Não é de agora que o Centro Social e Paroquial dos Pousos realiza sonhos, mas passou a fazê-lo de forma "oficial" desde junho passado. O mote foi dado por uma idosa que manifestou o desejo de ir a Roma ver o Papa. O Centro escreveu a Francisco, sem nunca imaginar que o líder da Igreja Católica responderia. Mas aconteceu. E quando se anunciava o verão, um grupo de idosos e funcionárias viajou de avião (alguns pela primeira vez) até ao Vaticano, onde foi recebido pelo Papa Francisco.."Sair do país pela primeira vez, ser alojado pela primeira vez num hotel - incluindo funcionárias que nos acompanharam - foi uma grande aventura", conta Alexandra Neves, provedora da Academia dos Sonhos, ao DN. Foi nessa altura que percebeu o quanto era importante estender o projeto para além dos idosos. "Eles são o foco - até por causa da finitude - mas isto está aberto a outros pilares, menos prioritários mas aos quais daremos atenção", enfatiza..Foi assim que, no início do outono, colocou à entrada do Centro uma espécie de árvore dos desejos, um espaço próprio para depositar as mensagens, em forma de sonho, destinada a colaboradoras do Lar, crianças de famílias desfavorecidas e não só: "Também pessoas da comunidade que nos sinalizem alguma situação especial e que possamos ter capacidade para realizar." E então apareceu Rebeca, uma cantora brasileira radicada em Portugal que, devido a um cancro incurável, é acompanhada pela equipa da Unidade de Cuidados Paliativos do Hospital de Leiria. "Quem a descobriu foi o projeto "Aqui Contigo", da SAMP, e o sonho dela era voltar a cantar num palco. Na verdade, não foi só isso. Cantou num palco numa sexta-feira de novembro e na segunda-feira seguinte foi a um programa de televisão. "Tratámos de tudo e ainda lhe fizemos a surpresa de levar a família", conta Alexandra Neves..Outro sonho realizado foi o de Ilda, que em idade avançada nunca tinha posto o pé na areia nem tomado um banho de mar. "Ela queria muito vestir um fato de banho e entrar no mar. Então, como está em cadeira de rodas, levámo-la à praia do Osso da Baleia - que é aquela que tem melhores condições de acessibilidade da nossa região", conta a Provedora. "Chamámos também os netos, porque achámos que era mesmo especial, para ela ter essa ligação com a família.".O projeto consolidou-se. "Pensámos formar uma coisa a sério, com um regulamento e uma marca registada. Funciona em forma de ecossistema: a parte das pessoas que desejam, da instituição que os realiza e das empresas/instituições que nos apoiam em termos financeiros e que acabam por entrar na envolvência do próprio sonho", explica Alexandra Neves..Entre junho e dezembro, a Academia realizou estes três sonhos. A lista começa agora a engrossar. Cada pessoa responde à frase "Antes de morrer eu quero", da autoria da americana Candy Chang. Depois, o grupo de quatro pessoas que compõe a Academia seleciona, consoante a situação especial dessa pessoa e a capacidade do Centro para o realizar. Parece tudo exequível nas respostas? Não. Mas a maioria sim..Alexandra Neves salienta que muitos deles são até "coisas simples", como o caso de Ilda, que queria apenas tomar um banho de mar. Mas há outros, que envolvem custos financeiros mais avultados. Como é que o Centro, que é uma IPSS sempre a braços com dificuldades, como as outras, o consegue? "A instituição tem várias dinâmicas de angariação de fundos. Uma delas surgiu recentemente: é a Aldeia de Natal, onde estivemos presentes todos os dias possíveis, desde fins de semana e feriados, com alguns produtos que acabaram por conferir alguma tradição e histórico de sucesso.".Alexandra refere-se ao vinho quente, cuja receita anda a ser apurada pelo Centro há anos, para se assemelhar o mais possível à dos países nórdicos e centro da Europa nos mercados de natal. "Quem o bebe diz mesmo que é melhor do que nalguns desses países", conta, orgulhosa, ao cabo de mais uma edição da iniciativa que terminou no passado fim de semana. "Fazemos isto ao vivo, numa carroça, junto à nossa barraquinha da Aldeia de Natal, onde há vários tipos de brigadeiros, as melhores filhoses dos Pousos e tudo o que é artesanato feito pelos nossos idosos", conta a responsável, que investe muito na criatividade da decoração. É assim, desse bolo, que resulta a tal angariação de fundos.."Gostávamos muito de pegar em dois ou três que possamos realizar das nossas colaboradoras", explica Alexandra Neves, empenhada em mobilizar a sociedade civil de Leiria, ao abrigo do tal regulamento no qual há o objetivo de "envolver estes investidores". "Para além do que vendemos nas instituições e nos eventos, as empresas estão a começar a entrar como nossas realizadoras de sonhos.".E essas têm vários cenários: um donativo (uma vez por ano), o patrocínio de um determinado sonho - que pode ser de forma financeira ou outra, através de meios ou dos trabalhadores ou outros recursos. "Qualquer empresa, mesmo que seja micro, pode envolver-se na realização dos sonhos", sublinha Alexandra Neves. Aponta o exemplo de uma empresa de Fátima que "associou-se através do transporte e já garantiu voltar a disponibilizar os mesmos meios sempre que for necessário"..Voltando à lista, seguem-se agora vários sonhos das funcionárias e dos idosos do apoio domiciliário. Em breve, a Academia dos Sonhos vai realizar o desejo de uma idosa "que quer muito ir à televisão conhecer o João Baião". Entretanto, está na calha um protocolo com a Unidade de Cuidados Paliativos. Alexandra Neves é o rosto visível da Academia, que é composta por quatro pessoas: uma da direção do Centro, o pároco (porque se trata de um centro paroquial) e as duas voluntárias, ela e a colega Filomena. Juntos, cumprem também eles um sonho..dnot@dn.pt