A notícia foi recebida com apreensão pelos clientes de A Vida Portuguesa. A icónica loja do Chiado vai fechar, ao fim de 18 anos. O espaço que ocupa passará a funcionar como extensão de um Alojamento Local de luxo, sito no número 11 da Rua Anchieta.."É com imensa tristeza que A Vida Portuguesa anuncia que este será o último Natal em que vai receber os seus clientes na loja da Rua Anchieta 11, no Chiado. Foi a nossa primeira loja, na qual entrámos em 2006. Quisemos provar que era possível fazer uma loja de espírito contemporâneo, preservando escrupulosamente um espaço antigo que encontrámos abandonado", pode ler-se no comunicado publicado na conta de Instagram da marca..Na mesma rede social, a Vida Portuguesa interroga-se: "Queremos as mesmas marcas e as mesmas lojas em todas as ruas de todas as cidades do mundo, até vivermos todos em cidades iguais ou numa mesma cidade global?".E lamenta: "São os males de um turismo que procura apenas o lucro individual e só consegue tropeçar no curto prazo, sem querer entender as transformações que opera na cidade a médio e longo prazos, e assumir as suas responsabilidades numa estratégia mais vasta e melhor pensada, para todos.".Em entrevista ao DN, Catarina Portas diz que, "mais do que falar sobre a Vida Portuguesa ou "chorar sobre o leite derramado", gostava de usar este momento para apelar a uma reflexão sobre o comércio nas cidades. Em Lisboa, neste momento, é um setor totalmente desregulado, não tendo a Câmara Municipal de Lisboa (CML) ou as juntas qualquer instrumento para uma regulação mais eficaz, que poderia ajudar a resolver alguns dos problemas". E desenvolve: "Existem estratégias para isso, algumas já aplicadas noutras capitais estrangeiras. A revogação do licenciamento zero parece-me urgente, tal como a criação de uma bolsa de espaços comerciais pela CML para arrendamento a preços bonificados, a fim de reequilibrar a oferta comercial em certas zonas. E a intervenção das entidades competentes no caso da proliferação das falsas lojas de souvenirs e esquemas de emigração". "Não diabolizamos o turismo, ou o Alojamento local, ou a hotelaria, mas condenamos a falta de visão a médio e longo prazo de vários dos seus principais atores. Uma cidade feliz é aquela que consegue equilibrar as várias valências sem cair numa cidade monotemática", diz..O balanço que Catarina Portas faz do percurso da Vida Portuguesa é "muitíssimo recompensador". A loja foi criada para demonstrar aos portugueses que os produtos nacionais são tão bons como os estrangeiros. "Penso que demos um contributo importante para essa mudança de visão. Temos uma clientela fiel e diversificada que nos orgulha. E uma comunidade de fornecedores, sejam eles industriais ou artesanais, com quem mantemos uma relação franca e próxima. Também somos visitados por muitos lojistas internacionais que, nas nossas lojas, descobrem a excelência dos produtos portugueses e se tornam clientes dos nossos fornecedores, o que nos alegra e só confirma a nossa ideia inicial", explica Catarina Portas, precursora da valorização do que é português.."Quando reparei que muitas marcas e produtos estavam a desaparecer do mercado, ocorreu-me que, tal como eu, mais gente haveria com gosto por esses produtos - que necessitavam de ser valorizados. Foi o que fizemos o melhor que soubemos a partir de uma primeira loja, a da Rua Anchieta, e, mais tarde, expandindo para outras quatro, duas delas fechadas devido à pandemia", acrescenta a mesma responsável, revelando que atualmente têm mais de 400 fornecedores e vendem cerca de 6000 referências. "Temos uma relação próxima com os nossos fornecedores, ajudando-nos mutuamente. A construção desse sentido de comunidade é importante para nós"..A Vida Portuguesa serve de inspiração a muitas lojas, tanto em Portugal como no estrangeiro e isso "é um sinal positivo". "Fazemos aquilo em que acreditamos, sem ceder a facilitismos ou propostas megalómanas, trilhando o nosso caminho, sempre independentes.".A Vida Portuguesa vai continuar nas lojas no Time Out Market do Mercado da Ribeira, no Largo do Intendente e no projeto Depozito, na Rua Nova do Desterro. "Além disso, esperamos durante o próximo ano voltar a abrir na zona do Chiado e também no Porto", revela a sua mentora.