No final de junho, decorreu em Lisboa a segunda Conferência do Oceano da ONU. Esta foi apenas a segunda vez que representantes dos países que compõem a ONU se juntaram para debater o estado do oceano, formas de o proteger e como lidar com as consequências das alterações profundas que lhe infligimos nos últimos séculos de desenvolvimento tecnológico..Durante essa semana, a comunicação social encheu-se de imagens, números e outros dados que nos relembraram as razões pelas quais é urgente que se tome ação concreta, decisiva e eficaz para proteger aquele que é reconhecidamente o nosso maior aliado no combate aos efeitos das alterações climáticas. Porque a luta já não é contra as alterações climáticas; é agora sobre mitigar o mais possível os seus efeitos. A Declaração de Lisboa foi divulgada e podemos todos conhecer os compromissos feitos e sobre como se tenciona cumpri-los..No entanto, houve algo que também não passou despercebido: a imensa participação da sociedade civil na UNOC, fazendo-se representar oficialmente por mais de 2000 pessoas. Quem trabalha no meio, sabe que a luta por um clima que nos permita - e, talvez mais importante, às gerações futuras - viver de forma confortável dentro de um ambiente em intensa mudança é desgastante e, muitas vezes, desesperante. Mas também sabemos que contamos com uma comunidade abnegada, empenhada, informada e - talvez mais importante - profundamente crente na extraordinária capacidade de mudança e adaptação do ser humano. E, não por acaso, profundamente crente no poder popular. A UNOC, provavelmente também por ter sido o primeiro grande evento em que pudemos juntar-nos depois do início da pandemia, foi um momento charneira para a sociedade civil que se preocupa (e ocupa) com os assuntos marinhos..A visão de uma ONG sobre esta conferência não poderia deixar de fora a inspiração que foi ouvir pessoas de todo o mundo na Marcha Azul pelo Clima (cujo manifesto, incluindo 11 pontos de ação imediata, foi assinado por mais de 80 entidades), entoando we are unstoppable, another world is possible. A sociedade civil em toda a sua multiplicidade e diversidade (das organizações formais às informais, dos coletivos de cidadãos aos indivíduos, dos grupos mais institucionais aos de cariz mais ativista e reivindicativo) fez da UNOC um momento não só de mobilização e de partilha de frustração perante a inação, mas também um momento de regeneração, de reencontro e de cooperação. Muitas outras ações tiveram lugar no exterior do Altice Arena durante a semana e todas permitiram testemunhar a convicção inveterada de todos de que, apesar do tanto que ainda está por fazer, um futuro diferente é possível..É que, apesar de os compromissos continuarem a ser pouco firmes perante a necessidade e a urgência da ação, há sinais positivos. A inércia do sistema permitiu, apesar de tudo, que houvesse momentos como o lançamento da Aliança de Países Contra a Mineração em Mar Profundo. O reconhecimento de que os esforços anteriores resultaram num "falhanço coletivo" é algo que nos diz que a manutenção do business as usual já não é uma possibilidade. Vai ser cada vez mais difícil manter as discussões que dizem respeito a todos à porta fechada ou tomar "meias-decisões". A sociedade está a acordar para a sua função de escrutinadora, de vigilante e de impulsionadora de alteração, seja através do poder local, nacional ou do internacional. Não há volta a dar: a mudança não só está na rua, como está a entrar pelos centros de decisão adentro.. Membro da Associação de Ciências Marinhas e Cooperação