Ao longo dos anos, o comentário do porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE) da China às perguntas lançadas anualmente por jornalistas estrangeiros varia pouco. "Há muito tempo que o governo chinês chegou a uma conclusão sobre os tumultos políticos do final da década de 1980." E o veredicto é que o movimento estudantil foi um "motim contrarrevolucionário" e um "ato contra o governo"..A abordagem oficial à questão nas conferências de imprensa surge nos últimos anos com referências aos progressos registados no país desde então. "Ao longo da últimas três décadas, com mais reformas e abertura, as enormes conquistas sociais e económicas mereceram atenção de todo o mundo. A construção da democracia e do estado de direito continuaram a ser objeto de melhoria", dizia o porta-voz do MNE Hong Lei na véspera de 4 de junho de 2014..Vários grupos pró-democracia no exterior e em Hong Kong, Macau e Taiwan exigem uma revisão do veredicto de forma a reconhecer o movimento como tendo sido "patriota e democrático". Na China continental o movimento Mães de Tiananmen - mães e esposas de pessoas que morreram no 4 de junho de 1989 - pede uma investigação sobre o derramamento de sangue. De acordo com organizações não governamentais no exterior, figuras principais desse grupo têm sido colocadas sob apertada vigilância policial nas últimas semanas..Zhao Ziyang, secretário-geral do Partido Comunista da China (PCC) afastado e colocado sob prisão domiciliária na altura dos protestos por simpatizar com o movimento, manteve ao longo dos anos seguintes esperança numa revisão do veredicto. Numa carta enviada aos líderes do PCC em 1997, Zhao escrevia que "a questão da reversão do veredicto precisa de ser resolvida mais cedo ou mais tarde", sublinhando que "a população não vai esquecer o que se passou, independentemente de quanto tempo se quiser estar sem abordar a questão"..Todavia, parece estar longe qualquer reavaliação da natureza do movimento e da ação repressiva das autoridades. No seu livro de memórias publicado em 2004 em Hong Kong, Li Peng, primeiro-ministro na altura que defendeu mão pesada contra os estudantes, é citado argumentando que "nenhuma revisão pode ser permitida", acusando as pessoas que procuram essa reavaliação oficial como estando à procura de "abrir fissuras na liderança numa tentativa de dividir o PCC"..Perry Link - sinólogo da Universidade de Princeton nos Estados Unidos e cocoordenador do volume Tiananmen Papers (uma compilação e documentos secretos do PCC relacionados com a gestão política da crise de 1989) - salienta em declarações ao South China Morning Post que existe receio de que a abertura da discussão possa resultar numa "bola de neve que pode transformar-se numa nova revolta popular". Link conclui que a liderança considera que "o preço que paga pela repressão da verdade é bem inferior ao que pagaria se falasse a verdade sobre o que aconteceu"..Dentro de portas, na China continental, permanece o tabu, não sendo possível a discussão ou a referência pública ao assunto em virtude do apertado sistema de censura nos media e na internet. A Wikipédia anunciou que todas as versões nas mais variadas línguas da maior enciclopédia online do mundo foram bloqueadas desde abril. Mesmo referências indiretas são censuradas, como por exemplo a imagem de um cisne a enfrentar um camião, numa alusão à famosa fotografia do Homem do Tanque, tirada a 5 de junho de 1989, que se tornou icónica da resistência à repressão do Exército Popular de Libertação (EPL).. * Jornalista da Plataforma Media Macau