Quando os alunos a turma de Humanidades do 12.º ano do Colégio do Sagrado Coração de Maria, em Lisboa, entram para a aula de Ciência Política já sabem que o tema em cima da mesa é a corrupção. Neste momento, estão a preparar vários trabalhos de grupo, que irão terminar até ao final do presente período e que vão desde uma análise aos processos do BES e de José Sócrates, a entrevistas de rua em vídeo a populares sobre o que pensam da corrupção, a conversas com especialistas no assunto e até um mapa-mundo onde selecionaram vários países e os casos que assolam esses países..O Colégio do Sagrado Coração de Maria foi a escola-piloto do programa RedEscolas AntiCorrupção, uma iniciativa da Associação All4Integrity, que neste ano letivo já conta com a participação de 17 escolas (10 privadas e 7 públicas), num total de 1350 alunos envolvidos, e de áreas que vão desde Lisboa a Évora, passando pela Madeira Macau. "A experiência que tenho dos alunos do Sagrado, pioneiros na realização de projetos sobre estes temas mesmo antes do programa RedEscolas AntiCorrupção existir é a de uma dupla visão - a de choque, por desconhecerem por completo a realidade da corrupção em Portugal, e a de um conhecimento muito aprofundado sobre muitos casos de corrupção, no âmbito nacional e internacional", conta ao DN Ângela Malheiro, vice-presidente da All4Integrity e responsável pela RedEscolas AntiCorrupção..Para os alunos do 12.º anos desta escola, a ideia que tinham de corrupção antes de começarem a fazer os seus trabalhos mudou. "É a falta de transparência, o uso ilegítimo do poder, em benefício próprio, o uso do poder público para interesses privados", diz Marta Calheiros Gama, de 17 anos, aluna do 12.º ano de Humanidades. "Eu concordo com a Marta, mas acho que não se aplica só ao poder público. Em Portugal há, infelizmente, corrupção em diversos setores e, no fundo, sempre olhei para a corrupção como um bocadinho derivada da ganância das pessoas. Os grandes casos de corrupção estão ligados a pessoas de grande poder e parece que as pessoas não estão completamente felizes com o que têm e querem sempre mais e arranjar formas de contornar a lei. Acho que devemos procurar ter mecanismos de fiscalização melhores e que impeçam isso", acrescenta Catarina Casaca, de 16 anos, também aluna do 12.º ano de Humanidades..O mesmo acontece com os alunos do 11.º ano, que também têm trabalhado neste tema, contribuindo com trabalhos para a exposição patente no Colégio do Sagrado Coração de Maria a propósito do Dia Internacional contra a Corrupção, que se assinala esta quinta-feira. "A ideia que eu tenho agora é mais ou menos a que tinha antes, simplesmente abri mais os olhos para este tema em Portugal, porque no nosso país temos um grande problema de corrupção e temos vários fundos desviados para a corrupção e que representam uma grande fatia do nosso PIB", afirma António Pinto Bastos, de 16 anos, aluno do 11.º ano de Economia. "Percebo que a ideia que tinham anteriormente não estava errada, mas sei definir melhor o termo em si e perceber o problema que há em Portugal. Em Portugal temos mais a noção de que é um problema, mas não atuamos como devíamos em relação ao assunto", prossegue Luís Lopes da Costa, de 16 anos, aluno do 11.º ano de Humanidades..Quanto às áreas onde existem mais corrupção no nosso país, as opiniões são variadas. "Eu diria que, claramente a política, pois temos vários políticos que se aproveitam do seu poder e do cargo que têm para depois tirarem vantagem, seja vantagem financeira para eles mesmos ou vantagem política para os seus partidos", defende António, com Luís a partilhar da sua visão. "Na área dos bancos, por exemplo. Na política também, há sempre o amigo do amigo do amigo", garante Marta. "Em Portugal, há muita corrupção no futebol, como está constantemente a aparecer nas notícias. Também no sistema financeiro e, infelizmente, no nosso sistema judicial, o que leva a que as pessoas não deem tanta credibilidade ao sistema judicial, mas também por causa do tempo que levam a finalizar os casos de corrupção", diz Catarina..A ideia que têm agora do país é agora diferente, defendendo que é preciso mais meios para combater o problema. "Portugal não é o país com mais casos de corrupção, mas está longe de ser o país com menos casos. Os meios de combate devem ser bastante melhorados, sendo que existem muitos casos que são deixados de parte, prescrevem, o que acaba por promover a corrupção", defende Catarina. "Temos ainda um longo caminho a percorrer, o que passa por termos mecanismos de fiscalização mais eficazes e um sistema judicial que procure dar resposta a estes casos de uma forma mais eficiente", completa Catarina..O facto de agora conhecerem esta realidade deu a estes alunos um encorajamento para ser mais participativos na sociedade. "Acho que nos encoraja a combater a corrupção, porque temos o exemplo de pessoas que perderam bastante dinheiro por vias da corrupção de pessoas que abusaram do seu poder, veja-se os casos de Ricardo Salgado e João Rendeiro", refere António. "A corrupção é uma questão de desrespeito para com a população. É algo muito importante, com a qual devemos preocupar-nos e, ao saber que as pessoas estão indignadas e a serem até roubadas, dá-me vontade de poder fazer alguma coisa para prevenir esta situação", conclui Luís..ana.meireles@dn.pt