Já lá vai uma semana desde a Queima do Porto e de Coimbra, desde há muito consideradas as maiores celebrações académicas do país. Lisboa nem por ser capital conseguiu alcançar o que as duas cidades deram aos seus estudantes universitários: uma semana inteira de festa e despedidas de ciclos, de capa preta ao ombro ou não. Pelo menos, até hoje. Esta quarta-feira inicia-se a primeira Queima das Fitas de Lisboa, até então designada Semana Académica de Lisboa e apenas com cariz festivo, num recinto em Carcavelos, até 18 de maio. Fizemos uma visita guiada pelo local, à conversa com o presidente da Associação Académica de Lisboa (AAL), Bernardo Rodrigues, 26 anos..A Avenida Jorge V, em Carcavelos, já não desagua apenas na praia, que por estes dias o sol convidou a encher. Agora, há outro destino, ali mesmo antes de pôr um pé no areal, o recinto de três mil metros quadrados onde decorrerá a primeira Queima das Fitas de Lisboa, mas onde tantas Semanas Académicas já tiveram lugar. "A praia é só um extra", disse Bernardo. O espaço é o maior com que podem sonhar, depois de tantas hipóteses rejeitadas. Porquê Carcavelos? O presidente da AAL e estudante universitário em Lisboa explica que organizar este evento na capital tinha constrangimentos horários. Tiveram em vista o Parque da Bela Vista, o Terra Plano, ou mesmo o Parque Tejo, mas para nenhum destes lhes era concedido licenciamento para que a festa se prolongasse além das 2:00 da manhã..Em cima da mesa estiveram ainda Loures e Odivelas, mas a Câmara Municipal de Cascais cedeu o espaço até às 6:00 e prometeu apoiar monetariamente o evento académico. Assim se criou o primeiro 'queimódromo' da capital..Além da festa, tradição.Há um frenesim de trabalhadores por todo o recinto. Carregam barras de ferro, caixas com sistema de som, peças para a estrutura do palco, ainda em montagem. O sol não dá tréguas e uns vão procurando as sombras das portas traseiras abertas das carrinhas para descansarem um pouco..À entrada, esta terça-feira, um segurança já vigiava o local. Estamos a um dia do início do evento, mas engane-se quem pensa que por a noite académica ainda não ter começado o trabalho para ele também não. É várias vezes interrompido por locais e curiosos, que perguntam, afinal, "o que se vai passar aqui". "Isto é temporário?", questionam. Não estão convencidos e até confusos com a resposta. A Queima das Fitas, como agora é chamada, é uma novidade para estes lados..Mas Bernardo garante que as mudanças estão apenas relacionadas com a vertente de tradição e ritual que os estudantes de Lisboa não tinham e agora poderão ter, associados à festa do costume. Falamos de serenatas académicas e festivais de tunas, por exemplo. Em Lisboa, "há uma fratura entre a festa e a tradição", começa por explicar. "Olhamos para os outros polos, vemos o Porto com uma Queima das Fitas, Coimbra, Braga... E Lisboa, a capital, sem um evento destes", lamentou. Por isso, sonharam com mais e aproveitaram "os 35 anos de organização de eventos recreativos" para ir o longe que faltava..Esta segunda-feira, decorreu uma JAM Session, esta terça-feira irá acontecer a Serenata, no domingo a já conhecida Benção das Pastas e ainda há espaço para um festival de tunas, no final de maio, na Escola Superior de Comunicação Social (ESCS). Tudo começou a ser preparado em fevereiro, dois meses depois da atual direção ter tomado posse na Associação Académica..O cortejo académico, contudo, já não foram a tempo de preparar, mas é uma ideia que a presidência da AAL quer voltar a tornar realidade para os universitários de Lisboa já no próximo ano. Como no Porto, em Coimbra e Braga, Bernardo sonha com um manto de estudantes, embargando as cores das suas universidades, ao longo da capital, partindo da Avenida da Liberdade e terminando no Rossio ou em frente ao edifício da Câmara Municipal de Lisboa..A Queima em números.Ainda é cedo para fazer contas, garante Bernardo. Em 2018, a 34.ª Semana Académica de Lisboa da história contou com a presença de cerca de 25 mil pessoas e 22 artistas em palco. Este ano, estima que sejam dez mil por dia. Os bilhetes, em suporto físico, foram distribuídos pelas 32 associações de estudantes associadas à AAL, encarregues da venda..Embora não se saiba quanto irão afluir à Queima das Fitas, sabe-se que haverá cerca de 30 mil litros de álcool disponíveis nos barris e dez roulottes de comida, durante os quatro dias de festa. Todas as bebidas serão servidas em 50 barracas (ou "barraquinhas", como Bernardo escolhe chamar) espalhadas pelo terreno, cada uma ao abrigo de uma associação de estudantes lisboeta. "Todas trazem o seu próprio sistema de som e decoração", explica. Até às 2:00/3:00 da manhã, a animação acontece no palco principal, por onde passarão os artistas de cartaz, mas a partir daqui "a diversão acontece em redor das barraquinhas"..A festa será ainda o máximo possível livre de plástico e desperdício. No meio do recinto, haverá uma banca onde todos poderão adquirir um copo único de dois euros que utilizarão durante toda a noite para todas as bebidas..São 26 os artistas que marcarão presença no evento deste ano, do Pimba ao pop nacional, passando por nomes reconhecidos do Tomorrowland, um dos mais célebres festivais do mundo, realizado na Bélgica. Uns no palco principal, outros na tenda secundária. "Depois de os artistas atuarem no palco principal, há outros a atuar nesta tenda, para quem quiser continuar a seguir os momentos musicais", disse o presidente da AAL..Haverá uma zona VIP, mesmo em frente ao palco principal, mas também uma zona com vista privilegiada para todos os espetadores com limitações motoras, com acesso por rampa..Num ano em que a Queima das Fitas no Porto ficou conotada a excessos, a segurança também é um dos focos desta edição em Lisboa. Durante quatro dias, mais de 50 seguranças estarão dentro do recinto e outros 70 agentes policiais fora do mesmo. No local estará ainda uma equipa médica, preparada para exercer dentro de um hospital ambulante, e ambulâncias..Mas Bernardo Rodrigues garante que assegurar que episódios de excesso não têm lugar neste recinto é uma missão complexa. "Nós queremos controlar o evento, mas não conseguimos controlar pessoas", justifica..Piscar o olho às europeias.São dias de festa, é certo, mas a Associação Académica de Lisboa decidiu aproveitar a oportunidade de um evento desta dimensão para esticar a mão aos problemas dos jovens universitários e expô-los a eurodeputados..Durante os próximos dias, antes de todos entrarem no recinto, de manhã e à tarde, Bernardo Rodrigues vai receber vários candidatos às eleições europeias no local para deixar algumas perguntas. "Umas bem difíceis", garante. Entre eles, o candidato à lista do CDS Vasco Weinberg, Paulo Rangel do PSD, alma Rivera do CDU e ainda o socialista Pedro Marques..Bernardo não quer adiantar as perguntas que fará a cada um, mas adianta que discutirá a abstenção jovem. "Enfrentamos números preocupantes", lembra. Aliás, nas eleições europeias de 2014 apenas 19 por cento se dirigiram às urnas. "É uma oportunidade para os fazer ouvir-nos"..Depois da visita dos candidatos, as portas abrem-se em Carcavelos para os festejos. E os transportes não serão problema. A AAL garante que estarão disponíveis autocarros gratuitos de 20 em 20 minutos, que irão circular entre o Campo Grande e o recinto, entre as 20:00 às 6:00 da manhã. Se houver preferência pelas viagens de comboio, com uma estação a poucos metros do recinto, basta mostrar o bilhete da Queima das Fitas nas bilheteiras e trocar por um de comboio por 2 euros (ida e volta).