200 acusados. Alteravam os contadores da EDP e poupavam milhares de euros
O esquema passava por alterar o registo dos contadores da EDP e, com isso, reduzir os custos dos consumidores. Cinco pessoas são acusadas de planear e executar a fraude enquanto outras cinco tinham a responsabilidade de angariar clientes. No total, há mais de 200 acusados pelos crimes de falsificação de notação técnica e de burla qualificada, na forma continuada. São particulares, espaços comerciais, unidades industriais e dezenas de estabelecimentos de restauração. Caso fique provada a fraude, em julgamento no Tribunal de Leiria, terão de indemnizar a empresa que diz ter sido lesada em centenas de milhares de euros.
O processo está agora em julgamento depois de o grupo ter sido desmantelado em 2013, numa operação da PSP de Leiria. A acusação do Departamento de Investigação e Ação Penal de Leiria ficou concluída em março de 2018 e, depois da instrução, o processo está a ser julgados em tribunal coletivo, com os dez arguidos a responderem por mais de 200 crimes de quebra de marcas e de selos, e falsificação de notação técnica, um crime de burla qualificada, na forma continuada, e associação criminosa. Em causa ainda um crime de branqueamento de capitais por um arguido.
De acordo com a acusação do MP, cinco dos arguidos montaram um plano "previamente delineado" em que se dirigiram a empresas e residências particulares, com a proposta de adulteração dos registos dos contadores de eletricidade. A maioria dos aderentes tem contador na zona Oeste, Leiria e arredores, mas já tinham clientes mais para Norte, como na zona de Aveiro. Entre agosto de 2012 e outubro de 2013, os suspeitos dirigiam-se aos contadores e quebravam os selos colocados pelos funcionários da EDP.
Numa fase seguinte, "procederam à violação dos referidos contadores, alterando o registo de quilovátios consumidos por hora (kwh), de forma a verificar-se uma diminuição da contagem de quantidade de energia consumida, com a consequente redução de custos para aqueles consumidores". Eram prometidas, e concretizadas, poupanças no consumo de energia que variavam entre os 15 e os 50%. Segundo o MP, os arguidos receberam como contrapartidas quantias entre os 100 e os 60 mil euros de cada um dos consumidores beneficiados.
A lista de particulares e empresas que aceitaram os serviços deste grupo para ter faturas de eletricidade mais baixa é enorme. Muitos cafés e restaurantes, hotéis, lojas comerciais desde o pronto-a-vestir a clínicas médicas, pequenas indústrias de diversos ramos de atividade e residências particulares.
O julgamento arrancou antes das férias judiciais e já começaram a ser ouvidas testemunhas, decorrendo esta segunda-feira uma sessão, durante todo o dia. Pelo número de casos a serem apreciados - há 207 demandados - irá prolongar-se por mais uns meses. Os demandados não têm responsabilidade criminal mas podem ser obrigados a indemnizar a empresa caso os crimes fiquem provados. A EDP Distribuição constituiu-se assistente no processo.
As dez pessoas que são arguidos, sete homens e três mulheres, tinham, à data da detenção, idades entre os 33 e os 44 anos e profissões diversas, mas nenhuma ligada ao ramo da eletricidade. Dois dos arguidos têm antecedentes criminais, por crimes de agressões, furtos e viciação de viaturas. Uma parte destas pessoas dedicava-se a angariar particulares e empresas que estivessem disponíveis. A base do negócio seria a confiança estabelecida, com o número de clientes a alargar-se através do contacto direto. Os outros elementos usavam depois ferramentas e tecnologia para adulterar os contadores. "Ao atuarem da forma descrita os arguidos, bem como os mencionados consumidores, obtiveram benefícios de natureza patrimonial, e causaram à EDP um prejuízo patrimonial que ascende a milhares de euros", diz o MP.
Quando foi desencadeada a Operação Elektra pela PSP de Leiria, em 2013, já a empresa de energia suspeitava de estar a ser lesada, embora só tenha tomado conhecimento do esquema com a investigação policial. A PSP deteve na altura quatro pessoas e apreendeu "várias viaturas de alta cilindrada, cerca de 20 mil euros em dinheiro e equipamentos vários, como computadores e contadores de eletricidade". Os outros seis arguidos foram constituídos arguidos, sem detenção.
Este tipo de fraude acontecia em contadores mecânicos que a empresa foi substituindo por digitais. O controlo dos consumos também permite à EDP dar conta de situações anómalas, com os serviços da empresa a ter meios para a verificação remota e para fazer a correlação de dados de consumo. No entanto, as fraudes não param. No ano passado, a EDP Distribuição admitia ao DN/Dinheiro Vivo que o número de fraudes e furtos de eletricidade à rede tinha aumentado e avaliava em 70 milhões de euros o prejuízo da EDP Distribuição no ano de 2017. Os novos contadores digitais não travaram as falsificações com a viciação e a manipulação dos contadores e das instalações elétricas "a adquirir formas cada vez mais sofisticadas e de difícil deteção", adiantava a operadora da rede de energia elétrica. Ligações abusivas, viciação dos contadores ou manipulação da potência contratada são as técnicas mais usadas para furtar eletricidade.