Pouco passava das sete e meia da tarde, quando a Marcha de Alfama partiu do Centro Cultural Magalhães Lima, bairro abaixo, com uma multidão de gente, entre locais e muitos turistas, a acompanhar os marchantes. "Parece que é Santo António outra vez", exclama à janela, enquanto bate palmas ao compasso da marcha, uma sorridente anciã. Não é, mas "é quase", dizia ao DN, minutos antes, o marchante Diogo Vaz, a quem hoje cabe liderar a marcha, dando assim início, como já é da tradição, a mais uma edição do Caixa Alfama, um festival criado em 2013, o primeiro dedicado em exclusivo ao fado e que rapidamente se assumiu como a grande festa do fado..São quase meia centena os artistas presentes nesta quinta edição, distribuídos por onze palcos, alguns deles situados em lugares emblemáticos do popular bairro lisboeta onde terá nascido o fado, como são o Largo Chafariz de Dentro, o Largo das Alcaçarias, as igrejas de São Miguel e de Santo Estêvão ou coletividades como a Sociedade Boa União, o Grupo Sportivo Adicense ou Centro Cultural Dr. Magalhães Lima, onde ontem atuaram os irmãos Pedro e Hélder Moutinho, naquele que era um dos momentos mais aguardados desta primeira noite.."Não é um espetáculo conjunto, que eu não gosto cá de misturas", diz Pedro, pouco antes de subir ao palco, provocando uma gargalhada ao irmão. "Realmente só no Natal e no Caixa Alfama é que nos juntamos", responde Hélder, lembrando as muitas vezes que já estiveram presentes neste festival, às vezes até do lado do público. "É a grande festa anual do fado e até para nós, artistas, tem um lado de descoberta, porque o cartaz aposta sempre muito em novos valores.".O responsável pela programação do festival é José Gonçalez, também ele fadista e a quem coube ontem, na companhia dos Sangre Ibérico, abrir o palco principal do festival, situado em frente ao rio Tejo. Para este responsável, o balanço destas cinco edições "é ótimo". Segundo José Gonçalez e "tal como aconteceu em anos anteriores", o festival vai esgotar. Ou seja, em cada uma destas duas noites, haverá mais de 15 mil pessoas a deambular por Alfama de palco em palco.."Não parece, é mesmo um segundo Santo António", admite Gonçalez, cuja principal preocupação, enquanto programador destes dois dias "é unicamente a de celebrar o fado". Daí a aposta em nomes históricos, "que honrem o passado", nos grandes artistas do presente, nas esperanças do futuro e também "em projetos vindos de outras áreas musicais, exteriores ao fado, mas que com ele tenham pontos de contacto, como é o caso dos Sangre Ibérico com que hoje subirá ao palco. "São um grupo que une o flamenco ao fado, com quem já atuei o ano passado e foi o público a exigir de novo a sua presença, mas agora num palco maior", revela..Quem também está de regresso um ano depois e igualmente promovida para o palco principal, é Marina Mota, que atuou antes de António Zambujo, o grande cabeça-de-cartaz desta primeira noite. "Estou apavorada", confessa ao DN a artista no seu camarim. Não pelo palco principal, claro, que a isso está Marina Mota habituada, seja no teatro ou na televisão, mas sim "pela falta de treino nas cordas vocais". Apesar de cantar o fado "há mais de 40 anos", Marina Mota não o faz com a regularidade que gostaria. "Sou fadista até quando estou calada, mas a minha vida não me permite cantar com a regularidade que gostaria. A última vez que o fiz foi há um ano, aqui mesmo. É por isso que sempre que canto é como se fosse uma estreia", confessa com um sorriso..Lisboa à Noite em coro.A Marcha de Alfama já passou entretanto por todos os palcos, terminando, como habitualmente, em frente ao palco principal. Por Alfama começam finalmente a ouvir-se, aqui e ali, os trinados das guitarras e as vozes a soltarem-se. Dois dos locais mais concorridos, neste início de noite, eram o Largo de São Miguel e o Largo do Chafariz de Dentro, lugar dos espetáculos de entrada livre, oferecidos pela organização do festival ao bairro..Especialmente o primeiro, onde, seis vezes por noite, se realiza o Fado à Janela, juntando uma verdadeira multidão, que se acotovela nas escadarias na Igreja de São Miguel para ouvir o trio composto por Jorge Silva (guitarra portuguesa), Miguel Monteiro (viola) e José Manuel Rodrigues tocar clássicos como a Rosinha dos Limões ou Lisboa à Noite, cantados por todos em coro. E ali estarão de novo esta noite, para o segundo momento deste Festival Caixa Alfama, que recebe hoje nomes como Alexandra, Ana Sofia Varela, Marco Rodrigues, Paulo Bragança ou Gisela João. É seguir o som das guitarras bairro fora, de palco em palco..[artigo:8760513]