Apoio para óculos. Crianças com mais de 10 anos obrigadas a passar por junta médica
As crianças com mais de 10 anos já não podem receber a bonificação por deficiência, um acréscimo ao abono de família que varia entre os 62 e os 121 euros mensais e que vinha a ser atribuído a crianças apenas por usarem óculos e até em casos de pele atópica. Desde outubro, os pais podem solicitar outro tipo de apoio - a Prestação Social para a Inclusão - que, no entanto, só será concedido através da apresentação de um atestado médico de incapacidade multiuso.
A criança terá de ser observada por uma junta médica e só recebe ajuda do Estado se o documento certificar um grau de incapacidade igual ou superior a 60%. O valor do apoio a receber até pode ser maior - a prestação mínima é de 136,70 € - mas também será muito mais difícil de obter.
As alterações às condições de atribuição dos apoios por deficiência foram introduzidas há um mês e estabelecem que a bonificação por deficiência é atribuída apenas a "crianças e a jovens com deficiência, com idade inferior a 24 anos e que em 30 de setembro de 2019 eram titulares de bonificação por deficiência e a crianças com idade até 10 anos que requeiram a bonificação por deficiência a partir de 1 de outubro de 2019", lê-se no site da Segurança Social.
Um apoio que é atribuído quando "por motivo de perda ou anomalia congénita ou adquirida, de estrutura ou função psicológica, intelectual, fisiológica ou anatómica, a criança ou jovem necessite de apoio pedagógico ou terapêutico".
Também de acordo com a informação prestada no site, quem já tinha direito ao apoio (mesmo maiores de 10 anos) não o irá perder. As novas regras só se aplicam a novos pedidos. O valor mensal começa nos 136,70 €, um valor que pode ser acrescido de 35% "nas situações em que a pessoa com deficiência se encontre inserida num agregado familiar monoparental".
De acordo com a Segurança Social, esta alteração já estava planeada "desde o desenho inicial da Prestação Social para a Inclusão", divulgado em 2016, e "tem por base uma reformulação das prestações sociais na área das pessoas com deficiência que passa pela simplificação da matriz de prestações sociais e integração na Prestação Social para a Inclusão (PSI)", esclarece o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social (MTSSS), em resposta ao DN.
O ministério nega que esta seja uma medida de resposta à avalancha de pedidos que este verão inundaram os serviços da Segurança Social depois de nas redes sociais- principalmente em grupos de pais - ter circulado a notícia de que existiam crianças a receber o apoio apenas porque usavam óculos. A polémica levou a Sociedade Portuguesa de Oftalmologia (SPO) a tomar uma posição sobre o assunto em que disse aos especialistas para que recusassem atestar a deficiência se tal não se verificasse.
A SPO relembrava ainda os preceitos técnicos do inventário de conceções de deficiência e a classificação internacional de funcionalidade, para apelar aos médicos oftalmologistas que não se escondam atrás de um documento para "simplesmente agradar aos pais".
Ainda em julho, o Instituto da Segurança Social admitiu ter registado "um acréscimo localizado" destes requerimentos e que estaria "a averiguar as causas deste aumento", para identificar medidas que venham a ser necessárias aplicar.
A alteração nas condições de atribuição do apoio com data do início do mês ainda não é a resposta, tanto é que quem tinha direito à bonificação por deficiência até 1 de outubro - em setembro de 2019, o número de beneficiários da bonificação por deficiência era de 104 635 crianças e jovens (dados do MTSSS) - continua a receber o apoio
"As bonificações por deficiência já atribuídas estão protegidas por uma medida de salvaguarda que assegura a manutenção das regras que vigoravam antes da mudança para as crianças e jovens que eram titulares a 30 de setembro de 2019", esclarece o ministério, que, no entanto, ressalva que quem recebe a bonificação "terá de proceder à entrega regular da prova de deficiência para verificação da manutenção das condições de elegibilidade, sempre que a deficiência não seja permanente". No entanto, o uso de óculos pode ser considerado uma incapacidade permanente. Como será feita esta distinção, é algo que ainda está decidido.
"O Decreto-Lei n.º 136/2019, de 6 de setembro, prevê uma portaria conjunta dos Ministérios da Saúde e do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social que define os critérios a ter em conta na prova de deficiência e que está a ser ultimada", esclarece ainda o MTSS.
O que é a Prestação Social para a Inclusão?
É uma prestação mensal que é atribuída a cidadãos nacionais e estrangeiros, refugiados e apátridas que tenham uma deficiência da qual resulte um grau de incapacidade igual ou superior a 60%. É constituída por três componentes: a componente base, o complemento e a majoração. O valor mínimo atribuído é de 136,70 euros.
De acordo com a legislação, que pode ser consultada no site da SS, e tal como esclarece o MTSS na resposta ao DN, "a condição de acesso à Prestação Social para a Inclusão, e que é aliás comum à generalidade dos apoios à deficiência, na saúde, na educação, nos benefícios fiscais, nos transportes, etc., exige um atestado médico de incapacidade multiuso que certifique um grau de incapacidade igual ou superior a 60%".
Cidadãos nacionais e estrangeiros, refugiados e apátridas que tenham uma deficiência da qual resulte um grau de incapacidade igual ou superior a 60%.
E o atestado médico de incapacidade multiuso?
Serve para comprovar a incapacidade para o trabalho, mas também para aceder a benefícios específicos para essa situação. Para atribuição dos benefícios sociais e fiscais é necessário que tenha um grau de incapacidade igual ou superior a 60%, comprovado com atestado médico de incapacidade multiuso.
Para requerer o atestado médico de incapacidade multiuso é preciso dirigir-se ao centro de saúde da área de residência e requerer ao delegado de saúde uma junta médica para avaliação de incapacidade.