'Decisão de Risco': Contra a rotina de Hollywood
Título: Decisão de Risco
Realização: Robert Zemeckis
Com: Denzel Washington, Katerina Marquez, Adam C. Edwards
Sinopse: Um piloto de aviação comercial acorda de uma noite de sexo e álcool. Entra a bordo de um avião pouco depois, mal imaginando que tem pela frente um voo acidentado e uma aterragem de emergência numa zona rural. Salvam-se 96 dos 102 passageiros. Mas um inquérito terá de apurar responsabilidades.
Não creio que Decisão de Risco seja um grande filme. É certo que nele encontramos um elenco invulgarmente sólido, com Denzel Washington a explorar de forma subtil a negação moral em que vive a sua personagem ou Kelly Reilly a conferir uma intensidade tocante a uma toxicodependente desenhada a partir de duas ou três convenções mais ou menos previsíveis. Em todo o caso, o retrato do piloto (Washington) que consegue uma admirável aterragem de emergência, ao mesmo tempo que está sob o efeito de diversas substâncias tóxicas, vai deslizando para aquele determinismo sem falhas que define a preguiça de muitas ficções televisivas.
Daí não viria grande mal ao mundo. Mas há uma interrogação insólita que Decisão de Risco não pode deixar de suscitar: que faz com que um cineasta como Robert Zemeckis, autor da trilogia Regresso ao Futuro e defensor recente das mais ousadas manipulações digitais (lembremos Polar Express, Beowulf e Um Conto de Natal) se lance, assim, num drama social que se inscreve na nobre tradição de Hollywood a que pertencem as obras de Frank Capra ou Otto Preminger?
Pois bem, talvez Zemeckis esteja cansado. De quê? Não necessariamente dos seus filmes, mas da situação global de uma indústria cuja voracidade técnica tende a menosprezar o fator humano e, por fim, a secundarizar os atores. Nesta perspetiva, mesmo não sendo um filme excecional, Decisão de Risco envolve uma bizarra sintomatologia: o mal-estar com o marketing mais banal de Hollywood começa... dentro de Hollywood. Talvez esperássemos que, ao filmar a queda de um avião, Zemeckis nos pusesse a falar dos efeitos especiais usados. Mas não: apesar de tudo, é o piloto que suscita o nosso interesse. E essa diferença representa, pelo menos, uma negação da rotina.