8 e 9 de maio: Que significado para a Alemanha e para a sua relação com a Europa?

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8 de maio de 1945 é considerado o dia em que terminou a Segunda Guerra Mundial com a vitória dos aliados e a derrota da Alemanha Nacional-Socialista. Comemora-se este ano os 75 anos desta data em que a Alemanha ficou derrotada militarmente, arruinada política e economicamente, e moralmente em colapso, tendo feito inimigos no mundo inteiro, como lembrado pelo Presidente alemão Frank-Walter Steinmeier, no passado dia 8 de Maio.

9 de maio de 1950 é proferida, pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros Francês, Robert Schuman, a Declaração Schuman, na qual se propunha a criação de um mercado comum para as indústrias do carvão e do aço, estratégicas para qualquer guerra. Deste modo, pretendia-se comunitarizar a produção franco-alemã de carvão e aço que passaria a estar sob controlo de uma Alta Autoridade Comum, numa organização que estaria aberta à participação de outros Estados ocidentais, a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA), criada a 18 de abril de 1951. A ideia passava pelo estabelecimento de uma base económica comum entre estes dois seculares rivais europeus e demais Estados participantes (Itália, Países Baixos, Bélgica e Luxemburgo) e, por conseguinte, afastar-se-ia a possibilidade da França e da Alemanha regressarem às querelas constantes que haviam decorrido entre si desde o século XVII. Na prática, a CECA contribuiu para colocar termo a séculos de guerra, tendo iniciado um período de cooperação entre os dois Estados mantido até hoje e que se reflete na existência da UE. Desde 1985, comemora-se nesta data o dia da Europa.

Para Steinmeier, o 8 de Maio foi um dia de libertação imposta de fora, incompreendido na altura pela grande maioria dos alemães, tendo levado anos para que a Alemanha deixasse de ser encarada como uma ameaça à ordem internacional e passasse a ser uma promotora da mesma e um parceiro confiável. Este dia não é, porém, o dia do fim da libertação, pois a liberdade e a democracia constituem-se cada vez mais como a missão permanente da Alemanha que aceita a sua responsabilidade histórica. A memória exige e obriga a Alemanha, segundo sublinhou.

Ao mesmo tempo, o 8 de maio marcou o inicio do período de paz mais longo da história europeia, conforme referido por Heiko Maas, Ministro dos Negócios Estrangeiros alemão, no encontro "Arria-Formula" do Conselho de Segurança da ONU de 8 de Maio.

Segundo Maas, devido à responsabilidade da Alemanha pelas duas Guerras Mundiais e pelo Holocausto, a história alemã encontra-se em dívida com uma responsabilidade que nunca mais acaba. E a Alemanha está, por isso mesmo, comprometida com a paz e uma ordem internacional baseada em regras, bem como com a defesa dos direitos humanos e da dignidade humana. O destino alemão encontra-se vinculado para sempre a uma Europa forte e unida, uma Europa que, após séculos de luta e destruição, atendeu à regra de ouro de Jean Monnet: é melhor discutir à mesa do que num campo de batalha. Um ideal que transformou a Europa numa forte defensora da paz mundial, conforme também salientou no seu discurso.

No essencial, o 8 e o 9 de maio, datas com origens distintas, parecem ter conduzido a Alemanha a um mesmo ponto de chegada. Ambos contribuem para o modo como o país se posiciona hoje no que respeita à sua política externa.

"Expulsa" das relações internacionais ao ter perdido a sua soberania e independência depois de 1945, foi a incorporação nas instituições internacionais, com destaque para a UE e a NATO, que lhe permitiram "voltar" ao se tornar, um Estado pós-nacional e com uma identidade pós moderna, passível de minimizar a identidade nacional (Szabo, 2015 e Jarausch, 2014).

Neste sentido, importa destacar que a orientação ocidental e sobretudo europeia corresponde a uma componente da identidade alemã do pós Guerra, em particular a partir da década de cinquenta, quando se começa a desenhar a integração europeia. A integração europeia tem, desde então, funcionado como uma forma de substituição da identidade alemã (nacionalista, entenda-se) (Daehnhardt, 2018), sendo que a UE não só assegura a paz, como resolve o problema alemão ao torná-lo um "gezähmte Macht" (Bierling, 2014) [poder domesticado].

Ademais, para além de ser fundamental para a sua economia - ao lhe possibilitar um mercado de exportações, potenciado com a introdução do euro - e se constituir como um traço vital da sua política externa - permitindo-lhe cooperar e representar os seus interesses -, o foco da Alemanha na Europa e na integração europeia corresponde a uma forma de reconciliação da Alemanha com os seus Estados vizinhos e vitimas da agressão Nacional-Socialista.

Daí que para a pergunta que dá titulo a este artigo "8 e 9 de maio: Que significado para a Alemanha e para a sua relação com a Europa?", a resposta seja: o que está em causa é a redefinição da identidade e do papel da Alemanha na Europa no pós Segunda Guerra Mundial.

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