"The One é uma série de puro entretenimento, mas põem-nos a pensar sobre o próprio confinamento, em que fomos confrontados pelas nossas próprias escolhas, e esta história confronta as personagens com as suas escolhas de vida. Perante o gatilho do teste do ADN que nos deixa perceber quem é o nosso par perfeito, fica a dúvida de como reagir. Uma série que é um bom fresco com vários plots em que é possível ir acompanhando os danos colaterais deste acontecimento." É assim que Albano Jerónimo, um dos atores protagonistas de The One, descreve esta grande produção britânica, um original Netflix criado por Howard Overman a partir do romance de ficção científica de John Marrs, disponível na sexta-feira no serviço de streaming..YouTubeyoutubeyGgbNCkJqSM.Depois de Nuno Lopes em White Lines, saga sobre um misterioso homicídio nos loucos anos do boom da cena de dança eletrónica em Ibiza, e de Alba Baptista impressionar na série juvenil Warrior Nun, agora é a vez de Albano Jerónimo ser um dos rostos de uma série de impacto global com o selo Netflix. Uma viagem até uma Londres contemporânea onde uma empresa lucra milhões depois de descobrir uma fórmula em que podemos conhecer o nosso par ideal através de um teste de ADN com um único fio de cabelo. Uma revolução nas relações de milhões de pessoas e uma subida exponencial de divórcios pelo fundo fora. O comportamento humano pura e simplesmente muda com a descoberta desta fórmula de amor perfeito e científico..Albano interpreta o emparelhado da ambígua CEO da empresa The One, site que criou esta descoberta milagrosa da comparação do ADN. Apesar de ambos se amarem sem restrições, um segredo do passado impede que esta união possa ser pública. Além de Albano, que interpreta um surfista português desterrado em Espanha, Miguel Amorim, é o seu irmão com problemas de toxicodependência..The One, tal como White Lines, tem uma fórmula de realização que privilegia curvas e reviravoltas narrativas sustentadas num mistério anunciado. Tudo isso é feito com uma espécie de engrenagem de fórmula, e muitas vezes irrita, mas é também executado com uma destreza dramática assinalável, perfeita para obrigar o espectador à experiência do binge watching, ou seja, ver todos os episódios em modo de maratona. E é extremamente gratificante ver o talento de Miguel Amorim e, sobretudo, o de Albano Jerónimo, capaz de dar à personagem uma camada de tristeza mais subtil do que se poderia pensar. Um feito portentoso de um ator que após Vikings volta a ter uma exposição internacional já a ter efeitos imediatos, conforme conta nesta entrevista..Mesmo contando com a participação na série Vikings, sente que este é o seu primeiro grande momento de montra internacional? The One é o game changer da sua carreira lá fora? O que eu vou fazendo, acredito, é uma extensão do meu trabalho em Portugal, mas obviamente este é um ponto importante. Seja como for, se houve uma viragem, foi em A Herdade. Tratou-se de um filme que me deu uma perspetiva não só profissional. Bateu-me a nível pessoal e mesmo de forma íntima, como que um daqueles momentos espécie de resumo da matéria dada. O que vem a partir de agora não sei. Sei que até aqui tenho um percurso feito através do teatro e com algumas exposições aqui e acolá em telenovela e cinema. Mas volto a dizer, The One é um ponto importante, acima de Vikings. Posso até dizer que com esta série fui desembocar numa outra série de uma outra plataforma que ainda não posso revelar - vai levar-me nesta semana para o Uruguai durante seis meses. Uma série realizada por um cineasta com o qual sonho trabalhar desde miúdo..Será protagonista? Sim, serei o protagonista. Curiosamente, os responsáveis desta série viram A Herdade no Festival de Veneza e ficaram comigo debaixo de olho. Desde agosto que ando a fazer castings para esta série..A sério?! Quantos? Sete. Só há um mês é que decidiram que seria eu. Tudo isto é uma avalanche....E muda toda a sua vida... Muda tudo. Desde projetos que tinha em Portugal à minha vida pessoal... Serão seis meses da minha vida que passam pela América do Sul..Há pouco falou que A Herdade lhe abalou o íntimo, mas isso é quando as coisas valem a pena. E quando é ao contrário, quando não são projetos com qualidade? À medida que vou ficando mais velho percebo que esta profissão só faz sentido quando sou abalado. Abraço os projetos com uma condição: parte de mim vai ficar ali. Tem muitíssimo a ver com a confiança que estabeleces com o teu realizador, com o teu diretor de fotografia, com o argumento e com os colegas... Quando as coisas não têm qualidade, é um risco, claro. Mas às vezes pode correr mal, claro... Nesses casos, penso na minha origem: vim de um meio muito pobre, fui criado em Alhandra numa família com três irmãos e os pais não tinham os melhores empregos. Cresci com uma escassez latente. Desde miúdo que fui obrigado a transformar as dificuldades em pontos a favor, a ponto de hoje acreditar que as minhas dificuldades são a minha mais-valia. Mesmo quando tenho de fazer um projeto com o qual não me identifico, por necessidades financeiras - há que pagar escolas... -, tento sempre reinventar-me a partir do dia-a-dia, pois não sei o que vai ser amanhã. Às vezes, o meu dia pode ser num estúdio de televisão a fazer uma novela, noutras vezes num palco ou então num plateau. Mas para a semana estou numa superprodução com pessoas que admirava em puto, eu, vindo de uma família pobre de um subúrbio de Lisboa. Há muito trabalho, trabalho e trabalho, apesar de também alguma sorte..O Albano já encenou peças de teatro. Sente que esse desejo de dirigir também pode ser extensível ao cinema? Adorava... Sinto que seria uma extensão natural e orgânica. Tenho no horizonte realizar, aliás, estou, na verdade, já a fazer isso. Estou nas filmagens de um documentário, coisa íntima que envolve a minha mãe, um pouco essa ideia de Telémaco a registar a sua mãe Penélope numa espera latente; o que fica, o que não fica do passado... Já ando a filmar a minha mãe há muitos anos, mas não como o capricho "um dia vou realizar"... Não, tudo passa por uma consequência de uma inquietação, de uma urgência. E isso está mesmo a crescer. Vamos ver quando terá condições para ser encaixado numa montra..Houve quase um estardalhaço nacional com sua brincadeira no ano passado no Corpodormente, do Instagram, de Bruno Nogueira. Ficou surpreendido consigo próprio? Depois de A Herdade decidi não pensar muito em levar-me a sério. É preciso perceber que sou amigo do Bruno há muitos anos e, de repente, ele abriu esta janela de comunicação informal na qual se estabelece um jogo da verdade e da mentira. Aquilo somos nós ou não? É um jogo que adoro e que foi crescendo. Para mim é sempre importante não me levar a sério. O perigo de quem se leva a sério é que se cristaliza, torna-se rapidamente um fóssil. Não quero ficar um dinossauro, quero ter sempre espaço para me surpreender..E aí temos o exemplo dos vídeos que se tornaram virais de Anthony Hopkins a dançar de forma surreal... Adoro! É um bom exemplo, que desconstrução tão humana, tão simples... Está ali um homem! Só tem mais visibilidade porque é um ator....O que sente da atual ficção nacional televisiva? Esteve em algumas telenovelas e são muitos os que pensam que estão de novo mais popularuchas, mas há outra fação que reclama um salto qualitativo... Sinto que estamos tecnicamente mais educados, mas as histórias vão sempre tocar os pontos mais expectáveis: os ricos, os pobres e o núcleo cómico. O formato da novela foi melhorando e tem vindo a ser otimizado, mas não podemos colocar isto ao nível da rede Globo. Estamos ainda a falar da noite e do dia, não só pela qualidade inerente como também pelos orçamentos - qualquer novela deles, o episódio de estreia tem logo um orçamento acima de um milhão!.Mas nas séries, porque não aparecem mais Saras, obra de Marco Martins da qual fez parte? Ah, pois... Deu-me muito prazer ter estado envolvido aí, um marco do Marco. Mas não sei responder, embora seja salutar que tenha aparecido muita gente nova a realizar com novas formas e ideias. Lembro-me do trabalho do André Santos e do Marco Leão na Lua Vermelha e fixei também Até Que a Vida Nos Separe, do Manuel Pureza, em que estou também envolvido. Creio que se vai conseguindo vislumbrar uma outra planície e um trabalho que pode ir para um caminho mais interessante. O importante é a matéria-prima, e isso está lá!.Mas esta vaga dos atores portugueses a conquistarem o showbiz internacional é algo muito forte, muito bonito, não é? Diria que é maravilhoso. Quando o White Lines saiu disse ao Nuno Lopes que o sucesso dele era o meu... Que tudo o que está a acontecer à Joana Ribeiro, à Alba Baptista, ao Carloto Cotta, ao Pêpê Rapazote e a tantos outros sirva como um ensemble!.E já perdeu algum papel para algum deles lá fora ou mesmo aqui? Já me aconteceu. Acredito que as coisas acontecem por alguma razão.