Restaurada já no séc. XXI, a igreja de Santa Clara é um magnífico exemplar do barroco português. A igreja sobreviveu às invasões francesas, à guerra civil e ao antagonismo ao barroco veiculado por liberais e republicanos. Foi um convento feminino, instituído em 1318 e extinto no século XIX. Do antigo convento, resta a magnífica Igreja de Santa Clara, em estilo gótico, e parte do edifício conventual, reedificada parcialmente no século XVIII..Novamente aberta ao público, desde 2021 e após uma clausura forçada em 2016, quando a necessidade de intervenção era já imperiosa, a Igreja de Santa Clara deixa agora admirar o seu espólio, restaurado de forma exemplar por uma equipa multidisciplinar..As obras orçadas em cerca de 2,5 milhões de euros tiveram como alvo o sistema construtivo e estrutural do edifício, a remodelação das infraestruturas elétricas, de telecomunicações e de segurança, a redução de barreiras arquitetónicas e a criação de condições de visita..Como celebração deste valor, teve lugar o lançamento de Património Musical de Santa Clara do Porto, de Elisa Lessa, Vítor Teixeira, Magna Ferreira, Rui Bessa, António Jorge Marques e Nuno Mimoso, no dia passado dia 21..A apresentação esteve a cargo do musicólogo Rui Vieira Nery, professor da Universidade Nova de Lisboa e atual diretor do Programa Gulbenkian de Língua e Cultura Portuguesas. A sessão, conduzida pelo mestre capela e organista Nuno Mimoso, contou com a intervenção da diretora regional de cultura do Norte, Laura Castro, e com a apresentação de trechos organísticos e vocais, com a participação da soprano Sandra Azevedo..Esta publicação da Direção Regional de Cultura do Norte "resulta do estudo do vasto espólio musicográfico e instrumentário do cenóbio clariano portuense - uma investigação de índole musicológica e sociológica", como explica ao DN o responsável pela sua coordenação científica, Nuno Mimoso.."Este livro resulta dum trabalho de musicologia desenvolvido ao longo de dois anos. Trata-se duma obra robusta pela sua dimensão, abrangência e ineditismo no âmbito da musicologia histórica do Porto e do Norte", acrescenta Nuno Mimoso. A obra aborda os seguintes domínios: Música no monaquismo feminino português; História eclesiológica e sociológica das clarissas do Porto, com especial enfoque na biografia das cantoras e tangedoras que foram célebres pela arte musical; Pedagogia musical ministrada às pupilas do mosteiro; Catálogo e análise dos 20 livros de cantochão e 100 manuscritos musicais conservados na Biblioteca Nacional; Mestres e compositores das madres, sua análise biográfica e produção artística e instrumentário do mosteiro, em que avultou o duo organístico restaurado entre 2019-2022 pela Oficina e Escola de Organaria de Esmoriz..A publicação de 400 páginas inclui seis edições musicográficas em suporte digital (e-book) de obras exemplificativas do repertório litúrgico, profano e instrumental, produzido entre 1770-1828 para as clarissas portuenses..Destaca-se a produção dos mestres portuenses Francisco de São Boaventura (1739-1802) e António da Silva Leite (1759-1833), e do compositor da corte portuguesa Marcos Portugal (1762-1830).."A descoberta da qualidade composicional e exigência vocal inscreve este reportório no primeiro plano da música sacra ocidental, constituindo objeto de merecida divulgação", diz Nuno Mimoso. Segundo o musicólogo, "este trabalho constitui uma abordagem inédita e complementar na intervenção de reabilitação dum monumento nacional de afetação religiosa, pois além do património material foi contemplada uma ação de recuperação real do património imaterial, perspetivando-se a música sacra como elemento dinamizador da vida das gerações de mulheres - religiosas, noviças, pupilas e seculares - que habitaram o Mosteiro de Santa Clara do Porto".