A mulher que faz dedos mindinhos para ex-bandidos

Yukako Fukushima faz próteses para pessoas que tiveram acidentes. Mas, como no Japão não ter o mindinho está associado ao mundo do crime, ela faz essas peças para ajudar a reabilitar criminosos arrependidos
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A família não vê com bons olhos a sua atividade, porque, diz, "beneficia" os bandidos, e uma relação amorosa antiga não resistiu, também por causa disso, mas a japonesa Yukako Fukushima não se deixa abalar. Afinal, não é ao acaso que ela tem fama de pessoa determinada.

À primeira vista, a sua profissão - faz próteses de mãos, pés, orelhas, dedos e, em particular, dedos mindinhos - não parece especialmente conflituosa, mas, no Japão, precisar de uma prótese do mindinho é o mesmo que declarar-se bandido. E Yukako, se lhe pedem, e se ela acredita na sinceridade do arrependido, aceita fazer as próteses que podem ocultar um passado pouco recomendável.

No Japão, uma lei não escrita dos gangues locais, os famosos yakuzas, estabelece que a primeira falange - e as seguintes, para os reincidentes - do mindinho da mão esquerda vai fora, em caso de deslealdades, rivalidades, dívidas, traições e por aí fora.

A sociedade japonesa conhece bem essa marca e, por isso, a falta de mindinho naquele país é como uma confissão de uma vida de crime, que não augura bom prognóstico a um yakuza que decida tornar-se bom cidadão.

Então, aí, entra em cena Yukako Fukushima, hoje com 41 anos, que há duas décadas começou a fazer próteses de dedos mindinhos, ou apenas da falange superior, consoante os casos, para reabilitar antigos criminosos.

Trabalho não lhe tem faltado, em todos estes anos. Em 1993, estatísticas oficiais apontavam para que 45% dos yakuzas tinham os dedos mindinhos mutilados e que 15% desses tinham passado pela prova pelo menos duas vezes.

Nessa altura, Yukako, que tinha estudado arte, era praticamente uma recém-chegada à produção artesanal de próteses, depois de uma experiência bem sucedida para ajudar um vizinho que tinha ficado desfigurado, depois de perder as orelhas, num acidente.

"Aprendi sozinha a fazer próteses quando tinha 21 anos", contou Yukako à Motherboard, sublinhando: "Nessa altura, não havia Internet e os meus clientes foram os meus professores." Estava então longe de imaginar que haveria de passar a fazer também dedos mindinhos para yakuzas arrependidos, mas foi exatamente isso que veio a acontecer. Ela rege-se, no entanto, por uma ética estrita, como contou ao The Guardian.

Cada mindinho tem um preço - pode ser mais de 1800 euros - e ela só aceita fazê-lo em determinadas condições, que implicam a reabilitação e reintegração social do ex-yakuza. "Preciso de provas", diz. Depois, cada caso é um caso, e não há dois mindinhos iguais. Nem histórias de vida iguais. O certo é que alguns até já lhe escreveram, a dizer que se sentem felizes por estar vivos.

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