Abaixo-assinado: professores exigem todo o tempo de serviço ou vão para a luta
As negociações vão ser retomadas, mas nem assim as nuvens de contestação que pairam sobre as escolas se desanuviaram. Bem pelo contrário, tendo em conta as palavras recentes de professores e Governo, que parecem condenados a não se entenderem sobre a devolução do tempo de serviço.
Depois de Mário Centeno ter pedido na quarta-feira, em entrevista à RTP, "estímulos dos dois lados para equacionar situações diferentes", ao mesmo tempo que voltava a avisar que "não podemos dar passos maiores do que a perna e não podemos pôr em causa o futuro", o Expresso noticia este sábado que o Governo afasta a hipótese de devolver todo o tempo de serviço congelado reivindicado pelos sindicatos e que pode até deixar ficar tudo como está agora, caso não veja abertura negocial por parte dos professores. Mas do outro lado, o mesmo aviso por parte dos professores, que, nas palavras do secretário-geral da Federação Nacional da Educação, esperam "que o Governo venha para este novo período negocial também com espírito aberto e empenhado para se alcançar a concertação".
Um diálogo que parece, assim, ameaçado ainda antes de começar, até porque o semanário cita uma fonte próxima do primeiro-ministro que alerta que "se os sindicatos não flexibilizarem posições e não avançarem para propostas razoáveis, nada feito".
A questão é que os sindicatos são muito claros no abaixo-assinado que levaram esta semana a António Costa e que puseram a circular na internet esta sexta-feira: "Os professores e educadores rejeitam ser discriminados e exigem a recuperação de todo o tempo de serviço cumprido". No texto do documento, os sindicatos afastam qualquer hipótese de terem "um tratamento diferente do que é dado à generalidade dos trabalhadores da Administração Pública e aos seus colegas das Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores", e fazem quatro exigências ao governo:
- "Tratamento justo e respeito pela sua vida profissional";
- A recuperação total do tempo de serviço cumprido nos períodos de congelamento, os 9 anos, 4 meses e 2 dias;
- A adoção de um faseamento, com produção de efeitos em 1 de janeiro de 2019, semelhante ao que já vigora na Região Autónoma da Madeira;
- A possibilidade de, por opção do docente, o tempo a recuperar ser considerado para efeitos de aposentação.
Os professores entendem que os seus argumentos saíram reforçados com a posição da Assembleia da República, que manteve no Orçamento do Estado para 2019 a norma que limita a negociação ao modo e ao prazo da recuperação, pelos pareceres das Assembleias Regionais da Madeira e dos Açores e pelo veto de Marcelo Rebelo de Sousa ao decreto-lei do Governo, que devolvia apenas dois anos, nove meses e 18 dias de tempo de serviço. E o aviso final dos sindicatos é muito explícito, e é ele que adensa as nuvens negras de luta no setor - "Caso o Governo insista em manter a discriminação, os professores e educadores comprometem-se a lutar, com convicção e determinação, pelo que é seu: o tempo de serviço que cumpriram".
Há cerca de duas semanas, no final de uma reunião onde as partes trocaram acusações de intransigência, o governo anunciou que ia mesmo avançar com o decreto-lei que aprovou em outubro para devolver dois anos, nove meses e 18 dias de tempo de serviço dos professores que esteve congelado, menos de um terço do que era exigido pelos sindicatos. Mas no final do ano, o presidente da República vetou o diploma, argumentando - tal como os sindicatos já tinham defendido - que o executivo está obrigado a voltar à mesa das negociações porque é isso que está consignado no Orçamento do Estado para 2019.
As dez estruturas sindicais presentes na reunião de dezembro com os secretários de Estado da Educação e das Finanças levaram uma condição para aceitar o decreto-lei do Governo: que fosse acrescentado um novo artigo, para que o tempo remanescente - ou seja, os cerca de seis anos e meio que não seriam contados agora - fosse alvo de uma negociação no início da próxima legislatura.
O acordo alcançado entre professores e o governo regional da Madeira prevê a devolução de todo o tempo congelado já a partir do próximo ano, a um ritmo de 1,5 anos de tempo de serviço em cada ano civil, até 2025. Os sindicatos do continente, que inicialmente queriam ver todo o tempo recuperado até ao final da próxima legislatura, até final de 2023, admitem agora que o processo se prolongue e querem que o Governo permita, nos casos em que seja mais favorável aos docentes, converter algum desse tempo congelado em tempo para a aposentação.
Os sindicatos já ameaçaram avançar com protestos que podem bloquear o ano letivo caso o Governo não devolva o tempo integral de serviço congelado aos professores. Questão que pode mesmo acabar no Constitucional, já que a reposição salarial dos professores poder vir a ter três regimes diferentes consoante as regiões do país.