realização de umas quartas eleições, onde o Likud surgia novamente como favorito e iria beneficiar de uma oposição entretanto dividida, Gantz aceitou juntar-se ao governo de união liderado por Netanyahu, apesar de ser algo que tinha dito nunca fazer. "Israel antes de tudo", foi o lema da sua campanha e foi a frase que usou para justificar a sua decisão, indicando que a pandemia obrigada a tomadas de posição difíceis..Luz verde do Supremo.A tomada de posse de Netanyahu esta quinta-feira só é possível depois de o Supremo Tribunal ter decidido, por unanimidade dos seus 11 juízes, que alguém acusado de suborno, fraude e quebra de confiança pode ser convidado para formar governo. O julgamento do primeiro-ministro está marcado para ter início já a 24 de maio, sendo que este rejeita todas as acusações e fala numa tentativa de golpe..Um primeiro-ministro só tem que se demitir depois de ser condenado (e terem corrido todos os recursos), ao contrário de ministros ou presidentes de câmara cuja acusação é suficiente para levar à sua demissão. Desta vez, o tribunal tinha que decidir se, na prática, um deputado podia ser convidado para formar governo apesar das acusações..O Supremo Tribunal, alvo dos ataques da direita israelita que tem procurado fórmulas para reduzir o seu poder, concluiu que sim, numa unanimidade que alguns veem como uma forma de proteger a instituição. Um voto contra poderia levar a novas eleições e uma eventual maioria de Netanyahu, que poderia acabar com maior poder para avançar mais com os seus planos a nível judicial..Depois da decisão do Supremo, o presidente israelita, Reuven Rivlin, convidou formalmente Netanyahu a formar um governo de união com Gantz, contando no parlamento com o voto de 72 dos 120 deputados..Divisões.A aliança Azul e Branca fez campanha com a promessa de nunca apoiar Netanyahu, algo que explica as divisões que entretanto surgiram e que a deixaram limitada a apenas o Partido de Resiliência de Israel de Gantz. O Yesh Atid, de Yair Lapid, e o Telem, de Moshe Ya'alon (que perdeu dois deputados, que formam agora a fação Derekh Eretz), decidiram criar um bloco à parte. Juntos têm 16 deputados no Knesset..Mas também Netanyahu perdeu apoios dos aliados de longa data. O Yamina (extrema-direita e defensora do sionismo religioso) tem seis deputados. O líder do Likud é acusado de dar uma facada nas costas a Naftali Bennett (até agora ministro da Defesa), sendo este por sua vez acusado de só pensar em lugares no executivo e não em ideologia..No final, o governo de união conseguiu os 36 votos do Likud, os 15 da Azul e Branca, os dois da fação Derkh Eretz, os nove do Shas e os sete do Judaísmo Unido da Torá (dois tradicionais aliados de Netanyahu), dois dos três votos do Partido Trabalhista e o único do Gesher. Uma união que vai da esquerda à direita..A questão é quanto tempo vai durar e de que forma vai decorrer a transição de poder em 18 meses -- Lapid, ex-aliado de Gantz, já disse: "Eles chamam-lhe um governo de emergência quando a emergência já passou. Falam de união, mas não confiam um no outro." Isto porque a transição está cheia de regras e penalidades caso não sejam cumpridas..Para já, para poder agradar a todos os partidos, Netanyahu irá ter o maior executivo que Israel alguma vez viu serão pelo menos 36 ministros, segundo os jornais israelitas, com vários vice-ministros. Além de Gantz, que ficará com a Defesa, a Azul e Branca fica com outra pasta importante, a dos Negócios Estrangeiros. O ex-chefe das Forças Armadas Gabi Ashkenazi ficará com o cargo. Gantz, que depois das eleições tinha sido eleito presidente do Knesset, já renunciou a essa posição, que deverá agora ser ocupada por Yariv Levin, do Likud..Apesar dos problemas na justiça, Netanyahu tem também o controlo sobre a comissão que seleciona os novos juízes, o que lhe dá enorme influência sobre o poder judicial..Anexação à vista.Durante a campanha, Gantz mostrou-se aberto a uma anexação dos colonatos na Cisjordânia apenas no contexto do plano norte-americano, que estabelecia também a criação de um estado palestiniano. Mas o acordo que assinou dá ao líder do Likud luz verde para avançar com os seus planos já a partir de julho, não sendo ainda claro em que moldes -- simbólico, com a anexação de alguns colonatos mais próximos de Jerusalém e Telavive ou mais radical?.O plano dos EUA, apresentado pelo presidente Donald Trump em janeiro e rejeitado pelos palestinianos, prevê a anexação do vale do Jordão e dos colonatos israelitas na Cisjordânia, além da criação de um Estado palestiniano num território reduzido. O acordo de governo estipula que a anexação pode avançar com um voto no governo ou no Knesset..O secretário de Estado norte-americano, Mike Pompeo, depois de dois meses sem viajar por causa da pandemia de coronavírus, chegou esta quarta-feira a Jerusalém com uma máscara com a bandeira norte-americano. Esteve depois reunido com Netanyahu, Gantz e Ashkenazi.."A decisão [sobre a anexação] será tomada por Israel e venho ver o que o novo governo pensa do tema", disse Pompeo numa entrevista ao jornal Israel Hayom antes de chegar ao país..Coincidindo com a chegara, o exército israelita matou um adolescente palestiniano no sul da Cisjordânia. "Zaid Qaysia, de 15 anos, morreu após ser atingido a tiro na cabeça por soldados israelitas no campo de Al-Fawar", perto de Hebron, segundo as autoridades de saúde palestinianas. Outros quatro jovens ficaram feridos nos confrontos, que ocorrem um dia depois de um soldado israelita ser morto..Já em Israel, o foco de Pompeo foi para o Irão, inimigo tanto dos EUA como de Israel: "Até mesmo durante esta pandemia, os iranianos utilizam os recursos do regime para fomentar o terror em todo mundo, embora o povo iraniano esteja a sofrer enormemente. Isso diz muito sobre o espírito de quem comanda esse país."