Adeus Calais, adeus Selva

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Hoje foi o meu último dia em Calais e o meu último dia na Selva que já não existe. Estive durante a manhã a fotografar a partida das últimas pessoas que estavam nos contentores no campo, os adolescentes que ainda não tinham sido enviados para outros campos em França. Alguns pensam que vão para Inglaterra, mas para poderem entrar lá pode demorar semanas ou mesmo meses. Mesmo assim, alguns cantam para quatro ou cinco voluntários que estão lá para se despedir deles. É triste ver estes jovens, alguns entre os 12 e os 19 anos, partir sem saberem para onde vão ou se vão para Inglaterra. Estive aqui 21 dias. Foram dias extraordinários, convivi com muitos migrantes e voluntários, vivi dias muito felizes... nunca imaginei que estar com pessoas de outros lados e culturas nestas condições fosse tão dignificante para mim. Comer com eles, rir com eles e ouvir as suas histórias foi muito bom, são pessoas como eu, que nos fazem rir e estão sempre alegres. Um dos migrantes que conheci tinha partido uma perna numa das tentativas de entrar num camião para ir para Inglaterra. Bem-disposto, sempre que me via começava a gritar "Madeira, Madeira". Aliás, quando me apresentava dizia que era de Portugal e a primeira coisa que eles diziam era Cristiano Ronaldo. Este até sabia que ele era da Madeira. Todos os dias conhecia novos migrantes e ser português era uma vantagem, porque o trabalho feito aqui por voluntários nacionais deixou grandes marcas na Selva - éramos vistos como amigos e eles sempre que podiam convidavam-nos para os seus abrigos e beber chá, café ou mesmo almoçar. Comi muitas coisas diferentes, mas algumas eram muito parecidas com as nossas, como os sonhos de Natal. Tenho a agradecer a um monte de pessoas que me receberam de braços abertos, mesmo sem me conhecerem, mas que depois de lhes ter mostrado o que estava a fazer todas elas me veem com outros olhos e isso contou muito na minha estada aqui.

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