A bastonária das polémicas vs. o candidato discreto. Enfermeiros vão a votos
Depois da exclusão de uma das listas candidatas por ter mulheres a mais, não cumprindo a Lei da Paridade, estarão presentes no boletim de voto das eleições à Ordem dos Enfermeiros quatro listas: duas nacionais e duas regionais. O lugar de bastonário vai ser disputado entre Ana Rita Cavaco - a atual representante - e Belmiro Rocha.
Apesar das polémicas de que foi alvo (como ser acusada de gastos injustificados ou de patrocinar uma telenovela onde existia a figura de uma enfermeira), Ana Rita Cavaco olha para o mandato anterior com satisfação. A Ordem dos Enfermeiros nunca foi alvo de tanta atenção e por isso a estratégia repete-se para os próximos quatro anos. Já Belmiro Rocha mostra-se mais discreto. Defende a visibilidade do organismo, mas indica também que "não basta visibilidade". "Precisamos de reconhecimento efetivo", diz.
Os cerca de 75 mil enfermeiros inscritos na Ordem vão votar a 6 de novembro em boletins eletrónicos para escolher os seus representantes entre 2020 e 2023. E os eleitores vão poder aceder à plataforma online onde irá decorrer o ato eleitoral em qualquer local com acesso à Internet e nas delegações regionais da Ordem, através de um código enviado por carta a todos os membros.
De fora do boletim ficou a lista D, "Futuro Já", que a Comissão Eleitoral considerou não cumprir "o mínimo de quatro elementos de qualquer dos sexos" previsto na Lei da Paridade nos órgãos da Administração Pública (em vigor a partir de 1 de janeiro de 2020), depois de ter pedido um parecer sobre isto à Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género. A lista era composta por sete mulheres e três homens e os candidatos excluídos querem impugnar as eleições.
Os eleitores ficam assim com a possibilidade de votar em quatro listas, sendo que só a lista A concorre a todos os órgãos da Ordem. A lista B apresenta candidatos às estruturas nacionais e a nível regional às delegações do centro e norte. Já a listas C só se apresenta na Madeira e a E nos Açores. Estas são as suas propostas:
"Nós quando chegámos à Ordem mudámos completamente aquilo que era a forma como nos relacionamos com os enfermeiros, em termos de serviços e proximidade, porque a Ordem não tinha o hábito de ir para os serviços, de fazer as visitas, de avisar o poder político e as administrações sobre quantos enfermeiros faltam", diz a atual bastonária e candidata, Ana Rita Cavaco, ao DN.
Depois de um ano atribulado, em que a bastonária foi acusada de gastos injustificados, de participação ilegal na organização da "greve cirúrgica" realizada pelos enfermeiros no início do ano ou de ter concedido um patrocínio a uma telenovela da SIC, onde existia uma enfermeira como personagem, Ana Rita Cavaco propõe para o próximo mandato a continuação do trabalho que têm vindo a desenvolver nos últimos anos. Querem investir na formação, na investigação, na progressão das carreiras e na valorização da profissão. "Temos de investir muito. Não só na formação, porque os enfermeiros formam-se em número suficiente em Portugal, mas em medidas de empregabilidade para o aumento da contratação de enfermeiros em Portugal", defende Ana Rita Cavaco.
"Pretendemos continuar a dizer que é preciso falar publicamente das questões laborais e contratuais, embora sindicais, porque o são, mas com impacto, na vida dos enfermeiros. Portanto, essa linha de defesa da dignidade da profissão é para manter, porque efetivamente só nos últimos quatro anos é que o país despertou para os problemas dos enfermeiros, que no fundo são os problemas dos doentes e de todos nós".
A lista A é a única que concorre a todos os órgãos nacionais, regionais (Açores, Madeira, centro, norte e sul) e ao lugar de bastonária.
"O que nós queremos é que a Ordem cumpra aquilo que está nos seus estatutos. A Ordem não é nenhum sindicato ou associação. Tem a regulação, o controle da profissão, e tem de cumprir os seus desígnios para estabelecer confiança e cooperação com os órgão nacionais e com a sociedade portuguesa". É assim que Belmiro Rocha, candidato a bastonário, apresenta o projeto da lista "Enfermagem - A Causa Maior" ao DN.
A candidatura do enfermeiro do Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia/Espinho e atual responsável pelo colégio de reabilitação da Ordem quer garantir a representatividade do órgão "em todos os contextos onde se discuta, decida e planeie cuidados de saúde", investir na formação, na investigação sobre a profissão e na criação de um fundo de apoio solidário para os enfermeiros.
"Não se trata de uma candidatura contra os atuais órgãos, trata-se de criar uma alternativa, uma visão diferente que efetivamente consiga restabelecer a confiança", diz o candidato da "Enfermagem a Causa Maior". Pretendem ter uma atitude mais discreta perante a opinião pública. A lista concorre aos órgãos nacionais e regionais (centro e norte), depois de ter visto rejeitada a candidatura à secção do sul pela Comissão Eleitoral.
Para a lista B, "a enfermagem, enquanto ciência e profissão, não tem evoluído de forma conveniente" e por isso querem "dar confiança aos enfermeiros". "Já percebemos que não basta visibilidade, precisamos de reconhecimento efetivo", aponta Belmiro Rocha.
A Lista C concorre apenas aos órgãos regionais da Madeira e os seus principais objetivos são a contratação, o reconhecimento da carreia e a defesa da especialização. Comprometem-se a "acompanhar o exercício profissional em todos os contextos onde se prestam cuidados de enfermagem"."Estamos a atentos à nossa realidade regional. Como temos um governo regional próprio, nós podemos e devemos ter negociações diretas com os órgãos de soberania regionais. E como tal uma das nossas linhas de ação é poder exercer essa influência", diz o candidato da lista C Nuno Neves.
"Nós estamos a sair de um período muito crítico e já estamos a assistir a mais contratações, mas são sempre precisos mais enfermeiros para que os cuidados de saúde não sejam colocados em causa e pretendemos negociar estas questões", acrescenta.
Querem também apostar no reconhecimento dos mais velhos através de cerimónias de entrega de distinções e numa abordagem próxima dos profissionais. "Temos uma equipa muito vasta, de todas as idades e que abrange todas as especialidades. Assim, a Ordem está presente nos locais onde os enfermeiros trabalham e a informação dos locais chega-nos diretamente à Ordem".
"Nós temos o entendimento que será mais difícil adaptar um projeto nacional a uma realidade regional", diz o candidato Márcio Tavares. Por isso, a lista "Juntos pela Enfermagem Açoriana: compromisso e responsabilidade" apresenta-se apenas ao órgão regional dos Açores. "Estamos muito focados nas problemáticas da região autónoma, porque conhecemos profundamente os problemas da região e por outro lado não queremos descurar todo o desenvolvimento da profissão que tem de ser feito com quem venha assumir os órgãos nacionais".
O programa foi desenhado pela equipa com a colaboração dos enfermeiros dos Açores que preencheram um inquérito sobre as suas preocupações. Propõem um olhar atento para a questão da empregabilidade, para a progressão e valorização da profissão. "Defendemos a qualidade dos cuidados de segurança, a visibilidade profissional dos enfermeiros, o investimento na investigação e no desenvolvimento profissional, as questões da ética e a comunicação externa da própria Ordem com os seus parceiros externos".
"A Ordem não existe só para os enfermeiros e por isso procurámos, neste projeto, olhar para os cidadãos. Daí termos desenvolvido esforços no contacto com estes", indica Márcio Tavares.